THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Paddington é o urso mais ocupado de Hollywood.
Enquanto os fãs aguardam mais um ano pela terceira parte de sua franquia cinematográfica, Paddington encontrou tempo para papéis ao lado de Anthony Hopkins, Tom Hanks e Robert De Niro; comemorou um gol com Ted Lasso, vestiu um traje espacial para Interestelar e apareceu no palco com David Byrne; devorou asas de frango apimentadas em Hot Ones, abriu um livro infantil com LeVar Burton em Reading Rainbow e participou recentemente de festas de Ação de Graças com personagens de Peanuts, Família Soprano e Os Simpsons.
O urso tem uma agenda desafiadora, possibilitada pelo trabalho árduo e pela criatividade de Jason Chou, autodeclarado entusiasta de Paddington, que passou quase três anos usando a magia do Photoshop para teletransportar o urso fã de marmelada, ávido por aventuras e de olhar penetrante para cenas de filmes e programas de televisão populares. “Neste momento, acho que algumas pessoas aguardam todo dia por isso, e é difícil decepcioná-las”, disse Chou, de 27 anos, estudante da Gnomon, escola de efeitos visuais em Los Angeles.
Ele cria uma publicação relacionada a Paddington diariamente desde março de 2021 e está prestes a atingir um marco: sua milésima postagem, que, a menos que haja algum contratempo à maneira de Paddington, será publicada no domingo. (As postagens costumam aparecer depois da meia-noite na Costa Leste.) Chou publica seu trabalho no X, antes conhecido como Twitter, no qual tem mais de 340 mil seguidores sob o nome de usuário @jaythechou e no qual se comprometeu a “usar o photoshop para colocar Paddington em um filme, jogo ou programa de TV até que eu esqueça”.
Esse marco é, no mínimo, uma das façanhas de resistência mais incomuns da internet. (Ele ainda não se esqueceu de postar). Em entrevista por telefone, Chou descreveu seu processo criativo: “Basicamente, tento encaixar o personagem em uma cena.”
Poucas pessoas têm essa persistência, mas Geoffrey Palmer, outro artista da internet, é uma delas. Inspirado pelo trabalho de Chou, Palmer passa alguns minutos, todas as manhãs dos dias úteis, incluindo Paddington em várias cenas de Magic: The Gathering, jogo de cartas de fantasia.
Chou deu origem a uma espécie de “descendência” de seu trabalho. “Qualquer um que ama Paddington provavelmente é uma pessoa boa”, comentou ele.
Palmer, de 38 anos, que produz comerciais de televisão para uma empresa de colchões, definiu Paddington como “puramente bom”, o que ajuda a explicar por que tudo isso funciona.
Personagem querido de livros infantis, de animações de televisão e agora de uma franquia cinematográfica – Paddington no Peru, o terceiro filme da série, será lançado nos Estados Unidos em janeiro de 2025 –, o urso é conhecido por sua curiosidade singular, que muitas vezes o coloca em apuros.
“Ele atravessa todas essas cenas diferentes com o mesmo deslumbramento. Por isso, parece natural que esteja de repente em ‘O Poderoso Chefão’ ou no multiverso de Magic: The Gathering. Acho que é a atmosfera de fantasia que faz com que as pessoas gostem tanto”, afirmou Palmer, que mora em Prior Lake, Minnesota.
Chou sempre buscou permanecer fiel aos princípios do personagem. “Mesmo em algumas das cenas de ação, me pego dizendo: ‘Ah, Paddington! Não faça isso!’ Tenho medo de, um dia desses, transformá-lo por acidente em um vilão ou algo assim.”
O caminho tortuoso de Chou até Paddington remonta ao seu amor de infância pela trilogia original de “Star Wars”. Sua mãe alimentou essa obsessão ao lhe dar um combo dos filmes, que incluía um DVD dedicado aos efeitos especiais. “Eu via aquilo o dia inteiro”, contou Chou.
Em pouco tempo, estava fazendo as próprias animações com argila, e continuou perseguindo seus interesses artísticos no ensino médio e na Universidade da Califórnia, em Irvine, onde estudou produção de cinema e vídeo. Foi ali que a semente da obra-prima de Paddington foi plantada.
Ele se lembrou de uma tarde de inverno de 2018 em que ficou preso num congestionamento em uma rodovia no sul da Califórnia, ansioso com a universidade, a busca de emprego e o trânsito – que estava terrível. “Pensei: Quer saber? Vou assistir a um filme.” Saiu da estrada e encontrou um cinema, que estava exibindo “As Aventuras de Paddington 2″. A moça da bilheteria disse que ele ia adorar, mas Chou não tinha ideia de que o filme o afetaria tão profundamente.
A consistência do personagem o comoveu. Ao longo do filme, ele permanece bondoso e propenso a acidentes, mesmo quando os que estão ao seu redor mudam – e mudam para melhor, muitas vezes por causa da interação com o urso. Imagine as amizades improváveis que ele faz em uma prisão cheia de criminosos durões. (Spoiler: Paddington vai para a cadeia.) “Mas ele continua na dele. E, não importa quantos obstáculos existam em seu caminho, a educação e a gentileza o ajudam a superar tudo. Eu me senti muito feliz no fim.”
Alguns anos depois, com tempo livre durante a pandemia, Chou visitava regularmente o Reddit. Os desafios nas redes sociais estavam na moda e ele percebeu que “precisava fazer alguma coisa”. Assim, usou o Photoshop para inserir um Paddington gigante em uma cena de “Godzilla x Kong: O Novo Império” e postou em uma comunidade da rede relacionada a filmes, prometendo fazer algo semelhante todo dia. “Era um conteúdo leve e divertido, para animar as pessoas, e foi crescendo.”
Segundo Jarick Simbol, de 28 anos, um dos seguidores ávidos de Chou, a comunidade rapidamente se transformou em um fórum para “nerds do cinema se divertirem com um urso infiltrado em seus filmes favoritos”. Ele usava a plataforma Letterboxd para catalogar os filmes e programas de televisão que Chou usava e que estavam em expansão constante. Esse portfólio ganhou uma audiência ainda maior quando, seis meses depois do início do experimento, ele transferiu as publicações para o Twitter. Simbol acompanhou as postagens durante 665 dias seguidos, antes que a vida tomasse outro rumo. “Arranjei um emprego novo, acabei tendo de trabalhar muitas horas e não consegui mais acompanhar o ritmo. Eu só anotava as coisas, mas ele está realmente fazendo o trabalho. Acho isso genuinamente impressionante”, disse ele, que mora em Long Beach, na Califórnia, onde trabalha na indústria de videogames e esportes eletrônicos.
Desde o início, Chou priorizou a consistência. “Faço uma montagem por dia e não me importo se não receber muitas visualizações, porque isso pode afetar a maneira como faço as coisas”, comentou ele, que espera trabalhar na indústria cinematográfica.
E, embora tenha experimentado o Patreon, serviço de monetização para artistas, abandonou-o logo, porque não entrou no negócio do Photoshop de Paddington pelo dinheiro ou pela fama. Mas ficou desapontado porque o urso não o seguiu no X: “Deve haver um motivo.” Nem Paddington nem seus representantes na StudioCanal, produtora francesa que supervisiona a franquia, responderam aos pedidos de comentário.
Nesta fase da série, Chou vem enfrentando desafios. Por exemplo: a princípio, ele queria evitar usar o mesmo programa de televisão ou filme mais de uma vez, mas essa possibilidade é cada vez menor. “Eu mesmo me encurralei.”
Por isso, ele abriu exceções e expandiu sua obra para incluir videogames e, ocasionalmente, capas de álbuns. Por exemplo, houve uma homenagem recente a Taylor Swift: 1989 (Versão de Paddington).” “Acho que não existe um objetivo final, mas eu me sentiria mal se parasse”, observou Chou.
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