Ucrânia prepara retirada em massa de milhões após ataques da Rússia a rede de energia

O governo ucraniano já começou a retirada de civis da cidade recém-recuperada de Kherson e planeja fazer o mesmo em Mikolaiv, onde a destruição da rede elétrica promete tornar o inverno perigoso

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

KIEV - Conforme a Rússia investe em sua estratégia de utilizar o inverno do Hemisfério Norte como arma de guerra, a Ucrânia prepara a retirada de milhões de civis das regiões do sul, onde ataques a infraestruturas básicas de energia e água colocar em risco a vida dos ucranianos quando as temperaturas ficarem abaixo de zero. O governo já começou as retiradas na recém-recuperada Kherson e pretende fazer o mesmo em Mikolaiv. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), espera-se que até três milhões de ucranianos deixem suas casas neste inverno.

PUBLICIDADE

Depois de sofrer importantes derrotas em ofensivas ucranianas que retomaram parte dos territórios do leste do sul, incluindo a perda de Kherson que estava ocupada por russos desde o início da guerra, a Rússia tem direcionado os seus ataques à rede elétrica e outras instalações críticas da Ucrânia. Os ataque têm provocado apagões generalizados e forçou o governo a programar interrupções de energia, mas conforme o inverno se aproxima, os temores de cortes prolongados de eletricidade, água e aquecimento aumentam.

Irina Vereshchuk, vice-primeira-ministra da Ucrânia, disse em um comunicado no Telegram que o governo começou a ajudar os residentes a deixar Kherson e pelo menos um trem já partiu da cidade na noite de segunda-feira, 21. O governo também está planejando ajudar a retirar os moradores de Mikolaiv, outra cidade com eletricidade e infraestrutura de aquecimento prejudicadas. Vereshchuk pediu que pessoas vulneráveis, incluindo idosos e pessoas com mobilidade reduzida, aproveitem a oferta do governo de transporte e abrigo gratuitos.

Civis retirados de Kherson embarcam em um trem para Kiev, na segunda-feira, 21 de novembro de 2022 Foto: Lynsey Addario/NYT

Embora as autoridades locais estimem que apenas cerca de 80.000 pessoas permanecem em Kherson - bem abaixo da população pré-guerra de cerca de 250.000 - algumas começaram a retornar à cidade. Um fluxo constante de tráfego estava indo para Kherson ao entardecer de domingo. Mas o inverno pode ser difícil, em Kherson e além.

Hans Kluge, diretor regional da OMS para a Europa, expressou grande preocupação com os próximos meses. “O tempo frio pode matar”, disse ele. O próximo inverno, acrescentou, “será sobre sobrevivência”. Dez milhões de ucranianos estão atualmente sem energia, e metade da infraestrutura de energia do país está danificada ou destruída, disse Kluge.

Publicidade

A OMS espera que entre dois milhões e três milhões de ucranianos deixem suas casas em busca de calor e segurança neste inverno, disse Kluge. Não ficou claro, porém, se este número se refere a pessoas que devem deixar o país ou seguirão para outras partes da Ucrânia.

Mais de 7,8 milhões de pessoas fugiram da Ucrânia como refugiados desde fevereiro, de acordo com a agência de refugiados das Nações Unidas, o maior deslocamento de pessoas na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Milhões de outros fugiram de suas casas, mas permaneceram no país.

Os hospitais também estão enfrentando a ameaça adicional de escassez de energia, disse Kluge. A dificuldade que os moradores terão de acessar serviços de saúde confiáveis aumentou a preocupação da OMS com a disseminação do coronavírus e da gripe sazonal neste inverno.

Moradores locais recebem abastecimento de água no centro de Kherson em 19 de novembro de 2022 Foto: Genya Savilov/AFP

Estocar cobertores

A Ucrânia como um todo se prepara para um inverno congelante e com episódios de apagões que podem durar até março. O presidente Volodmir Zelenski pediu na segunda-feira aos residentes que limitem seu consumo de energia. “Todos os nossos funcionários e empresas devem ser muito moderados e distribuir o consumo por horas do dia”, disse ele em seu discurso noturno à nação.

Sergei Kovalenko, CEO da fornecedora privada de energia DTEK Yasno, disse em um post no Facebook na segunda-feira que a empresa estava sob instruções da operadora de rede estatal da Ucrânia para retomar os apagões de emergência nas áreas que cobre, incluindo a capital Kiev e a região leste de Dnipropetrovsk.

Publicidade

“Embora haja menos apagões agora, quero que todos entendam: muito provavelmente, os ucranianos terão que conviver com apagões até pelo menos o final de março”, alertou.

“Acho que precisamos estar preparados para diferentes opções, mesmo as piores. Abasteça-se de roupas quentes, cobertores, pense no que vai ajudá-lo a esperar um longo período de paralisação”, disse ele, dirigindo-se aos residentes ucranianos.

Segundo Kovalenko, mesmo que não haja mais ataques russos à rede elétrica ucraniana, serão necessárias interrupções programadas em toda a Ucrânia para garantir que a energia seja distribuída uniformemente pela rede elétrica danificada.

Zelenski disse que os ataques com mísseis russos danificaram mais de 50% das instalações de energia do país.

Exposição de cartazes de propaganda russa trazidos de Kherson para Kiev em 22 de novembro de 2022 Foto: Gleb Garanich/Reuters

Avanço ucraniano no sul

A batalha continua intensa na Ucrânia, apesar da deterioração das condições climáticas, com as forças ucranianas pressionando contra as posições russas como parte de uma contraofensiva de uma semana e as forças de Moscou mantendo bombardeios e ataques com mísseis.

Publicidade

Em um desenvolvimento importante, um oficial ucraniano reconheceu que as forças de Kiev estão atacando posições russas no Kinburn Spit, que é uma porta de entrada para a bacia do Mar Negro e partes da região sul de Kherson que ainda estão sob controle russo.

O Kinburn Spit é o último posto avançado da Rússia na região de Mikolaiv. As forças ucranianas recentemente libertaram outras partes das regiões de Kherson e Mikolaiv. Moscou usou o local como base para ataques com mísseis e artilharia contra posições ucranianas na província de Mikolaiv e em outros lugares ao longo da costa do Mar Negro controlada pela Ucrânia.

Capturar a região pode ajudar as forças ucranianas a entrar no território que a Rússia ainda mantém na região de Kherson “sob significativamente menos fogo de artilharia russa” do que uma tentativa de travessia direta do Rio Dnieper provavelmente desencadearia, disse Instituto para o Estudo da Guerra, um think tank com sede em Washington.

O Instituto acrescentou que o controle da área ajudaria Kiev a aliviar os ataques russos aos portos do sul da Ucrânia e permitiria à Ucrânia aumentar sua atividade naval no Mar Negro.

Monastério

Em Kiev, oficiais ucranianos invadiram nesta terça-feira, 22, um mosteiro ortodoxo centenário, dizendo que pretendiam impedir seu uso como centro de atividades subversivas pró-Rússia. Moscou condenou a medida como um ataque à Igreja Ortodoxa Russa.

Publicidade

O Kyiv-Pechersk Lavra, também conhecido como Mosteiro das Cavernas, é considerado um dos locais mais sagrados para russos e ucranianos. É a sede da Igreja Ortodoxa Ucraniana, que até recentemente era subordinada à Igreja Ortodoxa Russa, em Moscou.

Religioso diante da entrada do monastério Kyiv-Pechersk Lavra, alvo de uma operação das forças de segurança da Ucrânia, em Kiev  Foto: Brendan Hoffman/The New York Times

A busca no monastério foi uma demonstração da profunda desconfiança em relação à Igreja Ortodoxa Ucraniana, que há muito prometeu sua lealdade ao Patriarca de Moscou. Após a invasão da Rússia em fevereiro, a liderança da igreja ucraniana fez uma pausa formal, mas funcionários do governo falaram abertamente sobre as suspeitas de que alguns membros do clero ainda são leais a Moscou.

Oficiais do serviço de segurança estatal da Ucrânia disseram em comunicado que, juntamente com a polícia e a guarda nacional, realizava atividades de “contra-inteligência” no mosteiro destinadas a “combater as atividades subversivas dos serviços especiais russos na Ucrânia”./AP e NYT

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.