TORONTO - Diante de pilhas de drogas divididas em sacos plásticos transparentes e caixas de armazenamento, o chefe de polícia de Toronto anunciou na semana passada a maior apreensão de cocaína da história da corporação, interceptada na fronteira em um caminhão que entrava dos Estados Unidos.
Algumas horas depois, o presidente Trump também abordou o tráfico transfronteiriço de drogas mas, no seu caso, para culpar o Canadá, pelo menos em parte, por uma crise mortal de fentanil.
“O fentanil que chega pelo Canadá é massivo”, disse Trump a repórteres no dia seguinte à sua posse, sem oferecer provas de suas afirmações. “O fentanil que chega pelo México é massivo. As pessoas estão morrendo, e as famílias estão sendo destruídas.”
Foi uma repetição de sua alegação de que Canadá e México não fizeram o suficiente para reforçar suas fronteiras e bloquear o fluxo de narcóticos — e migrantes — para os Estados Unidos. Ele ameaçou impor tarifas punitivas de 25% sobre as exportações de ambos os países em 1º de fevereiro.

O indicado para secretário do Comércio, Howard Lutnick, reiterou essa posição em sua audiência de confirmação no Senado na quarta-feira, pedindo que o Canadá “respeite a América”.
“Se somos seu maior parceiro comercial, mostre-nos respeito”, disse Lutnick. “Feche sua fronteira e acabe com o fentanil entrando neste país.”
Para evitar as tarifas, o governo canadense tem enviado drones, unidades caninas e helicópteros para reforçar a vigilância na fronteira. No entanto, recentes anúncios das autoridades sobre as iniciativas e as garantias do primeiro-ministro Justin Trudeau parecem ter feito pouco para acalmar a nova administração dos EUA.
Dado o papel limitado do Canadá no tráfico transfronteiriço de fentanil, não está claro até que ponto o país poderia realmente contribuir para reduzir a crise de opioides nos Estados Unidos.
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De onde vem o fentanil no Canadá?
Antes de 2020, as redes de tráfico no Canadá atuavam principalmente como intermediárias para o fentanil e outros opioides importados. Mas, nos últimos anos, aumentaram a produção doméstica, uma tendência que outros países também devem seguir, de acordo com um relatório publicado este mês pela agência de inteligência financeira do Canadá.
Autoridades canadenses acreditam que cerca de 100 grupos do crime organizado estavam envolvidos na produção de fentanil no país no ano passado, um aumento de mais de quatro vezes em relação a 2022.
A polícia localizou laboratórios clandestinos de fentanil em todo o país, principalmente na Colúmbia Britânica, Alberta e Ontário. Em novembro, policiais na Colúmbia Britânica anunciaram o fechamento do maior laboratório já descoberto no Canadá, escondido em uma propriedade rural, onde foram apreendidos produtos químicos suficientes para produzir 96 milhões de doses de fentanil. A investigação revelou ligações com cartéis mexicanos.
Antes da mudança para a produção doméstica de drogas, a polícia e os agentes da fronteira canadenses combatiam o fluxo de pó de fentanil — usado para fabricar comprimidos — enviado ao país em quantidades quase indetectáveis pelo correio. Agora, o foco está na importação de produtos químicos utilizados na síntese do fentanil, conhecidos como precursores.

Quanto fentanil canadense cruza para os EUA?
Com a epidemia de opioides devastando os Estados Unidos e matando milhares de pessoas, o Congresso americano criou em 2020 uma comissão para investigar maneiras de reduzir o fluxo dessas drogas para o país. Segundo um relatório de fevereiro de 2022, a comissão concluiu que “o Canadá não é conhecido por ser uma grande fonte de fentanil, outros opioides sintéticos ou precursores químicos para os Estados Unidos”, com base em dados de apreensões.
No ano passado, agentes da Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA interceptaram cerca de 19 quilos de fentanil na fronteira norte, comparados a quase 9.600 quilos na fronteira com o México, onde cartéis produzem a droga em larga escala.
Financeiramente, não faz sentido para grupos criminosos canadenses focarem na exportação de fentanil para os EUA, disse Daniel Anson, diretor de inteligência e investigações da Agência de Serviços de Fronteira do Canadá. “É muito difícil competir com fentanil mexicano em razão do custo”, afirmou.
A agência de segurança pública do Canadá disse que, embora os grupos criminosos locais produzam opioides principalmente para o mercado interno, eles também têm expandido para outros países, incluindo Austrália, Nova Zelândia e Japão. Em 2022, a polícia australiana interceptou um grande carregamento de fentanil vindo do Canadá, equivalente a cerca de cinco milhões de doses.
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O que o Canadá está fazendo a respeito?
O Canadá tem algumas das regulamentações de importação de produtos químicos mais rigorosas do mundo sob a Lei de Drogas e Substâncias Controladas. No entanto, autoridades de saúde e policiais frequentemente enfrentam dificuldades para acompanhar a evolução dos componentes químicos usados pelo crime organizado para produzir fentanil.
Cerca de 80% dos produtos químicos usados na fabricação de fentanil podem ser legalmente importados da China ou adquiridos dentro do próprio Canadá, segundo um relatório publicado este mês pelo Serviço de Inteligência Criminal do Canadá. Alguns grupos criminosos estão criando empresas privadas para encobrir a intenção de suas compras, diz o relatório.
Em um caso recente em Alberta, um homem que operava o que se acreditava ser o maior laboratório ilegal de fentanil da província foi condenado a 16 anos de prisão. Os investigadores descobriram a operação rastreando remessas de precursores químicos legalmente importados da China para o Canadá.
Embora a quantidade de fentanil que sai do Canadá para os EUA seja mínima — apenas 0,2% do que é apreendido na fronteira sul dos EUA —, Anson afirmou que a agência de fronteira canadense criou novas equipes para focar na exportação da droga e na importação de produtos químicos sintéticos. Também planeja estabelecer um centro financeiro de crimes transfronteiriços no próximo ano para combater a lavagem de dinheiro e fraudes relacionadas ao tráfico de drogas.
“Estou 100% comprometido em garantir que não nos tornemos o elo fraco”, disse Anson.
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