BUENOS AIRES - Os mais de 15 pontos de vantagem obtidos por Alberto Fernández sobre o presidente Mauricio Macri na eleição primária da Argentina são praticamente irreversíveis até a votação geral de outubro, afirmou o cientista político Carlos de Angelis, da Universidade de Buenos Aires.
“Alberto Fernández ganhou a eleição primária argentina contrariando todos os prognósticos das pesquisas publicadas nos últimos meses”, disse De Angelis ao Estado. “A diferença é tão grande que dificilmente Macri poderá revertê-la na votação de 27 de outubro, quando serão realizadas as eleições gerais.”
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Ele afirmou também que, depois da divulgação dos resultados preliminares da votação, praticamente todos os analistas no país apontam que a tarefa do presidente é muito complicada porque a chance de mudar parte dos votos depositados no sucessor de Cristina Kirchner são ínfimas. “Os (eleitores) peronistas não devem trocar de lado.”
Com 98,67% das urnas apuradas, Fernández lidera a votação com 11,6 milhões de votos (47,65%), seguido por Macri, que obteve o apoio de 7,8 milhões de eleitores (32,08%). Roberto Lavagna aparece em terceiro lugar, com 8,22%. A participação superou os 75%.
De Angelis diz que o resultado de Lavagna, que teve mais de 2 milhões de votos - dos 32 milhões de eleitores habilitados - é outro problema para Macri.
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“Pelo menos a metade dos votos de Lavagna deve migrar para Alberto Fernández. Isso, somado à sua própria votação, deve fazer com que ele seja eleito presidente já em primeiro turno”, previu o especialista.
Outra surpresa da votação de domingo foi o desempenho do candidato peronista na disputa pelo governo da Província de Buenos Aires. Axel Kicillof, da Frente de Todos, teve 49,34% dos votos contra a governista María Eugenia Vidal - cotada inicialmente para suceder Macri como candidata à presidência -, que ficou com 32,56%.
“Ainda é uma incógnita qual será a função de Axel Kicillof - que foi ministro da Economia de 2013 a 2015 - em uma eventual presidência peronista. Mas ele ficou muito próximo dos 50% dos votos necessários para ser eleito governador também em 1º turno”, disse De Angelis.
O especialista apontou essas duas votações, além do fato de Macri ter perdido até mesmo em províncias governadas pela sua coalizão, como Mendoza e Jujuy, como os principais fatores que contribuíram para a fragilização do presidente.
A capacidade de Fernández de reorganizar o peronismo, fazer desse processo político uma “mudança de página”, capaz de minimizar as disputas internas e recuperar antigos aliados, como Sergio Massa - que estava na oposição a Cristina desde 2013 -, é o outro ponto que pode explicar o resultado desta prévia eleitoral.
Futuro incerto
O fato de a coalizão Juntos pela Mudança, de Macri, só ter mantido sua base eleitoral forte na cidade de Buenos Aires, em pontos isolados da Província de Santa Fé e na Província de Córdoba - a única em que superou Fernández - é um claro sinal das dificuldades que o presidente argentino enfrentará até a votação de outubro e o final de seu mandato, em 10 de dezembro, diz o cientista político.
“Essa situação resulta em muitas incógnitas, por exemplo, sobre como serão tratadas as questões de interesses externos do país, como vão reagir os mercados internacionais, a cotação do dólar, entre outros fatores”, apontou De Angelis. “No discurso após a votação, Macri pareceu não entender as razões para sua derrota.”
O especialista afirmou também que a votação derrubou a crença governista de que o apoio internacional, acordos de livre comércio e o suporte do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos Estados Unidos seriam suficientes para alavancar o governo na votação popular.
“Hoje, o FMI é parte da derrota de Macri. Essa foi a primeira vez que foi feita qualquer votação em todo o país que possa ser vista como um tipo de plebiscito (para a gestão econômica de Macri), disse De Angelis, ressaltando que as primárias indicam uma falta de apoio ao acordo assinado no ano passado com o Fundo.