Xi Jinping corteja aliados e parceiros americanos, como o Brasil, em desafio aos EUA

Para analistas, os dois movimentos simultâneos indicam comprometimento de líder da China com a visão de que o relacionamento entre o país e os EUA não traz benefícios

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Por David Pierson

PEQUIM — O presidente da China, Xi Jinping, estendeu o tapete vermelho para o líder brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, a quem chamou de “velho amigo do povo chinês”. Tomou chá no jardim com o presidente da França, Emmanuel Macron, que assistiu a uma apresentação de músicos tocando uma antiga cítara chinesa. Xi também conversou por telefone com o príncipe Mohammed bin Salman, da Arábia Saudita, e ofereceu congratulações pelo Ramadã — o mês sagrado para os muçulmanos.

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Em contraste aos acenos calorosos a líderes mundiais, está a animosidade destinada aos Estados Unidos. A China rejeitou as tentativas do governo do presidente americano, Joe Biden, de retomar relações diplomáticas de alto nível e diminuir a tensão em torno de Taiwan. Também intensificou a campanha crítica e de ridicularização dos Estados Unidos e da democracia nos moldes ocidentais.

O esforço em fortalecer os laços com aliados e parceiros de Washington, ao mesmo tempo em que desacredita publicamente os Estados Unidos, reflete o endurecimento da posição de Pequim e o pior momento das relações entre os dois países — algo classificado pelo líder chinês como um esforço de Washington para “contenção, cerco e supressão” da China.

Para alguns analistas, os dois movimentos simultâneos são fortes indícios de que Xi está totalmente comprometido com a visão de que o relacionamento entre China e Estados Unidos, ao menos por enquanto, não traz benefícios. Esse cenário aumentou a preocupação com a possibilidade de as duas potências estarem em rota de colisão, o que poderia provocar acidentes graves, ou até uma guerra, sobre Taiwan e outras questões geopolíticas.

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O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, se encontra com o presidente da China, Xi Jinping, em 2022  Foto: Saul Loeb/ AFP

Os americanos reagiram aos contatos diplomáticos chineses com aliados próximos durante o encontro do G7 no Japão, quando o grupo — que reúne as economias mais industrializadas do mundo — se comprometeu a fazer frente à intensificação da agressividade chinesa. Apesar disso, Xi vem colhendo, em meses recentes, o tipo de reação que ele e outras autoridades chinesas esperavam, visivelmente tirando uma lasca de algumas das alianças que sustentam a influência americana.

Durante o encontro do líder chinês com Lula, o presidente brasileiro criticou o predomínio do dólar nas relações comerciais e visitou o centro de pesquisas da Huawei — a gigante das telecomunicações chinesa, que enfrenta sanções dos Estados Unidos. O presidente francês enalteceu a autonomia europeia e alertou para o risco de o bloco ser arrastado para uma guerra por Taiwan. O líder da Arábia Saudita elogiou o “papel construtivo” cada vez maior da China no Oriente Médio — uma cutucada não muito sutil nos Estados Unidos e nas relações conflituosas dos americanos na região.

Enquanto isso, a mídia estatal chinesa alertou sobre os “perigos” e o “abuso” da hegemonia americana e criticou os Estados Unidos em relação a direitos humanos, racismo e uso de armas. Aproveitou-se do recente vazamento de documentos secretos do Pentágono para destacar como Washington vem espionando os aliados. E zombou do fato de o governo Biden realizar uma Cúpula pela Democracia no mês passado, descrevendo a democracia americana como “turbulenta”, “confusa” e “em constante declínio”.

O endurecimento de Pequim demonstra a frustação chinesa com uma série de atitudes do governo americano, especialmente em relação a Taiwan, a ilha com governo autônomo que os chineses querem incorporar ao seu território. A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, visitou os Estados Unidos este mês e se reuniu com o presidente da Câmara dos Deputados americana, Kevin McCarthy.

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Na última segunda segunda, Taiwan anunciou a compra de 400 mísseis antinavio dos Estados Unidos para reforçar a defesa contra uma possível invasão chinesa. Também estão em andamento os maiores exercícios militares em décadas dos EUA com as Filipinas.

Esses movimentos dão mais força ao ressentimento, cada vez mais profundo, em torno das restrições impostas a exportações de semicondutores para a China e da intensificação das trocas, na área de segurança, entre americanos e vizinhos chineses como Japão, Coreia do Sul, Austrália e Índia.

Para as autoridades chinesas, as tentativas americanas de renovar os contatos diplomáticos — incluindo uma adiada ligação entre Xi Jinping e Joe Biden — soam falsas diante do que percebem como crescente hostilidade e provocação. De acordo com declarações na mídia estatal chinesa, contatos de alto nível entre os dois países só podem ocorrer depois que os Estados Unidos demonstrarem “sinceridade confiável com ações concretas”.

Presidente chinês, Xi Jinping, e presidente francês, Emmanuel Macron, encontram-se em Xangai, durante aExposição Internacional de Importações da China. Foto: Ludovic Marin/ AFP

“A responsabilidade pelas dificuldades atuais nas relações entre China e Estados Unidos não está com os chineses”, disse o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores chinês, Wang Wenbin, em resposta a uma pergunta sobre a possibilidade de retomada do diálogo com Washington e remarcação da visita do secretário de Estado americano, Anthony Blinken, que foi cancelada em fevereiro, após a descoberta de um suposto balão de espião chinês sobre o o território americano.

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“Os Estados Unidos precisam parar de interferir em questões internas da China, prejudicar interesses chineses e minar a base política das relações entre os dois países ao reforçar a necessidade de estabelecer pré-condições para o relacionamento”, acrescentou Wang.

O governo Biden diz que precisa das pré-condições para prevenir incidentes decorrentes de desentendimentos em áreas muito controversas como o Mar do Sul da China e o Estreito de Taiwan, onde os chineses fizeram exercícios com munição real em resposta à ida da presidente taiwanesa aos Estados Unidos. Sem protocolos e linhas diretas de comunicação, o risco de incidentes vai continuar alto enquanto os dois países patrulham a região regularmente e, frequentemente, à curta distância.

Pequim considera as pré-condições como outra forma de controle, já que exporiam aos Estados Unidos até onde pode pressionar sem detonar uma resposta militar chinesa. A China prefere que suas linhas vermelhas permaneçam ambíguas, deixando Washington em dúvida.

O governo chinês suspendeu a maior parte do diálogo militar com os americanos em agosto passado, quando a então presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, visitou Taiwan. O Pentágono informou, na semana passada, que Pequim recusou pedidos de contato com o secretário de Defesa americano, Lloyd Austin, e o chefe do Estado-Maior Conjunto, Mark Milley.

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Analistas chineses dizem que as perspectivas de melhora nas relações entre os dois países são remotas. Para Wu Xinbo, reitor para estudos internacionais da Universidade Fudan, de Xangai, os progressos modestos obtidos pelos dois presidentes após o encontro, na Indonésia, em novembro, se perderam depois do incidente com o balão espião e a visita da presidente de Taiwan.

“Na visão da China, apesar de Biden ter demonstrado uma atitude positiva em Bali, ele não deseja fortemente melhorar as relações entre China e Estados Unidos”, diz Wu. “A China pensa que os Estados Unidos não têm nem sinceridade nem habilidade de melhorar as relações.”

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