BERLIM – As explosões nos gasodutos Nord Stream 1 e 2, localizados no Mar Báltico, resultaram no que pode ser o maior vazamento de gás metano na atmosfera, mas, ainda assim, não deve ter um grande impacto ambiental. Segundo as estimativas preliminares, se todo o metano vazado atingir a atmosfera, vai equivaler a apenas 0,1% das emissões do planeta. A quantidade liberada globalmente é tão alta que as milhares de toneladas expelidas pela Nord Stream não fazem diferença significativa.
O professor de ciências da terra da Universidade de Duke, Drew Shindell, afirma que as fontes de metano espalhadas pelo mundo são tantas que qualquer vazamento tende a ser pequeno. “Não é algo trivial, mas equivale a uma cidade americana de tamanho modesto, digamos assim”, exemplificou.
As estimativas preliminares sobre o impacto dos vazamentos foram feitas pelos cientistas do Projeto de Hidrados de Gás do Serviço Geológico dos EUA na quarta-feira, 28, a partir dos dados divulgados pela Agência Dinamarquesa de Energia. A chefe do projeto, Carolyn Ruppel, disse que do ponto de vista das emissões o vazamento dos gasodutos é “relevante de se observar”.
O pesquisador Thomas Lauvaux, pesquisador do Laboratório de Ciências Climáticas e Ambientais da França, tem outra comparação: segundo seus cálculos, o metano vazado nos gasodutos Nord Stream 1 e 2 equivale ao liberado por um milhão de veículos durante um ano. Apenas na União Europeia, circulam 250 milhões de veículos.
Entretanto, outros cientistas são mais cautelosos e advertem contra subestimar os efeitos do metano. O professor sênior de engenharia química e energia renovável na Universidade Queen Mary, em Londres, Paul Balcombe, afirmou que o gás tem um efeito realmente potente, sendo o responsável pelo efeito estufa. “Mesmo um pequeno vazamento tem um grande impacto climático”, declarou.
O vazamento é monitorado por estações da Suécia, que medem concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa. Desde que os gasodutos se romperam, os pesquisadores suecos relatam picos de metano na atmosfera, com concentração 20 a 25% maior que o normal. “O que é bastante notável em comparação com a nossa série histórica”, disse o pesquisador da Universidade de Lund, Thomas Holst. Entretanto, ressaltou Holst, não é uma quantidade que representa risco à saúde.
Segundo Carolyn Huppel, esses picos, concentrados na Europa, se dissipam pelo planeta por serem bem misturados na atmosfera.
Tensões entre o Ocidente e a Rússia
Impacto na vida marinha
Apesar do tamanho do vazamento, não é provável que o gás cause danos à vida marinha da mesma forma que um vazamento de petróleo causa, segundo a pesquisadora associada do Instituto de Gás Sustentável, Jasmin Cooper. “O impacto ambiental será para o aquecimento global”, enfatizou.
Imagens divulgadas nesta quinta-feira, 29, pela guarda costeira da Suécia mostram uma grande massa de bolhas de metano na superfície do mar, escapando através dos quatro vazamentos nos gasodutos — e não três, como as autoridades disseram inicialmente. Segundo os cientistas, são necessárias mais imagens e acesso ao local para calcular com mais precisão o quanto de metano pode ser liberado na atmosfera.
“Sabemos que está vazando porque vemos as fotos e o vídeo do gás borbulhando na superfície da água, mas não sabemos nada sobre os vazamentos”, disse Cooper. “Não sabemos o tamanho deles ou onde estão no oleoduto, e por isso é difícil descobrir a vazão.”
As previsões das autoridades dinamarquesas é que os gasodutos esvaziem até domingo, 2. Mais da metade do gás já foi liberado. E, uma vez que estejam vazios, cientistas e funcionários poderão ter maior acesso ao local – limitado no momento por questões de segurança. Isso vai permitir que peritos examinem as causas do vazamento.
Otan chama vazamentos de ‘atos de sabotagem’
A Otan classificou os vazamentos nos gasodutos como “atos de sabotagem deliberados, imprudentes e irresponsáveis”. Nesta quinta-feira, um membro da União Europeia disse que as explosões “não foram uma coincidência”.
Os vazamentos começaram após explosões submarinas nos dois gasodutos, registradas por detectores sísmicos suecos. A Rede Nacional Sísmica do país afirma que a segunda explosão equivale à explosão de 100 a 200 quilogramas de dinamite. A primeira explosão foi menor e, consequentemente, mais difícil de medir.
Especialistas em munições dizem que é difícil adivinhar que tipo de bomba pode ter causado o dano. É possível que um torpedo tenha sido usado, mas é mais provável que mergulhadores ou um veículo submarino autônomo tenham colocado uma ou mais cargas de explosivos em cada ponto. Para identificar as munições usadas, são necessárias mais evidências, que incluem dados adicionais de sensores e evidências físicas, como sobras de explosivos.
Há um consenso entre os líderes europeus que o vazamento é resultado de uma sabotagem. A suspeita recai sobre a Rússia, que tem usado o fornecimento de energia para a Europa para retaliar sanções da União Europeia por conta da guerra na Ucrânia.
O Kremlin negou a responsabilidade, anunciou que vai investigar os incidentes como “um ato de terrorismo” e pediu uma investigação internacional coordenada. A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do país, Maria Zakharova, insinuou que os Estados Unidos podem estar por trás das explosões. “Blinken (Anthony Blinken, secretário de Estado dos EUA) não esconde o fato de que o objetivo principal dos EUA era cortar a Europa dos recursos russos e agora diz que não sabe quem poderia se beneficiar disso. Isso te beneficia”, declarou.
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