PUBLICIDADE

Artistas criam quebra-cabeças de madeira inspirados em formas naturais

Montagem fica mais complicada (ou mais fácil?) com um jogo que pode ter diversas formas, permitindo que a brincadeira nunca acabe

PUBLICIDADE

Por Siobhan Roberts

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em uma caça aos cogumelos no Lago North-South, nas Montanhas Catskill, no estado de Nova York, Jessica Rosenkrantz avistou um de seus preferidos: o poliporo hexagonal. Ela tem predileção pelas formas de vida diferentes da humana (e da dos mamíferos em geral), embora dois de seus seres humanos favoritos tenham se juntado na caminhada: seu marido, Jesse Louis-Rosenberg, e sua filha, Xyla, que ditaram o ritmo. Rosenkrantz adora fungos, líquenes e corais porque, segundo ela, “são muito estranhos, em comparação conosco”. Visto de cima, o poliporo hexagonal se parece com qualquer cogumelo marrom achatado (embora às vezes tenha um brilho alaranjado), mas, ao virá-lo, vê-se uma matriz perfeita de polígonos de seis lados cobrindo a parte inferior da tampa.

Rosenkrantz e Louis-Rosenberg são artistas algorítmicos que fazem, entre outras coisas, quebra-cabeças de madeira cortados a laser em seu estúdio de design, o Nervous System, em Palenville, no estado de Nova York. Inspirados na maneira como as formas surgem na natureza, eles desenvolveram um software personalizado para “produzir” peças de quebra-cabeça, cujas versões mais conhecidas têm nomes como dendrito, ameba, labirinto e onda.

Jessica Rosenkrantz e Jesse Louis-Rosenberg, com a filha Xyla. O casal dirige o estúdio de design Nervous System Studio. Foto: Tony Cenicola/The New York Times

PUBLICIDADE

Além do reino natural e do algorítmico, o casal extrai sua criatividade de muitas outras áreas: ciência, matemática, arte e zonas difusas entre elas. Chris Yates, artista que faz quebra-cabeças de madeira cortados à mão (e um dos colaboradores), descreveu a criação de quebra-cabeças da dupla assim: “Eles não vão só além do padrão - partem do zero e começam de novo.”

No dia da caminhada, o mais novo quebra-cabeça de Rosenkrantz e Louis-Rosenberg saiu do cortador a laser. Essa criação combinou o ofício centenário de marmorização de papel com uma invenção do Nervous System: o quebra-cabeça infinito. Sem uma forma fixa e sem um limite definido, o quebra-cabeça infinito pode ser montado e remontado de várias maneiras, aparentemente ad infinitum.

O Nervous System estreou esse projeto conceitual com o “Infinite Galaxy Puzzle”, apresentando uma foto da Via Láctea em ambos os lados. “Você só consegue ver metade da imagem de uma vez. E, sempre que monta o quebra-cabeça, teoricamente vê uma parte diferente dela”, explicou Louis-Rosenberg, acrescentando que, matematicamente, o design é inspirado na topologia “incompreensível” da garrafa de Klein: uma “superfície fechada não orientável”, sem dentro, fora, topo ou base. “É tudo contínuo.” O quebra-cabeça continua e continua, de alto a baixo, de um lado para o outro. Com um truque: nele, qualquer peça do lado direito se conecta ao lado esquerdo, mas somente depois que a peça é virada.

Um cogumelo Spitgill encontrado em uma caminhada em sua propriedade. A Sra. Rosenkrantz adora fungos, líquens e corais porque “eles são muito estranhos, comparados a nós”, disse ela. Foto: Tony Cenicola/The New York Times

Rosenkrantz lembrou que a estreia do quebra-cabeça infinito gerou alguma especulação filosófica nas redes sociais: “Um quebra-cabeça que nunca acaba? O que isso significa? É mesmo um quebra-cabeça se não acabar?” Também houve perguntas sobre as motivações de seus criadores. “Que pessoas más, loucas e maníacas elaborariam um quebra-cabeça tão covarde que você nunca pode terminar?”

Um processo ‘complicado’

Rosenkrantz e Louis-Rosenberg frequentaram o Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Ela se formou em dois cursos: biologia e arquitetura. Ele desistiu depois de três anos de matemática. Os dois chamam seu processo criativo de “complicado” - são cativados pela semente de uma ideia e em seguida perseguem uma conclusão.

Publicidade

Quase uma década atrás, começaram a pesquisar a marmorização de papel: gotas de tinta - deformadas, esticadas na água e depois transferidas para o papel - capturam padrões semelhantes aos encontrados na rocha transformada em mármore. “É uma forma de arte que também é um experimento científico”, definiu Rosenkrantz.

Um quebra-cabeça infinito. Foto: Tony Cenicola/The New York Times

Em 2021, a dupla do Nervous System iniciou uma colaboração com Amanda Ghassaei, artista e engenheira que construiu um simulador interativo de marmorização de papel baseado em física, movido a dinâmica de fluidos e matemática. Ghassaei criou fluxos turbulentos de cores psicodélicas nas peças onduladas do quebra-cabeça. Rosenkrantz e Louis-Rosenberg elaboraram o corte de onda especificamente para o Marbling Infinity Puzzle, que vem em diferentes tamanhos e cores.

“Existem muito mais coisas para explorar quando você não está limitado pela realidade física de trabalhar com uma bandeja de água”, disse Ghassaei. Experimentando com padrões clássicos de marmorização, como o buquê e a asa de pássaro, o simulador permitiu mais resultados de forma livre: ela poderia combinar o estilo japonês de soprar tinta ao redor, usando a respiração ou um ventilador, com o estilo europeu de empurrar tinta em diferentes direções usando pentes. Havia uma linha tênue, no entanto, entre o refinamento psicodélico e “deixar a cor se esticar e deformar demais. Foi aí que o botão de desfazer foi muito útil”, comentou Ghassaei.

Cultivando algoritmos

A metodologia do Nervous System é de tentativa e erro. Rosenkrantz e Louis-Rosenberg começaram em 2007 fazendo joias, seguidas por esculturas impressas em 3D e um Vestido Cinemático que está na coleção do Museu de Arte Moderna de Nova York. A revista Science apresentou sua pesquisa de órgãos impressos em 3D, feita com Jordan Miller, bioengenheiro da Universidade Rice, no Texas. Também fazem software para a New Balance - usado para produzir palmilhas orientadas por dados e outros aspectos do design do tênis. O mesmo código foi reaproveitado, em colaboração com o estilista Asher Levine, para fazer um traje inspirado nas asas da libélula para a cantora Grimes.

A Puzzle Cell Lamp acesa. Foto: Tony Cenicola/The New York Times

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

O percurso de um projeto para outro é marcado por conceitos matemáticos, como o crescimento laplaciano, os diagramas de Voronoi e o padrão de Turing. Esses conceitos, que, simplificando, regem a maneira como as formas emergem e evoluem na natureza, orientam os algoritmos, escreveu Rosenkrantz.

Um projeto que se concretizou este ano, a Puzzle Cell Lamp, foi desenvolvido com base em pesquisas sobre como cortar superfícies curvas para que as peças do quebra-cabeça possam ser achatadas de forma eficiente, facilitando a fabricação e o transporte. “Quando você tenta construir um objeto curvo a partir de material plano, existe sempre uma tensão fundamental: quanto mais cortes você faz, mais fácil é achatar, mas mais difícil é montar”, afirmou Keenan Crane, geômetra e professor de ciência da computação na Universidade Carnegie Mellon, em Pittsburgh, na Pensilvânia. Crane e Nicholas Sharp, pesquisador sênior da Nvidia, empresa de tecnologia 3D, criaram um algoritmo que tenta encontrar uma solução ideal para esse problema.

Usando esse algoritmo, Rosenkrantz e Louis-Rosenberg delinearam 18 peças planas do quebra-cabeça que são embaladas no que parece ser uma grande caixa de pizza. “Ao encaixar as formas sinuosas, você criará um abajur esférico”, explica o blog do Nervous System.

Publicidade

Do ponto de vista de Crane, o trabalho do Nervous System adota uma filosofia semelhante à de grandes artistas como da Vinci e Dalí: a apreciação do pensamento científico como “algo que deve ser integrado à arte, em vez de uma categoria oposta de pensamento”. Rosenkrantz e Louis-Rosenberg dedicaram sua carreira a encontrar conexões profundas entre o mundo da criatividade, o da matemática e o da ciência. “É uma coisa que as pessoas imaginam que acontece mais do que realmente acontece. Na verdade, é preciso que alguém esteja disposto a fazer o trabalho árduo de tradução entre os mundos”, ressaltou Crane.

A escultura “Yellow Moon Gyroid” do Nervous System é feita do mesmo tipo de painéis que a Puzzle Cell Lamp, mas com 93 peças em vez de 18. Foto: Tony Cenicola/The New York Times

Recriando a Terra

O Puzzle Cell Lamp leva o nome das células interligadas encontradas em muitas folhas, mas não é um quebra-cabeça adequado, porque vem com instruções. É possível, porém, ignorar as instruções e elaborar organicamente uma estratégia de montagem. Na opinião de Louis-Rosenberg, é isso que faz um bom quebra-cabeça: “Você quer que o quebra-cabeça seja uma experiência de criação de estratégia - reconhecer certos padrões e transformar isso em uma metodologia para resolvê-lo. Os redemoinhos psicodélicos dos quebra-cabeças marmorizados infinitos podem parecer assustadores, mas existem zonas de cor que mostram o caminho de uma peça para a outra.”

O quebra-cabeça infinito mais desafiador do Nervous System é um mapa da Terra. Tem a topologia de uma esfera, mas é uma esfera desdobrada em plano por uma projeção de mapa icosaédrico, preservando a área geográfica (em contraste com algumas projeções de mapas que apresentam distorções) e dando a cada centímetro do planeta um valor igual. “Recebi algumas reclamações de usuários perplexos com a dificuldade”, contou Rosenkrantz, acrescentando que as peças do quebra-cabeça têm um comportamento mais complexo; em vez de se encaixarem com uma virada de lado, giram 60 graus e “fecham as costuras do mapa”. Rosenkrantz considera o fator infinito particularmente significativo nesse contexto: “Você pode criar um mapa próprio da Terra, centrando-o no que lhe interessa - tornando todos os oceanos contínuos, ou fazendo da África do Sul o centro, ou o que quer que seja que você queira ver em uma posição privilegiada.” Em outras palavras, ela aconselhou no blog, “comece em qualquer lugar e veja aonde sua jornada o leva”.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.