A cidade polonesa de Przemysl se tornou principal ponto de entrada e saída da Ucrânia em meio à guerra com a Rússia. Por lá, mais de um milhão de civis, principalmente mulheres e crianças, cruzaram a fronteira para o lado polonês, fugindo das bombas de Vladimir Putin. No caminho inverso, cerca de 20 mil combatentes estrangeiros já atenderam ao chamado do presidente Volodmir Zelenski para combater os russos. Do lado do Kremlin, mais de 16 mil homens foram contratados na Síria para combater na Ucrânia.
Cerca de 4 mil desses voluntários são veteranos de guerra americanos, que à revelia da recomendação da Casa Branca, cruzaram o Atlântico para lutar ao lado dos ucranianos na guerra. Veteranos europeus, principalmente do Reino Unido e Holanda, muitos dos quais também com experiências no Iraque, Síria e no Afeganistão, também se apresentaram para lutar na chamada Legião de Defesa Territorial na Ucrânia.
O americano Lane Perkins chegou à fronteira na semana passada. A ideia dele é chegar a Lviv e apresentar-se a um posto de recrutamento na cidade. A ideia dele é combater os russos cara a cara. “É uma causa nobre”, diz o veterano de guerras no Iraque e Afeganistão. “Esse confronto não foi provocado (pela Ucrânia)”.
Natural de San Diego, na Califórnia, ele conta que entrou em contato pela internet com grupos de recrutamento ucranianos. Alguns, exigem compromissos como entrega do passaporte para que o voluntário não abandone a causa no primeiro retrocesso. Outros são mais flexíveis e permitem uma colaboração menos forçada.
Histórias da guerra na Ucrânia
Triagem depois da fronteira
Passando a fronteira, é em Lviv que os voluntários passam por uma triagem. Alguns tem experiência em operações especiais, outros tem elos com milícias ucranianas de extrema direita e há quem apenas se apresente para ajudar, sem qualquer formação militar.
O americano Michael Ferkol , outro veterano do Exército americano, morava em Roma quando ouviu o apelo de Zelenski pela ajuda de voluntários estrangeiros na Ucrânia. De ascendência ucraniana, se apresentou em Lviv para servir como paramédico no front. “Disse a eles que poderia ajudar no atendimento a feridos. Mas tinha um finlandês lá dizendo que tudo que ele queria era matar russos”, contou.
Quem decide tudo isso é o posto de recrutamento do governo provincial de Lviv. Shepelyak, um funcionário público que prefere não se identificar completamente, cuida da papelada. “Aqui tudo ainda está no começo. Mas o desejo deles de ajudar é muito importante.”
Para entender o conflito na Ucrânia
Apesar da tentativa de organizar o fluxo de voluntários, há quem simplesmente tente entrar por conta própria e se apresentar diretamente no front. Angelique Osmon é outra veterana do Exército americano que pretende combater na Ucrânia. Ela planeja deixar o Texas e chegar a Kiev via Polônia. “Quero lutar nas trincheiras e ajudar a defender Kiec”, diz a militar, de ascendência judaica.
Seu maior desafio é levar o material de combate que usou nas lutas contra o Estado Islâmico para enfrentar os russos. “Sabemos que ganharemos uma arma chegando lá, mas o resto do equipamento precisamos arrumar por nossa conta”, disse. “Além disso, o nível de experiência dos voluntários será desigual.
De tropas de elite a civis sem experiência
Há, no entanto, quem seja expert em combate. Dezenas de ex-soldados do Regimento de Pára-quedistas de elite do Exército Britânico se apresentaram para lutar. Muitas vezes chamado de Paras, o regimento serviu nos últimos anos no Afeganistão e no Iraque.
“Eles são todos altamente treinados, e viram serviço ativo em várias ocasiões”, disse o ex-soldado do regimento. A crise na Ucrânia lhes dará propósito, camaradagem e “uma chance de fazer o que eles são bons: lutar”.
Segundo veteranos estrangeiros, eles podem ser úteis como franco-atiradores ou para treinar soldados ucranianos no uso de armas sofisticadas que os países ocidentais estão enviando. Faltam especialistas que saibam manusear armas antitanque como o Javelin, que soldados profissionais treinam durante meses para usar corretamente.
Riscos de complicar o conflito
O costume dos americanos de intervir no campo de batalha de outra nação não é novo, segundo o historiador David Malet, da Universidade Americana de Washington, DC. “Isso ocorreu no final da década de 1940, e a campanha mais recente contra o Estado Islâmico no Iraque e na Síria”, diz.
Mas em uma guerra tão volátil e complexa como esta, o envolvimento direto dos americanos pode ter consequências involuntárias perigosas. “Alguns militares podem ser tentados a se juntar às milícias ucranianas de extrema direita ou acabar capturados ou mortos”, diz. “Qualquer um dos cenários daria ao presidente russo Vladimir Putin uma vitória de propaganda significativa e potencialmente despertaria apoio dentro da Rússia para um ataque aos países da Otan.”
O pior cenário, alertou Malet, é um incidente que ajuda a impulsionar os Estados Unidos a se juntarem ao conflito. Com isso em mente, o Pentágono fez um apelo para que seus veteranos não se juntem ao conflito na Ucrânia.
“O governo Biden desencorajou fortemente os veteranos militares americanos de se juntarem à luta. Em vez disso, o porta-voz do Pentágono, John Kirby, sugeriu que seria mais sensato doar para agências que respondem à crise humanitária. “Ainda não acreditamos que a Ucrânia seja um lugar seguro para os americanos irem”, disse Kirby a repórteres no Pentágono. “Pedimos que não vá. E se algum ainda estiver lá, pedimos que saiam.”
Mercenários pró-Rússia
Na Rússia, Vladimir Putin, deu sinal verde para o recrutamento de 16 mil " voluntários” do Oriente Médio, que se juntariam ao esforço de guerra na Ucrânia. O Ministério da Defesa russo disse que os mercenários seriam enviados para a região separatista de Donbas, onde grande parte dos combates se concentraram.
Na Síria, os militares já começaram a recrutar tropas de suas próprias fileiras para lutar ao lado das forças russas, prometendo pagamentos de US$ 3 mil por mês – uma quantia de até 50 vezes o salário mensal de um soldado sírio. / NYT, W.POST E REUTERS
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