BRASÍLIA - O governo da Ucrânia esperava mais “apoio” do Brasil e gostaria que o governo Luiz Inácio Lula da Silva levantasse a voz contra a explosão da barragem de Kakhovka, disse nesta terça-feira, dia 6, a embaixada do país em Brasília. A detonação da barragem da usina hidrelétrica é considerada por Kiev um ato de terrorismo provocado pela Rússia.
O encarregado de negócios ucraniano, Anatoliy Tkach, atualmente chefe da missão diplomática no País, disse ter informado o Itamaraty sobre o incidente na represa e a situação de emergência, mas afirmou que não recebeu nenhuma resposta.
“Evidentemente gostaríamos de contar com a condenação do governo brasileiro contra atos de terrorismo em massa”, afirmou Tkach. “A embaixada informou ao governo sobre a explosão na usina de Kakhovka. Até o momento não temos um comunicado do governo brasileiro. Gostaríamos de ter um maior apoio nas situações críticas, em particular como nessa da usina.”
Até a noite desta terça-feira, a diplomacia brasileira não havia publicado nenhuma nota sobre o caso, o que contrasta com reações de conflitos em outras partes do mundo, como na África e no Oriente Médio. O presidente Lula também não falou sobre o assunto.
Somente na tarde desta quarta-feira, dia 7, o Itamaraty publicou uma nota a respeito do rompimento da represa. O comunicado não cita a Rússia, ao contrário do que Kiev acusa. O Ministério das Relações Exteriores afirmou que o governo brasileiro está disposto a colaborar para mitigar as consequências do incidente e que “considera indispensável a apuração de responsabilidades no episódio por entidade internacional isenta e independente”.
“O governo brasileiro recebeu, com consternação, a notícia do rompimento da barragem de Kakhovka, na Ucrânia. O rompimento da barragem demonstra, uma vez mais, o trágico e duradouro impacto da guerra para as populações civis, e também a urgência da busca do entendimento entre as partes com vistas à cessação das hostilidades”.
Segundo o Itamaraty, o ministro Mauro Vieira conversou com o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, sobre a segurança das instalações nucleares na usina de Zaporizhia.
Segundo Tkach, os russos tinham como objetivo atrapalhar a contraofensiva militar ucraniana, na tentativa de recuperar terreno na região e fazer as forças russas recuarem. Segundo ele, os danos causados pelos russos pretendiam ainda provocar mortes, seja de civis ou militares. O diplomata afirmou que Kiev ainda não contabilizou as vítimas.
“Isso é um crime de guerra, cometido intencionalmente, e foi planejado. As Forças Armadas russas discutiram essa possibilidade, assim como propagandistas russos na TV”, disse o encarregado de negócios a jornalistas. “A Rússia é totalmente responsável. A explosão da barragem é o maior desastre causado pelo homem na Europa nas últimas décadas. Não há dúvida de que a destruição proposital da barragem foi realizada pelos invasores russos para criar um desastre ecológico e complicar a desocupação dos territórios ucranianos. É mais um crime inédito que terá consequências ecológicas, econômicas e que ameaça a radiação e a segurança alimentar. Os efeitos serão sentidos não só pela população do Sul da Ucrânia, mas também dos outros países.”
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O governo de Volodimir Zelenski considera que os russos planejaram um ato de sabotagem. Eles falam em “terrorismo” contra a infraestrutura crítica da Ucrânia. Segundo o diplomata, autoridades ucranianas já sabiam que os militares russos haviam instalado, há cerca de um ano, explosivos na barragem da usina hidrelétrica, que fica em uma região ocupada por Moscou. Ele diz que um míssil não causaria danos comparáveis em extensão.
A explosão vai alagar cerca de 80 assentamentos civis e pode afetar a produção agrícola na área. A barragem, localizada na cidade de Nova Kakhovka, sustentava um volume de 18 milhões de metros cúbicos de água. Ao menos 42 mil pessoas deveriam ser removidas, sendo 17.130 no território controlado por forças ucranianas, na marquem esquerda do rio Dnipro, e cerca de 25 mil em terreno sob comando russo, na margem direita. As estimativas são do governo ucraniano.
A expectativa de Kiev é que a água continue a subir nas cidades por ao menos cinco dias e que o nível caia ao longo do tempo. A altura máxima ainda não foi atingida. Haverá problemas para abastecimento de água potável nas regiões de Kherson, Dnipro, na península da Crimeia e Zaporizhzia.
A usina nuclear em Zaporizhzhia é abastecida com água da mesma represa, cujo nível caiu, mas segundo a embaixada da Ucrânia ainda não há risco maior apresentado ao funcionamento até o momento.
A cobrança da Ucrânia ocorre depois do desencontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Volodimir Zelenski, em Hiroshima, no Japão, por ocasião da cúpula do G-7. Questionado sobre o episódio, o chefe da missão ucraniana disse que continua em contatos com o governo brasileiro e que há intenção de um diálogo de alto nível. Ele repetiu a versão oficial de que houve uma incompatibilidade de agendas durante o G-7. Antes, Lula dissera que Zelenski não apareceu para a conversa, enquanto o presidente da Ucrânia afirmou que não foi o culpado pelo desencontro.
O diplomata apelou que os “parceiros internacionais” apoiem a “fórmula da paz” proposta por Zelenski. O plano com as condições de Kiev para o fim do conflito inclui dez pontos, como segurança nuclear, ambiental, energética, punição pelos crimes, devolução total das áreas tomadas e libertação de presos. A proposta difere dos termos que Lula considera factíveis - o presidente já disse que tanto Zelenski quando Vladimir Putin tenham que ceder um pouco.
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