HELSINQUE ― Vídeos produzidos por grupos de defesa de direitos dos animais e divulgados nesta quinta-feira, 19, abriram uma nova frente de pressão sobre o milionário mercado de peles da Finlândia, o maior da Europa e segundo maior do mundo no ramo. Imagens mostram as condições em que raposas são mantidas antes do abate e revelaram animais deformados, doentes e até se alimentando com os restos mortais de indivíduos da própria espécie.
As imagens, que foram gravadas em 2022 sem a autorização dos criadores, foram obtidas pela associação finlandesa Oikeutta Eläimille (Justiça para os Animais). Elas mostram seis criadouros de raposas da raça gigante, quatro das quais certificadas por oferecerem “bom tratamento” aos animais.
Trancadas em gaiolas de metal, claramente muito pequenas, as raposas de pelo extremamente grosso aparecem com doenças oculares e infecções de ouvido e cauda. “As condições de vida desses animais nessas fazendas são francamente terríveis”, disse o ativista Kristo Muurimaa em entrevista à France-Presse.
De acordo com Muurimaa, raposas, incapazes de atender às suas necessidades de movimento, são suscetíveis a doenças comportamentais. Os animais também seriam submetidos a cruzamentos excessivos para aumentar seu tamanho, o que leva, por exemplo, à deformação de suas peles.
Nos vídeos, algumas raposas estão tão acima do peso que nem parecem mais raposas. Algumas também são vistas devorando os cadáveres de alguns de seus filhos. Segundo a associação, o problema é generalizado e “todas as fazendas de peles na Finlândia são mais ou menos idênticas no tratamento do animal”.
“A criação de peles já deveria ser proibida na Finlândia. Acho lamentável que ainda não o seja”, disse Mai Kivela, parlamentar da Aliança de Esquerda, que faz parte da coalizão governista.
A Associação Finlandesa de Criadores de Animais de Pele (FIFUR) confirmou à France-Presse que quatro das seis fazendas identificadas pelos ambientalistas possuem certificado de qualidade sanitária. A entidade, contudo, condenou a gravação não autorizada dos vídeos e afirmou que eles não representam a realidade.
A organização diz que mostrou os vídeos para seus criadores, mas eles “não reconhecem seus animais, exceto talvez uma raposa prateada”. “Eles dão uma imagem completamente falsa”, disse Olli-Pekka Nissinen, porta-voz da FIFUR.
As quatro fazendas certificadas “são bem administradas, certificadas e têm criadores que cuidam de seus animais”, disse Nissinen. Ainda assim, visitas veterinárias serão organizadas para investigar as acusações, disse a FIFUR.
O sistema de certificação, destinado a atestar o bom estado de saúde dos animais, inclui visitas de controle anuais. “Em geral, uma fazenda com entre 5 mil e 10 mil animais... pode ter infecções repentinas”, mas as estatísticas mostram que “os ferimentos e a mortalidade são bastante baixos”, argumentou Nissinen.
Com cerca de um milhão de peles produzidas anualmente, a Finlândia é o segundo maior produtor de peles de raposa no mundo, atrás apenas da China. O setor conta com um forte apoio de alas políticas do país, que não se opõe a uma atividade que gera cerca de 360 milhões de euros (R$ 2 bilhões) em exportações por ano e é responsável por 3 mil postos de trabalho, principalmente em regiões rurais.
Em dezembro, uma iniciativa de cidadãos europeus pedindo uma proibição em toda a UE alcançou um milhão de assinaturas, o suficiente para forçar uma resposta da Comissão Europeia. Vários Estados-Membros já proibiram a reprodução, mas o apelo visa estendê-lo aos 27 países por ser considerada uma prática “cruel por natureza”.
Na Finlândia, a primeira-ministra Sanna Marin, sob pressão de seus parceiros da Aliança de Esquerda e dos Verdes, anunciou em 2020 que apoiava a proibição, mas não conseguiu reunir a maioria no Parlamento./AFP
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.