THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Colegas de trabalho presos em uma chamada do Zoom, deliberando sobre uma nova estratégia para um projeto crucial. Colegas de apartamento na mesa da cozinha, discutindo sobre como dividir as contas de forma justa. Vizinhos em uma reunião de bairro, debatendo sobre como pagar reparos nas ruas.
Todos nós já fizemos isso - em um grupo, tentando o nosso melhor para colocar todos na mesma página. É sem dúvida uma das tarefas mais importantes e comuns nas sociedades humanas. Mas chegar a um acordo pode ser excruciante.
“Muito de nossas vidas parece estar nesse tipo de efeito Rashomon; as pessoas veem as coisas de maneiras diferentes e têm relatos diferentes sobre o que está acontecendo”, disse Beau Sievers, neurocientista social do Dartmouth College.
Alguns anos atrás, Sievers desenvolveu um estudo para melhorar a compreensão de como exatamente um grupo de pessoas chega a um consenso e como seus cérebros individuais se modificam após essas discussões. Os resultados, publicados recentemente online, mas ainda não revisados por pares, mostraram que uma conversa robusta que resulta em consenso sincroniza os cérebros dos falantes - não apenas quando se pensa no tópico que foi explicitamente discutido, mas também em situações relacionadas que não foram abordadas.
O estudo também revelou pelo menos um fator que torna mais difícil chegar a um acordo: um membro do grupo cujas opiniões ferrenhas se sobrepõem às dos outros.
“A conversa é nossa maior ferramenta para alinhar mentes”, disse Thalia Wheatley, neurocientista social do Dartmouth College que aconselha Sievers. “Não pensamos no vácuo, mas com outras pessoas.”
Sievers projetou o experimento usando filmes como base porque queria criar uma situação realista na qual os participantes pudessem mostrar mudanças rápidas e significativas em suas opiniões. Mas ele disse que era surpreendentemente difícil encontrar filmes com cenas que pudessem ser vistas de maneiras diferentes. “Diretores de filmes são muito bons em restringir os tipos de interpretações que você pode ter”, ele disse.
Raciocinando que os grandes sucessos normalmente não ofereciam muita ambiguidade, Sievers se concentrou em filmes que os críticos adoravam, mas que não trouxeram grandes audiências, incluindo O Mestre, Sexy Beast e Reencarnação, um drama de 2004 no qual um garoto misterioso aparece na festa de noivado de uma mulher.
Nenhum dos voluntários do estudo tinha visto nenhum dos filmes antes. Enquanto estavam deitados em um scanner cerebral, eles assistiram a cenas de vários filmes sem som, incluindo uma de Reencarnação em que o menino desmaia em um corredor após uma conversa tensa com a mulher elegantemente vestida e seu noivo.
Depois de assistir aos trechos, os voluntários responderam a perguntas da pesquisa sobre o que achavam que havia acontecido em cada cena. Em seguida, em grupos de três a seis pessoas, sentaram-se ao redor de uma mesa e discutiram suas interpretações, com o objetivo de chegar a uma explicação consensual.
Todos os participantes eram estudantes do mesmo programa de mestrado em administração de empresas, e muitos deles se conheciam em graus variados, o que gerou conversas animadas refletindo a dinâmica social do mundo real, disseram os pesquisadores.
Após as conversas, os alunos voltaram aos scanners cerebrais e assistiram aos trechos novamente, bem como novas cenas com alguns dos mesmos personagens. A cena adicional de Reencarnação, por exemplo, mostrava a mulher colocando o menino na cama e chorando.
O estudo descobriu que a atividade cerebral dos membros do grupo - em regiões relacionadas à visão, som, atenção, linguagem e memória, entre outras - ficou mais alinhada após a conversa. Curiosamente, seus cérebros estavam sincronizados enquanto assistiam às cenas que haviam discutido, bem como às novas.
Grupos de voluntários apresentaram diferentes interpretações do mesmo trecho do filme. Alguns grupos, por exemplo, achavam que a mulher era a mãe do menino e o havia abandonado, enquanto outros achavam que não tinham parentesco. Apesar de ter assistido aos mesmos trechos, os padrões cerebrais de um grupo para outro eram significativamente diferentes, mas dentro de cada grupo, a atividade era muito mais sincronizada.
Os resultados foram submetidos para publicação em uma revista científica e estão em análise.
O experimento também destacou uma dinâmica familiar para qualquer pessoa que já tenha se sentido triturada em uma reunião de trabalho: o comportamento de um indivíduo pode influenciar drasticamente uma decisão do grupo. Alguns dos voluntários tentaram persuadir seus colegas de grupo de uma interpretação cinematográfica com agressividade, sendo autoritários e discutindo com seus colegas. Mas outros - particularmente aqueles que eram atores centrais nas redes sociais da vida real dos alunos - atuaram como mediadores, ouvindo os outros e tentando encontrar um terreno comum.
Os grupos com os falastrões foram menos alinhados neuralmente do que aqueles com mediadores, segundo o estudo. E talvez o mais surpreendente foi o fato de que os mediadores geraram consenso sem forçar suas próprias interpretações, mas encorajando outros a falar e depois ajustar suas próprias crenças - e padrões cerebrais - para combinar com o grupo.
“Estar disposto a mudar de ideia, então, parece a chave para colocar todos na mesma página”, disse Wheatley.
Como os voluntários tentavam ansiosamente colaborar, os pesquisadores disseram que os resultados do estudo eram mais relevantes para situações, como locais de trabalho ou salas de júri, nas quais as pessoas estão trabalhando em direção a um objetivo comum.
Mas e quanto a cenários mais controversos, nos quais as pessoas têm interesse em uma determinada posição? Os resultados do estudo podem não valer para uma pessoa negociando um aumento ou políticos discutindo sobre a integridade de nossas eleições. E para algumas situações, como um brainstorming criativo, o pensamento de grupo pode não ser o resultado ideal.
“O tópico da conversa neste estudo foi provavelmente bastante ‘seguro’, pois nenhuma crença pessoal ou socialmente relevante estava em jogo”, disse Suzanne Dikker, neurocientista cognitiva e linguista da Universidade de Nova York, que não esteve envolvida no estudo.
Estudos futuros podem se concentrar na atividade cerebral durante as conversas de construção de consenso, ela disse. Isso exigiria uma técnica relativamente nova, conhecida como hyperscanning, que pode medir simultaneamente o cérebro de várias pessoas. O trabalho de Dikker nessa área mostrou que traços de personalidade e dinâmicas de conversação, como revezamento, podem afetar a sincronia cérebro a cérebro.
Wheatley concordou. A neurocientista disse que está frustrada há muito tempo com o foco de seu campo no cérebro isolado.
“Nossos cérebros evoluíram para serem sociais; precisamos de interação e conversas frequentes para manter a sanidade”, ela disse. “E, no entanto, a neurociência continua mapeando o cérebro isolado como se isso fosse alcançar uma compreensão profunda da mente humana. Isso tem que mudar e vai mudar.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES
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