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Turquia e Hungria ameaçam unidade da Otan em impasse com a Rússia

Enquanto a aliança se prepara para se reunir na Lituânia para uma cúpula crucial, dois líderes com perfil quase autoritário estão impedindo a adesão da Suécia

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Por Missy Ryan, Kareem Fahim, Emily Rauhala, Loveday Morris e Abigail Hauslohner

Quando os líderes dos países-membros da Otan se reunirem na Lituânia, esta semana, o presidente Joe Biden e seus aliados mais próximos se empenharão em mandar para a Rússia uma mensagem contundente: o Ocidente está unido contra a guerra do presidente Vladimir Putin na Ucrânia.

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Mas alguns dos líderes que participarão com Biden da cúpula em Vilna colocam em risco sua demonstração de coesão, os mesmos cuja recusa em admitir a Suécia como 31.º Estado a integrar o bloco sublinhou divisões capazes de erodir o poder de dissuasão da Otan em meio ao perigoso impasse com Moscou.

Enquanto o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, e o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, citaram objeções distintas em relação à entrada da Suécia, cujas avançadas Forças Armadas incrementarão o poder de combate da Otan, sua resistência compartilhada sublinhou a capacidade que qualquer país-membro possui de perturbar prioridades amplamente apoiadas na aliança.

O secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, segundo à esquerda, fala com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, à esquerda, o primeiro-ministro da Suécia, Ulf Kristersson, segundo à direita, e o ministro da Defesa da Turquia, Yasar Guler, à direita, durante uma reunião antes da cúpula da OTAN em Vilnius, Lituânia, segunda-feira, 10 de julho de 2023.  Foto: Yves Herman / AP

Apesar de problemáticos, esses líderes são importantes aliados da Otan: Erdogan, recém-saído de uma vitória eleitoral que cimenta mais de duas décadas no poder, e Orbán, que tem mantido relações calorosas com Putin e rejeitou parte da ajuda europeia à Ucrânia, são alvo de críticas por suas práticas antidemocráticas, mas também são reconhecidos por suas contribuições militares e de outros tipos para a aliança.

A disputa a respeito da adesão da Suécia, que exige aprovação dos legisladores turcos e húngaros para ser concluída, não apenas representa uma ameaça ao objetivo de Biden de provar que comanda uma aliança ocidental forte, mas serve também como lembrete de outras diferenças que perseguem a Otan, incluindo discordâncias sobre níveis de gasto militar, o caminho de adesão da Ucrânia e, mais recentemente, a decisão da Casa Branca de fornecer munição de fragmentação para a Ucrânia.

O diplomata veterano dos EUA Alexander Vershbow, ex-vice-secretário-geral da Otan, afirmar que navegar diferenças internas faz parte do “custo das negociações” de qualquer organismo fundamentado no consenso, como a Otan, cujos aliados, crucialmente, devem se comprometer a enviar suas tropas para proteger qualquer país-membro caso necessário.

“No fim das contas, a Otan nunca ficou paralisada quando algo de importância absolutamente vital esteve em jogo”, afirmou Vershbow, que trabalha atualmente como pesquisador no Atlantic Council. “É isso que importa.”

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Cúpula crucial para o Ocidente

A cúpula de 11 e 12 de julho ocorre num momento em que líderes ucranianos fazem apelos urgentes por mais armamentos do Ocidente, incluindo caças de combate, que eles dizem ser necessários para conseguir vencer a dura operação de retomada de território ocupado pela Rússia. Os ucranianos também estão em busca de um caminho mais claro para aderir à Otan.

A invasão de 2022 de Putin à Ucrânia ressuscitou na Otan — criada em 1949 conforme as linhas de batalha da Guerra Fria eram desenhadas — sua premência, conforme os aliados endurecem suas defesas contra o que percebem como uma ameaça renovada da Rússia. Ainda que a própria Otan não tenha fornecido armas para a Ucrânia, a aliança tem servido como um fórum para coordenar o aumento massivo do apoio ocidental a Kiev.

Como a Finlândia, que concluiu seu processo de adesão em abril, a Suécia abandonou décadas de não alinhamento militar em resposta à invasão de Putin. Apesar de Erdogan ter decidido desistir de sua resistência à adesão finlandesa, em março ele se recusou a aprovar a entrada da Suécia citando queixas adicionais.

Os diplomatas agora enfrentam dificuldades — depois de meses expressando estar confiantes de que a cúpula em Vilna produziria uma chance de celebrar a adesão da Suécia — para convencer a Hungria e especialmente a Turquia a mandar um sinal de que permitirão o avanço da adesão de Estocolmo.

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As razões da Turquia para se opor à adesão da Suécia incluem o que Ancara classifica como uma recusa dos suecos de extraditar indivíduos que considera terroristas, incluindo membros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e de um movimento acusado de tentar derrubar o governo turco em 2016. A Turquia também se queixou de protestos anti-Erdogan organizados na Suécia e de manifestações em que exemplares do Alcorão foram queimados.

Essas queixas se encaixam na retórica populista que Erdogan usou domesticamente durante a campanha para a eleição presidencial de maio, quando ele retratou seus oponentes como apoiadores de militantes curdos e inimigos dos valores tradicionais islâmicos — temas que ressoaram entre eleitores nacionalistas e a base de apoiadores do presidente turco.

Erdogan reiterou esses temas na semana passada, qualificando uma queima do Alcorão ocorrida durante o dia sagrado muçulmano do Eid al-Adha como “um ato hediondo” e afirmando que o caso não foi “evento isolado”.

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Enquanto autoridades graduadas dos EUA e da Otan insistem que Estocolmo cumpriu os termos expostos no ano passado para tranquilizar as preocupações de segurança de Ancara — que incluiram uma emenda à Constituição sueca e a aprovação de leis antiterrorismo mais duras no país nórdico — Erdogan tem se recusado a levar o protocolo de adesão da Suécia para votação dos legisladores turcos.

Na opinião de Sinan Ulgen, pesquisador sênior do instituto Carnegie Europe, em Bruxelas, ainda que tenha havido um “ângulo doméstico” na postura da Turquia em relação à Suécia, que Erdogan usou para obter apoio político, sua oposição “nunca foi apenas uma ferramenta eleitoral”. Em vez disso, afirmou Ulgen, foi uma moeda de troca para extrair uma concessão crítica dos Estados Unidos.

Uma resolução rápida pareceu mais improvável após um telefonema, no domingo, entre Erdogan e Biden, no qual, segundo comunicado de Ancara, o presidente da Turquia disse ao americano que o simples fato de os protestos na Suécia organizados pelo que o governo turco classifica como apoiadores de grupos curdos extremistas continuarem sendo permitidos, ainda que Estocolmo tenha dado passos positivos, “anulam” essas ações. O comunicado da Casa Branca declarou que Biden expressou seu desejo de ver a Suécia aderir à Otan “assim que possível”.

Autoridades e analistas afirmam que o custo da aquiescência turca parece ser um contrato de aquisição de caças de combate F-16 dos EUA, um acordo que o governo Biden defendeu argumentando que o fornecimento das aeronaves fortalecerá as defesas da Otan em seu flanco oriental mas que há muito tempo enfrenta oposição no Congresso.

No atual estágio, a aprovação turca à candidatura sueca de adesão à Otan “tem mais a ver com o que os EUA acabarão fazendo ou não do que com as ações recentes da Suécia”, afirmou Ulgen.

Enquanto o democrata Robert Menendez, senador de Nova Jersey e presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, se opõe há muito à venda dos F-16 em razão do histórico de desrespeito aos direitos humanos da Turquia e de sua atitude hostil em relação à Grécia, que também integra a Otan, congressistas americanos contrários ao contrato se multiplicaram conforme o processo de adesão da Suécia se arrastou. Legisladores, incluindo o líder da minoria no Senado, Mitch McConnell, (republicano do Kentucky) afirmam agora que votarão contra a venda de jatos até a Turquia ceder.

A complexa relação dos turcos com a Rússia, com quem Ancara compartilha vínculos econômicos profundos e um histórico de acordos e rivalidades, serve como pano de fundo para o baile sueco de Erdogan. Ainda que tanto o presidente turco quanto Putin considerem a si mesmos contrapesos em relação ao poder americano, seus países têm se encontrado em lados diferentes nos conflitos recentes, incluindo na Líbia e na Síria.

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Depois que os turcos derrubaram um caça de combate russo em 2015, a Rússia suspendeu um fluxo lucrativo de turistas para a costa mediterrânea da Turquia e a importação de produtos agrícolas turcos.

Relações da Turquia com a Rússia

As relações da Turquia com a Rússia têm sido um frequente ponto de atrito de Ancara com Washington. Quando o governo turco adquiriu um avançado sistema de defesa aérea da Rússia, os americanos responderam com sanções e removeram a Turquia de seu programa de jatos F-35, o que deu a Putin uma vitória dupla: o incidente criou uma diferença interna de tratamento a membros da Otan e impossibilitou a colocação de aeronaves avançadas próximo às tropas russas na Síria.

Em outras ocasiões, essas relações beneficiaram o Ocidente, por exemplo quando a Turquia ajudou a intermediar um acordo entre Moscou e Kiev que permitiu a retomada das exportações de grãos ucranianos pelo Mar Negro ou ajudou organizar uma troca de prisioneiros de guerra de alto nível.

“É uma relação complicada, cheia de nuances”, afirmou o ex-embaixador americano na Turquia David Satterfield, que atualmente dirige o Instituto Baker para Políticas Públicas, da Universidade Rice, a respeito das relações da Turquia com a Rússia. “Mas no fim, enquanto membros da Otan, nós consideramos essa relação valiosa para a aliança.”

Diplomatas apontam que a Turquia, que comanda a segunda maior força terrestre da Otan e enviou soldados para participar de missões da aliança em países que incluem o Afeganistão, continua uma colaboradora valiosa. Ancara também tem sido apoiadora confiável da Ucrânia, vendendo a Kiev drones armados desde antes da invasão de Putin de 2022.

Enquanto isso, as autoridades da Hungria têm citado várias razões para a recusa de seu país em ratificar a adesão da Suécia, em razão do que um porta-voz do governo húngaro qualificou como uma disposição do país nórdico em “criticar a Hungria sentada em seu trono oco de superioridade moral”.

Mas a obstrução húngara tem menos a ver com a Suécia do que com a forte afinidade de Orbán com Erdogan, afirmou Peter Kreko, diretor do instituto de análise Political Capital, de Budapeste. “Por um lado, a Turquia se comporta de maneira exemplar”, afirmou ele. “Em segundo lugar, é uma fonte de inspiração ideológica. E além disso é uma importante parceira comercial — não apenas em nível nacional, mas também em círculos empresariais próximos às família de Erdogan e de Orbán.”

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A Hungria é um ponto fora da curva na Otan em razão das relações calorosas de Orbán com Putin, do ceticismo do país a respeito dos objetivos de guerra da Ucrânia e de sua recusa em permitir que armas destinadas aos ucranianos atravessem seu território. Orbán é criticado em razão de suas práticas de governo, entrando em atrito constantemente com a União Europeia em razão de sua atitude quanto à imigração e ao estado de direito. E como a Turquia, a Hungria tem buscado a Rússia para manter sua economia no azul.

O ministro húngaro de Relações Exteriores, Peter Szijjarto, afirmou que Budapeste não obstruirá a candidatura da Suécia se for o único Estado-membro nessa iniciativa. Se houver alguma mudança na posição da Turquia, “então evidentemente nós manteremos a promessa de que a Hungria não se oporá a nenhum país em termos de adesão”, disse ele a repórteres na semana passada.

O senador James Risch (Idaho), republicano mais graduado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, afirmou que os esforços da Turquia em obter concessões não relacionadas à adesão da Suécia o levaram a questionar se países que apresentam obstáculos à missão maior da aliança ainda devem continuar membros.

“Veja, quando nós temos uma aliança como esta, com (…) 31 países, é importante que cada país trate das questões segundo o interesse da aliança — e não segundo seu interesse próprio; particularmente se ele for irrelevante para a fundação ou o propósito da aliança”, disse ele a repórteres.

Esses desafios internos estiveram visíveis durante as preparações para a cúpula de Vilna, conforme divisões regionais e facciosas a respeito de quem melhor substituiria Jens Stoltenberg como secretário-geral da Otan, anteriormente à sua antecipada partida neste verão, ocasionaram a extensão de seu mandato por mais um ano.

Mas diplomatas afirmam que a Otan superou graves desafios internos ao longo das décadas notando que a França, um dos mais membros mais influentes da aliança, retirou-se de seu comando militar em protesto na década de 60. Paris só retornou para o comando militar da aliança em 2009. “A Otan já resistiu a coisa assim no passado”, afirmou Satterfield. “E vai resistir desta vez.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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