MIAMI - Um era oficial do Exército venezuelano que havia desertado e se juntado à oposição. O outro, um ativista político que fugiu depois que forças pró-governo atacaram sua casa. Os dois acabaram nos Estados Unidos, entre milhares de compatriotas em busca de asilo naquele que parecia ser o lugar óbvio para fazê-lo. Mas os dois homens foram rejeitados e aprenderam uma lição dura sobre os limites do refúgio nos EUA mesmo para pessoas vindas de um país em colapso, cujo governo foi condenado pela administração do presidente Donald Trump.
Helegner Tijera Moreno, o ex-oficial do Exército, está em uma instalação para detenção de imigrantes no Novo México, esperando uma ordem final de remoção ou uma suspensão de última hora da decisão do juiz que rejeitou seu pedido de asilo. O outro homem, Marcos Guada, foi repatriado à Venezuela em julho, mas fugiu para a República Dominicana. Eles ainda estão surpresos - e um tanto amargurados - que os EUA tenham rejeitado seus pedidos de asilo.
"Eu vim para cá porque pensei que os EUA eram o principal oponente do governo venezuelano e porque achei que nós teríamos uma boa chance de conseguir ajuda", disse Tijera, de 39 anos, pelo telefone, direto do centro de detenção. "Infelizmente, eu estava errado".
O governo da Venezuela tem se tornado cada vez mais autoritário e o país vive um colapso econômico. Pelo critério de país de origem, os venezuelanos hoje compõem o maior grupo de pessoas em busca de asilo nos EUA. Apesar disso, são mais rejeitados a cada dia e obrigados a retornar ao país ou se juntar aos mais de 2 milhões que se tornaram refugiados em outros países.
"Eu estava tentando salvar minha vida", relembra Guada, sobre sua decisão de sair.
Cerca de 28 mil pedidos de asilo venezuelanos, alguns para mais de uma pessoa, foram submetidos em 2017 por pessoas dentro ou fora do território americano. Foi 50% a mais do que no ano anterior e cinco vezes mais do que em 2015. Milhares mais têm feito alegações "defensivas" para evitar a deportação, depois que seus vistos expiram que suas petições iniciais são rejeitadas.
Pedidos de asilo normalmente demoram até quatro anos para ser finalizados, embora a administração Trump tenha acelerado o processo como parte de uma política ampla de aumento da fiscalização sobre a imigração. No ano passado, ao menos 250 venezuelanos foram deportados, 36% a mais em relação ao ano anterior. Neste ano, ao menos 258 foram deportados no primeiro semestre e outros 265 estão detidos como Tijera, aguardando a deportação.
Funcionários da imigração não dizem quantos tiveram seus pedidos de asilo negados, mas advogados e outros especialistas dizem que este é o caso da maioria. A Transactional Records Access Clearinghouse, organização de pesquisa de dados da Universidade de Syracuse, descobriu que quase metade das petições de asilo venezuelanos que chegaram a juízes de imigração nos últimos cinco anos foram negadas. Em comparação, quase 90% dos pedidos vindos do Haiti e do México têm o mesmo destino, 20% dos pedidos da Síria e cerca de 10% dos pedidos da Bielorrúsia.
Para se qualificarem para o asilo, os migrantes devem provar que enfrentam ameaça iminente caso retornem ao país e sofrerão perseguição motivada por raça, religião, nacionalidade, opinião política ou participação em algum grupo social. "A violência geral, o caos e a economia não são suficientes", disse Juan Carlos Gomez, advogado de imigração que administra uma clínica legal na Universidade Internacional da Flórida, em Miami.
"Muitos venezuelanos solicitam asilo político pensando que estão saindo do inferno e alguém vai protegê-los mas, infelizmente, essas não é a lei." Muitos dos requerentes de asilo originários da Venezuela acreditam que terão permissão para reivindicar asilo porque os EUA têm sido críticos firmes do governo do presidente Nicolás Maduro e seu predecessor, Hugo Chávez.
"O governo americano tem duas caras", disse Guada. "Eles dizem uma coisa e fazem outra." Defensores de imigrantes dizem que requerentes de asilo entendem mal o sistema por esse motivo. "É uma contradição na política de imigração dos EUA que nós muitas vezes condenamos as condições em um país estrangeiro e depois deportamos as pessoas para essas condições", disse a diretora de políticas Royce Murray, do Conselho de Imigração Americano.
O departamento de Serviços de Imigração e Cidadania dos EUA não comenta casos individuais, mas diz que está protegendo as leis de asilo quando são violadas. "A verdade é que os pedidos têm aumentado muito na fronteira nos anos recentes, porque os migrantes sabem que podem explorar um sistema falho para entrar nos EUA, evitar remoção e continuar no país", disse o porta-voz da agência, Michael Bars.
Tijera parecia ter uma motivação sólida, já que era tenente do exército, e o apoio dos militares é visto como a chave para Maduro poder continuar no poder. Dois membros das Forças Armadas da Venezuela foram presos neste mês por terem supostamente participado da tentativa de assassinato contra o presidente e Tijera acredita que pode ser preso e torturado caso retorne ao país. Ele fugiu da Venezuela em janeiro de 2015, cruzando a fronteira para a Colômbia.
Então, procurou asilo na Itália, mas foi rejeitado. Em seguida, seguiu para o México e buscou asilo nos EUA, em um posto na fronteira com o Texas. "Se eu voltasse (para a Venezuela), eles me acusariam por qualquer motivo. Eles sabem que sou um traidor do país", disse.
Guada era um empresário na Venezuela, ativo nas campanhas de oposição do Estado de Carabobo, no norte do país. Ele fugiu em 2010, depois que partidários do governo atacaram sua casa com pedras e arrombaram a porta, eventualmente indo para Laredo, no Texas. Lá, ficou detido por quase três meses e foi libertado depois de pagar US$ 13 mil.
Sua mulher tinha residência legal no país, e seus dois filhos têm cidadania americana desde o nascimento, mas mesmo assim ele não conseguiu convencer as autoridades da imigração de que enfrentava perigo iminente em casa. Eventualmente, seus recursos judiciais esgotaram e Guada foi deportado em julho. "Estou frustrado", disse. "Não mereço isso."
Tijera também foi incapaz de convencer o juiz que enfrentaria prisão imediata caso voltasse para casa. Ele pode ser deportado a qualquer momento e teme o pior na Venezuela. De volta à Venezuela, Guada, não tentou correr riscos novamente com um juiz de imigração nos EUA. Depois de três dias no território venezuelano, ele embarcou em um avião e voou para a República Dominicana, onde está morando com o filho. "Fiquei apavorado, porque qualquer um que fale contra o regime pode ser silenciado", disse. / AP
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