TAIPÉ - Taiwan acusou a China de encenar um ataque em sua ilha principal neste sábado, 6, depois que vários navios de guerra e aeronaves chinesas cruzaram a linha mediana do Estreito de Taiwan. O movimento ocorre em meio à intensificação da resposta de Pequim à visita da presidente da Câmara de Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, a Taipé nesta semana. Analistas temem que as manobras, que vão durar até domingo, visam o bloqueio da ilha.
As forças armadas de Taiwan emitiram um alerta, enviaram patrulhas aéreas e navais ao redor da ilha e ativaram sistemas de mísseis terrestres em resposta aos exercícios chineses, disse o Ministério da Defesa Nacional. “As forças de Taipé detectaram vários aviões e navios comunistas realizando atividades ao redor do Estreito de Taiwan. Os exercícios foram considerados um ataque simulado na principal ilha de Taiwan”, disse o ministério.
O Ministério da Defesa da China disse em comunicado neste sábado que realizou exercícios militares conforme planejado no mar e nos espaços aéreos ao norte, sudoeste e leste de Taiwan, com foco em “testar as capacidades” de seu sistemas de ataque terrestre e marítimo.
As relações entre a China e os EUA ficaram abaladas após a visita de Pelosi à ilha autônoma que Pequim considera como parte de seu território. A chegada da deputada a Taiwan nesta semana - a primeira visita de uma autoridade americana de alto escalão em 25 anos - foi vista pela China como uma “provocação”, que em retaliação lançou seus maiores exercícios militares em torno da ilha em décadas.
A China vê a ilha como uma província separatista a ser anexada à força, se necessário, e considera as visitas a Taiwan de autoridades estrangeiras como um reconhecimento de sua soberania.
Durante a noite, as forças chinesas divulgaram o vídeo de um piloto gravando a costa e as montanhas da ilha, mostrando o quão perto as forças chinesas chegaram de Taiwan. O Comando Leste do Exército também compartilhou uma foto supostamente tirada de um navio de guerra patrulhando perto de Taiwan que mostrava o litoral da ilha.
A televisão estatal chinesa CCTV informou que os mísseis chineses voaram diretamente sobre Taiwan durante os exercícios, o que não foi confirmado.
O Exército de Taiwan também disse que detectou quatro veículos aéreos não tripulados voando nas proximidades do condado de Kinmen e disparou sinalizadores de alerta em resposta. Os quatro drones, que Taiwan acreditava serem chineses, foram vistos sobre as águas ao redor do grupo de ilhas Kinmen e nas proximidades da ilha Lieyu e da ilhota Beiding, de acordo com o Comando de Defesa Kinmen de Taiwan.
Kinmen, também conhecido como Quemoy, é um grupo de ilhas a apenas 10 km a leste da cidade costeira chinesa de Xiamen, na província de Fujian, no Estreito de Taiwan, que divide os dois lados que se separaram em meio à guerra civil em 1949.
“Nosso governo e militares estão monitorando de perto os exercícios militares e as operações de guerra de informação da China, prontos para responder conforme necessário”, disse a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, em um tuíte. “Peço à comunidade internacional que apoie a Taiwan democrática e interrompa qualquer escalada da situação de segurança regional”, acrescentou.
“Nas águas ao redor da ilha de Taiwan, mais de 10 destroieres (tipo de navio de guerra) e escoltas marinhas do Comando Oriental se aproximaram de diferentes direções para realizar operações de contenção”, disse o Comando Oriental dos militares chineses em comunicado sobre os exercícios.
Para entender
Pequim também disse que realizará um exercício de tiro no sul do Mar Amarelo - localizado entre a China e a península coreana - deste sábado a 15 de agosto.
Segundo analistas, a continuação dos exercícios militares em torno de Taiwan tem como objetivo praticar um bloqueio e invasão da ilha.
John Culver, ex-analista da CIA para a Ásia, considerou que a principal intenção de Pequim com seus exercícios militares é mudar o status quo. “Acho que este é o novo normal”, disse ele em uma discussão organizada pelo Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. “Os chineses querem mostrar... que uma linha foi cruzada com a visita de Pelosi”.
Política de ‘uma só China’
Os exercícios militares chineses começaram na quinta-feira e devem durar até domingo. Até agora, os exercícios incluíram ataques com mísseis a alvos nos mares ao norte e ao sul da ilha, em um eco dos últimos grandes exercícios militares chineses em 1995 e 1996, com o objetivo de intimidar os líderes e eleitores de Taiwan.
Taiwan colocou seus militares em alerta e realizou exercícios de defesa civil, enquanto os EUA implantaram vários recursos navais na área.
O governo de Joe Biden e Pelosi disseram que os EUA continuam comprometidos com uma política de “uma só China”, que reconhece Pequim como o governo da China, mas permite relações informais e laços de defesa com Taipé. A administração desencorajou, mas não impediu a visita de Pelosi.
A China também interrompeu as negociações de defesa e clima com os EUA e impôs sanções a Pelosi em retaliação à visita.
Pelosi disse na sexta-feira em Tóquio, a última parada de sua turnê pela Ásia, que a China não poderá isolar Taiwan impedindo que autoridades dos EUA viajem para lá.
Pelosi é uma defensora de longa data dos direitos humanos na China. Ela, juntamente com outros legisladores, visitou a Praça Tiananmen de Pequim em 1991 para apoiar a democracia dois anos depois de uma sangrenta repressão militar aos manifestantes na praça.
Enquanto isso, os ataques cibernéticos destinados a derrubar o site do Ministério das Relações Exteriores de Taiwan dobraram entre quinta e sexta-feira, em comparação com ataques semelhantes antes da visita de Pelosi, segundo a Agência Central de Notícias de Taiwan. O ministério não especificou a origem do ataque.
Outros ministérios e agências governamentais, como o Ministério do Interior, também enfrentaram ataques semelhantes em seus sites, segundo o relatório.
Um ataque de negação de serviço distribuído visa sobrecarregar um site com solicitações de informações que eventualmente o travam, tornando-o inacessível a outros usuários./AP e AFP
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