WASHINGTON - O litígio entre o governo dos Estados Unidos e o Estado do Texas para decidir a quem corresponde legislar sobre a interrupção da gravidez chegará na quarta-feira, 2, à Suprema Corte do país, que decidirá em junho sobre um dos casos sobre aborto mais controvertidos das últimas duas décadas.
Sob a lupa dos oito juízes do alto tribunal estará uma conflituosa legislação do Texas promulgada em 2013 que, com o argumento de proteger a saúde das mulheres, provocou o fechamento de 75% das clínicas do Estado, segundo o grupo Whole Woman's Health. A lei estabelece dois requisitos: as clínicas devem cumprir os mesmos padrões cirúrgicos que um pequeno hospital e seus médicos devem ter privilégios de admissão em um hospital que esteja a menos de 48 quilômetros de onde fica o centro para abortos.
Os opositores da lei asseguram que esses requisitos não são necessários e a lei castiga mulheres mais pobres, que não podem pedir dias livres no trabalho e, muito menos, custear várias viagens de centenas de quilômetros para pagar um aborto, procedimento permitido nos EUA desde 1973.
Desde a decisão de 1973, com o objetivo de proteger os direitos do feto, vários Estados conservadores, como Michigan, Missouri e Virgínia, promulgaram leis similares à do Texas.
O Instituto Guttmacher, uma organização que promove a saúde reprodutiva, calcula que 28 dos 50 Estados impulsionaram leis similares às do Texas, especialmente desde 2010, quando os republicanos passaram a controlar as Assembleias Estaduais e impulsionaram sua agenda "pró-vida".
No caso anterior com grande repercussão pública, em 1992, o alto tribunal determinou que as leis dos Estados não podem acrescentar sobre o direito ao aborto "cargas desnecessárias" que "tentam pôr obstáculos substanciais no caminho da mulher que procura abortar antes que o feto seja viável".
O que a Suprema Corte tem que decidir em junho é se a lei do Texas impõe essas "cargas desnecessárias". Uma decisão contra o Texas afetaria os 28 Estados com leis similares e, se os juízes forem mais adiante em sua sentença, a Corte poderia obrigar-lhes a dar um passo atrás e reverter seus regulamentos contra o aborto, segundo Steven D. Schwinn, professor da escola de leis John Marshall, de Chicago.
Das 5,4 milhões de mulheres em idade reprodutiva no Texas, 2,5 milhões são latinas e elas são as mais afetadas pela lei ao fazer parte de um dos coletivos mais pobres, ressaltou o Centro de Direitos Reprodutivos, que participa do processo apresentado pela organização Whole Woman's Health perante a máxima instância judicial do país.
Estas organizações destacam o prejuízo causado às mulheres latinas que não têm seguro médico, não podem pagar a alguém que cuide de seus filhos e, além disso, costumam viver em zonas rurais afastadas das concentrações urbanas onde se aglutinam as poucas clínicas nas quais se praticam abortos.
Suas histórias estarão na próxima semana diante dos oito juízes que devem formar o tribunal e a cadeira vazia do magistrado conservador Antonin Scalia, falecido no último dia 13.
Os analistas consideram que, se os oito juízes empatarem, então o mosaico de regulações estaduais sobre o aborto seguiria vigente e o Estado do Texas ficaria com suas atuais 16 clínicas para abortos, muito abaixo das 41 que tinha antes da lei, segundo a última apuração do site NeedAbortion.Org.
A disjuntiva sobre a proteção dos não nascidos e a do direito a decidir da mulher poderia se transformar em um espinhoso campo de batalha entre os pré-candidatos republicanos e democratas para as eleições presidenciais de novembro.
A audiência da quarta-feira acontecerá apenas um dia depois da chamada Superterça, quando uma dúzia de Estados realiza eleições primárias. Por sua vez, a decisão definitiva do alto tribunal será anunciada em junho, a poucas semanas das convenções dos partidos que definirão os candidatos democrata e republicano para a disputa à Casa Branca. / EFE
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.