The Economist: Como Nicolás Maduro, o autocrata da Venezuela, está vencendo a oposição

Juan Guaidó, o principal político da oposição, acaba de fugir do país

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Por The Economist
Atualização:

Seus publicitários o chamam de “Super Bigode”, e seu governo tem distribuído bonecos de plástico apresentando-o como um herói que veste uma capa. Mas, na realidade, Nicolás Maduro, o presidente despótico da Venezuela, tem apenas um superpoder: a capacidade extraordinária de aferrar-se ao cargo independentemente dos desejos de seus compatriotas, conforme demonstram os eventos desta semana.

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A economia venezuelana encolheu 75% durante a década que ele passou no poder. Um quarto da população do país emigrou: cerca de 7 milhões de venezuelanos. Em 2018, Maduro fraudou uma eleição. No ano seguinte, Donald Trump, então presidente dos Estados Unidos, impôs duras sanções contra o petróleo da Venezuela e sobre as finanças do país, em uma tentativa de restaurar a democracia. Mas Maduro não dá nenhum sinal de que arredará o pé. Politicamente, ele parece estar se fortalecendo.

Um ex-rival partiu agora para o exílio. O político de oposição Juan Guaidó foi reconhecido por mais de 50 governos democráticos em 2019 como presidente legítimo da Venezuela. Em 24 de abril, ele afirmou que viajou secretamente, por terra, para a Colômbia, para se encontrar, no dia seguinte, com delegados em uma conferência organizada por Gustavo Petro, o presidente colombiano, de esquerda. O objetivo dessa conferência era reunir representantes de vários governos para discutir a situação da Venezuela. A Colômbia acusou Guaidó de entrar no país “irregularmente” e afirma que ele concordou em seguir viagem para os EUA. Guaidó afirma que foi deportado. “A perseguição do ditador chega atualmente à Colômbia”, resmungou ele ao sair.

Uma pessoa segura um boneco do 'Super Bigode' em frente ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro Foto: Leonardo Fernandez Viloria/Reuters

O esfacelamento da democracia venezuelana começou sob o antecessor de Maduro, Hugo Chávez, que morreu em 2013. Desde que Maduro lhe sucedeu, passou a minar sistematicamente as instituições do país. Depois de outras eleições não competitivas, em 2020, Maduro estabeleceu uma Assembleia Nacional que ratifica seus decretos. Ele mantém o Exército leal permitindo que os oficiais comandem falcatruas lucrativas. Outros regimes autocráticos, como o de Cuba, ajudaram a ungi-lo.

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Maduro, um ex-líder sindicalista, se descreve como socialista e tem recebido apoio de extremistas de esquerda globalmente, em parte por causa de sua inimizade com os EUA. Uma descrição melhor de seu regime seria: intimidação e corrupção. Os comparsas de Maduro estão fabulosamente ricos. A Venezuela é hoje o país mais desigual na América Latina, de acordo com pesquisadores da Universidade Católica Andrés Bello, de Caracas, a capital. A hiperinflação, causada originalmente pelo regime mandar imprimir dinheiro, diminuiu um pouco, caindo de um pico quase imensurável, em fevereiro de 2019, para 500%. Isso ocorreu porque o governo de Maduro tem encorajado a quem pode desistir de usar a moeda local, substituindo-a por dólares americanos.

Críticas ao péssimo desempenho de Maduro raramente circulam, já que o governo domina as emissoras de TV. Anteriormente este mês, foi lançado o programa televisivo semanal “Com Maduro”. O presidente o apresenta com Cilia Flores, sua mulher, e uma apresentadora gerada por IA chamada “Sira”, que mescla a aparência de uma participante do Miss Venezuela com a autoridade reconfortante de uma âncora de noticiário real. O programa é provavelmente um lançamento brando de sua campanha para a disputa eleitoral de 2024. Essa eleição dificilmente será justa.

Dois acontecimentos internacionais jogaram a favor de Maduro. Primeiro a guerra na Ucrânia, que ocasionou um frenesi global em busca de alternativas ao petróleo russo. Ávido para impulsionar o abastecimento global de energia, o governo do presidente Joe Biden reformulou sua relação com o regime venezuelano e começou a aliviar algumas das sanções de Trump. No ano passado, Biden mandou dois representantes se reunirem com Maduro. Seu governo permitiu à Chevron, uma empresa americana gigante no setor do petróleo, receber petróleo venezuelano como pagamento de dívidas que lhe são devidas pela PDVSA, a estatal petroleira. Em parte como resultado do alívio das sanções, o FMI prevê que a economia venezuelana crescerá 5% este ano.

Um 'Super Bigode' inflável, inspirado em Nicolás Maduro, é visto em um evento em Caracas em 9 de março Foto: Leonardo Fernandez Viloria/Reuters

O segundo desdobramento que tem ajudado Maduro é a eleição recente de vários esquerdistas na América Latina. Petro, ex-integrante do grupo guerrilheiro M-19, movimentou-se com agilidade para restaurar relações depois de chegar ao poder no ano passado. Ele se encontrou com Maduro várias vezes. Armando Benedetti, o primeiro embaixador colombiano na Venezuela em três anos, foi enviado para Caracas dias depois de Petro assumir. Em janeiro, a fronteira de 2,2 mil quilômetros entre os dois países foi reaberta para a passagem de carros, depois de ficar sete anos quase totalmente fechada.

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Petro tornou-se um canal não oficial entre EUA e Venezuela. Em 20 de abril, ele conversou com o presidente Joe Biden a respeito dos objetivos de sua conferência, que incluíam suspender sanções. O encontro, em 25 de abril, reuniu representantes de pelo menos 19 governos da Europa e das Américas. No evento, o sub conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jon Finer, deixou claro que mais sanções poderão ser suspensas se a Venezuela der passos no sentido do restabelecimento da democracia e organizar eleições livres e justas. Isso envolveria reconhecer todos os candidatos da oposição e aceitar observadores eleitorais independentes. Finer disse a repórteres que o governo Biden não quer manter as sanções contra a Venezuela “em perpetuidade”.

A conferência também concordou que as negociações entre o regime e a oposição venezuelana, mantidas no México mas intermediadas pela Noruega, deveriam ser retomadas. As conversas estão paradas desde novembro. O governo de Maduro afirma que um fundo humanitário, que, segundo acordado com a oposição, seria criado com cerca de US$ 3,2 bilhões de Caracas atualmente congelados, foi bloqueado pelos EUA. A verdade é mais complicada: há uma disputa jurídica a respeito de como o fundo deveria ser administrado e protegido de credores.

Petro tem seus próprios motivos para se aconchegar com Maduro. Uma de suas promessas na campanha eleitoral do ano passado foi trazer “paz total” à Colômbia. Um obstáculo crítico para isso é o Exército de Libertação Nacional (ELN), um grupo guerrilheiro de esquerda que desde sua formação, nos anos 60, tem combatido continuamente o governo colombiano. As operações do ELN, que incluem tráfico de drogas e mineração ilegal, não se limitam ao território colombiano. O grupo também tem bases na Venezuela, onde opera com impunidade quase total.

Um rumor em Caracas é que Petro propôs um acordo a Maduro: o colombiano persuadiria Biden a suspender sanções contra a Venezuela em troca do venezuelano persuadir o ELN a negociar a paz com Bogotá. “Parece que todos ganham, mas ambos oferecem algo que não são capazes, necessariamente, de entregar”, afirma um diplomata ocidental em Caracas (em 26 de abril, Petro reformulou seu gabinete após sua coalizão no Congresso ruir).

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Gustavo Petro, da Colômbia, e Nicolás Maduro, da Venezuela, se abraçam em encontro em 23 de março Foto: Marcelo Garcia/ Presidência da Venezuela via AFP

Cabo da desesperança

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Por que Maduro concordaria com qualquer concessão que poderia fazer com que ele perca uma eleição? Uma explicação é que ele acredita ser capaz de vencer uma disputa eleitoral considerada justa por observadores internacionais. Isso não é impossível: a oposição, que atualmente discute se deve ou não organizar primárias em outubro — e como organizá-las — pode fracassar em se unir em torno de um candidato único. O apoio a Maduro em fevereiro se situava em 22%, de acordo com a empresa de pesquisas Datanálisis. O índice é baixo, mas não tanto quanto já foi.

Outra explicação é que o ditador percebe as negociações como uma rota para mais poder. Maduro “não é nem de perto tão forte quanto gostaria de ser”, afirma Geoff Ramsey, do Atlantic Council, um instituto de análise americano. “Ele disputa a eleição este ano desesperado atrás de dinheiro, e a única maneira pela qual a Venezuela pode esperar recuperar sua economia é por meio de alívios nas sanções.”

O tamanho da economia venezuelana, em dólares, é meramente um quarto do que era antes de Maduro assumir a presidência, em 2013. Recentemente, ela tem mostrado alguns sinais de recuperação, mas ainda está em situação precária, ainda mais com a queda em sua produção de petróleo. As pensões do Estado, pagas na moeda local, equivalem atualmente a menos de US$ 5 mensais segundo a taxa de câmbio oficial. Professores de escolas públicas têm protestado contra seus salários de menos de US$ 20 mensais.

Uma escassez aguda de moeda forte pode ter sido uma razão para o regime lançar uma investigação de corrupção dentro da PDVSA — que levou à prisão de 61 líderes empresariais e políticos, à investigação de centenas de outros suspeitos e ao pedido de demissão, em 20 de março, do então ministro do Petróleo, Tareck El Aissami, que já foi um dos homens mais poderosos da Venezuela. El Aissami não foi acusado de nenhum crime.

O escândalo começou a emergir no ano passado, quando uma auditoria nas contas da PDVSA determinada pela vice-presidente do país, Delcy Rodríguez, revelou que 84% do petróleo que a empresa havia exportado desde 2020 não tinham sido pagos. Intermediários obscuros, contratados pela estatal em um esforço para contornar as sanções, parecem ter tirado vantagem da situação para surrupiar bilhões de dólares da empresa.

Criança brinca com boneco inspirado em Nicolás Maduro em 1 de maio Foto: Leonardo Fernandez Viloria/Reuters

El Aissami desapareceu da vida pública desde a demissão. Alguns afirmam que Maduro — em conluio com seus poderosos conselheiros, Rodríguez e seu irmão Jorge Rodríguez, presidente da espúria Assembleia Nacional — decidiu que ele estava ficando poderoso demais. “Os caras da PDVSA tinham virado uma ameaça, então precisaram ser removidos”, afirma um empresário com base em Caracas. Em 21 de abril, anunciou-se que um dos detidos no âmbito da investigação, Leoner Azuaje, ex-diretor da Cartoven, uma estatal que fabrica embalagens, morreu sob custódia das autoridades de segurança de Estado. O governo afirma que ele se suicidou. Seus parentes dizem temer por suas vidas.

Eles têm motivo para se preocupar. Em 20 de abril, o Tribunal Penal Internacional (TPI) publicou detalhes de depoimentos que colheu com supostas vítimas de abusos de direitos humanos na Venezuela. O procedimento é parte de uma investigação formal para determinar se o regime de Maduro cometeu ou não crimes contra a humanidade, incluindo contra opositores políticos, que possam resultar em indiciamentos formais. O documento, resultado de mais de 1,7 mil depoimentos, inclui relatos de tortura pelas mãos de capangas das autoridades de segurança de Estado.

A investigação do TPI foi mencionada no novo programa de TV de Maduro em 24 de abril. Jorge Rodríguez entrou no ar e detalhou cinco elementos que, segundo ele, são necessários para que as negociações com a oposição sejam retomadas. Juntamente com a suspensão de todas as sanções, ele pediu o fim imediato da investigação da corte internacional — apesar do fato de a Venezuela ser signatária do estatuto que estabeleceu o TPI. Depois de uma década no poder, o regime tirânico de Maduro considera-se agora inteiramente acima da lei. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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