'Napa Valley do Canadá' busca um público difícil: canadenses apreciadores de vinho

Os vinhos da Columbia Britânica dificilmente conseguirão conquistar os esnobes consumidores de vinho ao redor do mundo. Mas restrições legais, e preferências regionais, são os obstáculos internos

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Por Dan Bilefsky

OSOYOOS, COLUMBIA BRITÂNICA – A primeira surpresa para Séverine Pinte, produtora francesa de vinhos no Canadá, foi o fato de que todo mundo tinha uma maneira casual de se comportar - mais jeans rasgados e mais chinelos de dedo do que Chanel. Depois, foi a inesperada necessidade de advertir os colhedores de uva que não fumassem maconha perto dos suas adoradas videiras.

E, finalmente, uma ameaça peluda: o urso pardo canadense, apreciador da uva chardonnay, que engolia fileiras de cachos, obrigando os vinicultores a empregar caçadores, cercas eletrificadas ou bombas de pimenta. Quando emigrou para a Okanagan Valley na Columbia Britânica, há dez anos, Pinte sofreu certo choque cultural, na transição da formalidade da centenária indústria vinícola de Bordeaux para o estilo mais descontraído do Canadá.

Convidadas provam vinhos no Little Engine Wines em Penticton, Canadá. Foto: Jen Osborne/The New York Times

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“Mas eu jamais voltarei para a França”, disse Séverine, a principal vinicultora da Le Vieux Pin na antiga e maravilhosa região dos vinhos da Columbia Britânica. “O solo aqui é como uma paleta com a qual posso fazer obras de arte”. A gastronomia canadense é talvez mais conhecida pelas poutine, batatas fritas com queijo muito gordurosas, do que pelo pinot noir.

Mas uma nova geração de vinicultores está colocando no mapa global dos vinhos o Vale Okanagan, juntamente com regiões famosas como Bordeaux, Tuscany e Napa Valley. No entanto, vinicultores como Pinte afirmam que enfrentam um obstáculo mais assustador do que os ursos devoradores de uvas.

Muitos canadenses das outras províncias não podem legalmente pôr as mãos no seu vinho. Cerca de 90% dos vinhos da Columbia Britânica são vendidos na província, uma estatística determinada pelo ardente consumo de vinhos local, por restrições legais e pelas rivalidades regionais no Canadá.

As bebidas alcoólicas foram em grande parte proibidas no Canadá durante a Primeira Guerra Mundial, e algumas províncias ainda não permitem que consumidores individuais encomendem remessas de vinho produzido em outras províncias. O que é particularmente irritante quando as pessoas estão curtindo a tristeza da pandemia com gigantescas taças de chardonnay.

“É mais fácil enviar vinho para a China”, comentou Pinte. Alguns anos atrás, uma vinicultora da Columbia Britânica recebeu uma arma de fogo enviada pelo correio de outra província, uma façanha destinada a demonstrar que ela podia adquirir uma arma de Saskatchewan com maior facilidade do que encomendar uma caixa de syrah.

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Embora esta guerra para a venda ao público do país como um todo seja há muito um motivo de frustração para vinicultores da Columbia Britânica, tornou-se ainda mais exasperante à medida que a qualidade do vinho da província foi melhorando consideravelmente.

Nos anos 1980, o Okanagan Valley, que se estende por cerca de 200 quilômetros ao norte da fronteira com o estado de Washington, era conhecido pelos seus pomares de pêssegos e maçãs, por proporcionar férias baratas à beira do lago e por um vinho menosprezado pelos enófilos como algo intragável.

Mas a abolição gradativa do controle dos preços imposto pelo governo trouxe uma enxurrada de vinhos estrangeiros mais baratos, obrigando os vinicultores locais a arriscar e plantar vinhas de melhor qualidade. Trinta anos mais tarde, a região atrai bilionários canadenses, que se associaram a vinicultores veteranos como Anthony von Mandl, proprietário da Mission Hill Winery, bem como investidores chineses e empreendedores da área de tecnologia americanos ansiosos por criar um Napa Valley (região vinícola da Califórnia) do norte. O Okanagan também gerou a primeira vinícola de propriedade indígena do Canadá.

A Daydreamer Winery, em Naramata, Canadá. Foto: Jen Osborne/The New York Times

Hoje, a região produz pinot noirs finos e cabernet francs que estão se tornando famosos entre os especialistas esnobes em matéria de vinhos de Nova York a Xangai. Cabernet sauvignon de Okanagan de US$ 40 são vendidas a cerca de US$ 1 mil na China. Mas os consumidores de Quebec e Ontario – dois dos maiores mercados de vinhos do Canadá – preferem os importados europeus, enquanto alguns conhecedores continuam incrédulos com a capacidade do país de produzir vinhos sensacionais.

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Por outro lado, é difícil criar uma marca de vinho nacional em um país dividido em termos regionais, onde os restaurantes chiques de Montreal preferem vinho francês vintage e os varejistas de Ottawa defendem o que é produzido em Ontario. Em 2012, o governo federal aprovou um projeto de lei que permitia às vinícolas enviar o seu produto a consumidores individuais em todo o país.

Mas as províncias regulam as vendas no varejo, e oito anos mais tarde, somente três- Columbia Britânica, Nova Scotia e Manitoba – permitem isto. Além do que, o mercado de vinhos em muitas províncias é dominado pelos poderosos monopólios de venda de bebidas alcoólicas que vendem em armazéns do governo, em geral favoráveis aos importados europeus.

Para contornar as restrições, algumas vinícolas de Okanagan recorreram ao subterfúgio, despachando vinhos para outras províncias por meio de uma empresa de transporte de medicinais em caixas que não têm o rótulo de vinho. Um sujeito de New Brunswick foi multado em US$ 292,50 por tentar trazer 14 caixas de cerveja e uísque através da fronteira de Quebec, acima do limite legal.

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A Suprema Corte do Canadá efetivamente manteve a multa, determinando, dois anos atrás, que os canadenses não têm o direito legal constitucional de transportar álcool através de fronteiras provinciais. John Skinner, proprietário da Painted Rock Estate Winery de Okanagan, cujos vinhos conquistaram um público de consumidores na China e nos Estados Unidos, disse que encontrou muita dificuldade para enviar o seu vinho a parentes em Ontario.

“É uma besteira!”, ele disse. “O vinho é um grande embaixador de um país, mas o Canadá não se comporta como uma só nação”. Algumas vinícolas de Okanagan enfatizaram sua linhagem francesa. Caroline Schaller, vinicultora executiva da venerável Osoyoos Larose Estate Winery de Okanagan, afirma que seu tinto ‘Le Grand Vin’ fez sucesso em Quebec e Ontário, com a ajuda da chancela de qualidade do seu nome francês.

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Qualquer que seja o desafio, a produção de vinhos na Columbia Britânica já chegou à idade adulta desde o tempo em que a província era conhecida por gostar de vinho gelado doce produzido com uvas congeladas. François Le Mouël, de Montreal, que se define um “fanático do vinho da CB”, tem 700 garrafas em sua adega.

Ele disse que a região precisa de um “Julgamento de Paris”. Ele se referia a um evento vinícola de 1976, quando os impetuosos vinhos da Califórnia bateram os franceses em um teste cego julgado por enófilos franceses de grande nome, que ficaram chocados com o fato. Esta disputa colocou Napa Valley no mapa global.

A reputação do vinho de Okanagan, acrescentou, precisa de uma promoção deste tipo. “Quando você está comemorando com sua esposa ou namorada”, afirmou, “e pede um vinho da Columbia Britânica, não soa super sexy”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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