Ucrânia tem armas para contraofensiva após nova ajuda do Ocidente

Dúvidas foram levantadas nas últimas semanas sobre a capacidade ucraniana de ser bem-sucedida na operação esperada para as próximas semanas

PUBLICIDADE

Por Lara Jakes

THE NEW YORK TIMES, Kiev - Novos mísseis de longo alcance, drones de ataque, tanques e outros blindados cedidos por aliados ao presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, nos últimos dias atenderão a muitas, mas não todas as necessidades de Kiev. As doações vieram em meio a dúvidas sobre os preparativos ucranianos para sua aguardada contraofensiva desta primavera boreal, com o próprio mandatário afirmando que mais tempo de preparação seria necessário.

PUBLICIDADE

Analistas militares acreditam que pelo menos parte da última leva de armas ocidentais será enviada rapidamente para as linhas de frente em uma tentativa de cortar as rotas de abastecimento russas. Também devem se úteis para atacar os sistemas de artilharia e centro de comando inimigos no sul e leste da Ucrânia.

Outras armas provavelmente serão entregues mais tarde para ajudar Zelenski a planejar operações futuras caso a guerra continue a se arrastar — algo que parece provável neste momento. O robusto pacote anunciado durante o giro de Zelenski por quatro capitais europeias em três dias pode significar que o Ocidente agora crê que a Ucrânia tem condições de retomar parcelas de territórios ocupados pelo inimigo.

O presidente da Ucrania, Volodimir Zelenski, conversa com o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, em visita a Londres  Foto: Carl Court/AFP

“Nós não nos comprometeríamos a enviar esse volume de armas para a Ucrânia neste momento se pensássemos que seu sucesso é improvável”, disse Jacob Funk Kirkegaard, pesquisador do German Marshall Fund, em Bruxelas, e ex-funcionário da inteligência dinamarquesa.

Armamentos

Autoridades ocidentais esperam que, se os ucranianos tiverem ganhos substanciais de território, eles teriam mais influência em qualquer negociação de paz. Na semana passada, Zelenski alertou que a contraofensiva contra a Rússia, prevista para começar nesta primavera boreal ou no início do verão, poderia ser adiada caso Kiev não recebesse mais armas.

Publicidade

Semanas antes, documentos vazados do Pentágono indicavam preocupações americanas com a capacidade ucraniana de se defender, acentuada pela escassez de munições e pela superioridade numérica dos soldados russos, apesar das grandes baixas.

Os russos também se prepararam melhor para esta contraofensiva, com uma linha de defesa que se estende por aproximadamente 800 km. Também tem, contudo, intensas vulnerabilidades, uma das razões pelas quais a geografia da guerra pouco mudou nos últimos meses — relatos de avanços ucranianos em Bakhmut, palco da batalha mais sangrenta da guerra, nas últimas semanas acenderam sinais amarelos.

Os europeus, contudo, responderam às preocupações de Kiev, com o compromisso mais contundente vindo da Alemanha, onde Zelenski esteve no sábado, 13. Pouco antes de o mandatário ucraniano pousar, o chanceler Olaf Scholz e sua coalizão anunciaram o envio de mais 30 tanques Leopard ao país aliado, além de 20 blindados, 16 sistemas de defesa aérea, mais de 200 drones e outras armas e munições.

Os líderes da França, Emmanuel Macron, e da Itália, Giorgia Meloni, fizeram promessas mais vagas de enviar tanques, munições e sistemas de defesa aérea. Os Leopards e blindados adicionais que a Alemanha enviará como parte de seu pacote de 2,7 bilhões de euros (R$ 14,4 bilhões) serão mais úteis no sul da Ucrânia, onde o terreno controlado pela Rússia, disse Kirkegaard, é mais adequado “para guerra de tanques ou manobras”.

O chanceler alemão Olaf Scholz e o presidente ucraniano Volodimir Zelenski visitaram uma base militar em Aachen, oeste da Alemanha, onde militares ucranianos estão sendo treinados Foto: Assessoria de imprensa do presidente da Ucrânia / AFP

Mas Max Bergmann, diretor do programa para Europa, Rússia e Eurásia no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington, observou que não estava claro se todos os tanques alemães recém-prometidos chegariam em breve. Berlim até agora já entregou 18 tanques Leopard para a Ucrânia.

Publicidade

No entanto, disse ele, o compromisso “ajuda a dar à Ucrânia um certo grau de confiança” enquanto seus militares se preparam para uma batalha prolongada.

Até o início de março, apenas 31% dos tanques e 76% dos blindados prometidos pelo Ocidente haviam sido entregues à Ucrânia para a próxima contraofensiva, de acordo com avaliações militares dos EUA também vazadas recentemente. Autoridades, contudo, afirmam que bem mais artefatos foram entregues desde então.

O governo do presidente Joe Biden prometeu enviar 31 tanques Abrams, de fabricação americana, para a Ucrânia. Eles não devem chegar antes do terceiro trimestre, contudo. Os novos sistemas de defesa aérea recém-prometidos podem ajudar a aliviar as preocupações americanas de que a Ucrânia não tem o suficiente para se proteger durante a contraofensiva. Quatro dos 16 sistemas de defesa aérea que a Alemanha disse na semana passada que doaria são considerados entre os mais sofisticados do mercado.

Os mísseis Storm Shadow de longo alcance, que o Reino Unido prometeu na quinta-feira, quebram um precedente que se perpetuava desde o início da guerra. Os países temem que os artefatos sejam usados para atacar diretamente o território russo, algo que poderia gerar uma escalada na guerra. O medo é que isso caracterize co-beligerância.

Publicidade

Há preocupação em particular com o artigo 5 da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que consagra o princípio de defesa coletiva da Otan — que um ataque a um membro é um ataque a todos.

O presidente da Ucrania, Volodimir Zelenski, reforçou a necessidade de uma ajuda militar maior de seus aliados ocidentais  Foto: Marko Djurica / REUTERS

Kirkegaard disse que os drones de longo alcance britânicos são uma ameaça em particular para a Frota do Mar Negro da Marinha Russa no porto de Sevastopol, na Península da Crimeia, e nos seus arredores. Entre os pontos vulneráveis, estão a ponte do Estreito de Kerch que conecta a Crimeia, ocupada desde 2014, à Rússia.

A Crimeia tem sido um ponto organizacional importante para os russos que operam em território capturado no sul da Ucrânia. É também um dos alvos ucranianos, que demanda o retorno do território — além das regiões unilateralmente anexadas de Kherson e Zaporizhia, no sul, e Donetsk e Luhansk, no leste — para se sentar à mesa de negociações. Os russos, contudo, recusam-se a cedê-los.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.