The Economist: Os perigos da nova realidade chinesa

Presidente Xi Jinping será lembrado no futuro por sua campanha contra os excessos capitalistas na China

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Por The Economist
Atualização:

Xi Jinping está empreendendo uma campanha para purgar a China dos excessos do capitalismo. O presidente chinês vê o aumento da dívida como um fruto venenoso da especulação financeira e os bilionários como um escárnio ao marxismo. As empresas precisam seguir a orientação do Estado. O partido deve permear todas as áreas da vida nacional. Se Xi conseguir impor sua nova realidade, moldará o futuro da China, bem como a batalha ideológica entre democracia e ditadura.

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Sua campanha é notável por seu alcance e ambição. Começou a fazer barulho em 2020, quando autoridades bloquearam a oferta pública inicial do Ant Group, uma afiliada do gigante da tecnologia Alibaba. E continua trovejando nos dias de hoje, destruindo até agora talvez US$ 2 trilhões em riqueza. 

O Didi, uma plataforma de transporte privado, foi punido por listar suas ações na bolsa americana. A Evergrande, uma incorporadora imobiliária endividada, está prestes a dar calote nos credores. As negociações de criptomoedas foram proibidas, pois, de um jeito ou de outro, geram conteúdos voltados para a busca do lucro. Os jogos de azar são ruins para as crianças, por isso devem ser estritamente regulamentados.  A China precisa de famílias maiores, então o aborto precisa ser restringido. Os modelos masculinos devem ser viris e as celebridades, patrióticas. Na base de tudo isto está o Pensamento de Xi, que vem sendo martelado no crânio das crianças desde os 6 anos de idade.

Uma mulherfilma ums grande tela de vídeo que exibe o presidente chinês, Xi Jinping, falando durante um evento para comemorar o 100º aniversário do Partido Comunista Chinês. Foto: (AP Photo/Andy Wong)

A estas ideias se soma a um autoritarismo que já é brutal. Como presidente, Xi expurgou seus rivais e prendeu mais de 1 milhão de uigures. Ele policia o debate e não tolera divergências. A campanha vai mostrar se ele é um ideólogo determinado a agarrar o poder para si mesmo, ainda que o crescimento diminua e as pessoas sofram, ou se é um homem forte disposto a temperar o dogma com uma dose de pragmatismo. Sua visão, na qual o controle do partido deve garantir que os negócios estejam alinhados ao Estado e os cidadãos sirvam à nação, determinará o destino de 1,4 bilhão de pessoas.

Xi está enfrentando problemas concretos – na verdade, muitos deles têm paralelos no Ocidente. O primeiro é a desigualdade. O slogan do momento é “prosperidade comum”, refletindo como a China comunista continua tão desigual quanto alguns países capitalistas. As 20% famílias chinesas mais ricas levam para casa mais de 45% da renda disponível no país – as que ocupam o 1% no topo possuem mais de 30% da riqueza.  Outra preocupação é o impacto das gigantes da tecnologia, acusadas de fazer concorrência desleal, corromper a sociedade e ter acesso irrestrito aos dados pessoais (apenas o Estado teria esse privilégio). Um terceiro problema é a vulnerabilidade estratégica, particularmente a ameaça de que os adversários obstruam o acesso a commodities e tecnologias vitais.

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No entanto, a campanha de Xi representa uma ameaça para a economia chinesa. O drama de desvendar a dívida de empresas como a Evergrande pode se espalhar de forma imprevisível. As incorporadoras estão sentadas em US$ 2,8 trilhões em empréstimos. O desenvolvimento imobiliário e as indústrias que o atendem sustentam cerca de 30% do PIB da China. 

As famílias estacionaram suas economias nos imóveis, em parte porque outros ativos oferecem um retorno ruim. Os gastos das famílias com propriedades ainda inacabadas representam metade do financiamento das incorporadoras. Os governos locais, especialmente fora das grandes cidades, dependem da venda de terrenos e da construção de propriedades para gerar receita.

As repressões também estão deixando os negócios mais difíceis e menos recompensadores. O partido estava criando uma estrutura regulatória e jurídica, mas Xi passou a impor grandes mudanças de cima para baixo e com tanta velocidade que a regulamentação começou a parecer arbitrária. Veja-se, por exemplo, a “redistribuição terciária”, pela qual empresas de tecnologia criticadas entregam dinheiro ao Estado na tentativa de se redimir.

Como o sucesso-ostentação ficou perigoso, as empresas privadas ficarão mais cautelosas. Empresas estatais e indústrias estratégicas – e entre elas a “tecnologia pesada”, como a de semicondutores – podem se beneficiar, mas não os empresários que têm sido a verdadeira fonte do dinamismo da China. Uma medida da ansiedade é que os estrangeiros, que não são reprimidos pelos controles de capital, pagam 31% menos do que os investidores do continente por papéis idênticos. A diferença aumentou acentuadamente desde o início de 2020.

Tudo isso ameaça prejudicar a economia chinesa, que já vinha enfrentando um aperto devido aos retornos decrescentes do investimento em infraestrutura e aos efeitos de uma força de trabalho cada vez menor e do número crescente de dependentes idosos. Após 40 anos de expansão vertiginosa, a maioria dos chineses não sabe como lidar com as escolhas difíceis que a desaceleração acentuada e sustentada imporá.

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Na política, o perigo é que a campanha de Xi se degenere em um culto à personalidade. Para trazer mudanças, ele conquistou mais poder do que qualquer líder desde Mao Tsé-tung. Enquanto se prepara para romper o protocolo no 20.º congresso do Partido Comunista, no ano que vem, reivindicando um terceiro mandato presidencial de cinco anos, ele está usando a campanha para organizar uma grande rotatividade de pessoal, pautada na repressão ideológica e na ideia de que ele deve permanecer no comando. Cada um desses aspectos contém seus próprios riscos.

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O primeiro é que a burocracia o desaponte. Xi quer que a burocracia responda aos sinais do mercado, mas, com promoções e expurgos no ar, as autoridades chinesas estão inquietas. Uma das causas dos cortes de energia em cerca de 20 províncias nas últimas semanas foi o pânico dos burocratas que, de repente, perceberam que não conseguiriam cumprir suas metas de redução de carbono. Da mesma forma, porém, algumas autoridades, com medo de serem acusadas de corrupção ou desvio ideológico por seus rivais, tendem a ficar de braços cruzados. O fracasso é perigoso para o burocrata que toma a iniciativa – o sucesso também.

Outro perigo vem da repressão ideológica. “Conselhos de análise moral” e “clínicas morais” estão reforçando o comportamento ortodoxo a partir do emprego da vergonha pública. Embora ainda não haja perspectiva de algo tão terrível quanto a Revolução Cultural, os chineses estão menos livres para pensar e falar. Além de promover suas próprias doutrinas, Xi vem enaltecendo a nostalgia vermelha e lançou o maoismo como estágio vital na construção de uma Nova China, ampliando seu apoio às vésperas do congresso do partido.

Por último, vem a estratégia política do próprio Xi. No longo prazo, se ele se apegar ao poder, a sucessão pode ficar altamente instável. No curto prazo, se sua tentativa de impor uma nova realidade não der certo, ele enfrentará a escolha fatídica entre dobrar a aposta ou recuar. Até esse ponto, a repressão parece mais provável do que a transigência.

Os governos ocidentais também estão lidando com problemas com as empresas de tecnologia, a desigualdade e a segurança nacional. Nos EUA, o Congresso aprovou o aumento do teto da dívida nacional. Alguns talvez até invejem a capacidade de Xi para fazer as coisas rapidamente. Mas seria um grande erro imaginar que ele tem as respostas certas. /TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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© 2019 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS 

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