Com linguagem de sinais e som, uma artista confunde a percepção do público

A arte poética e política de Christine Sun Kim leva espectadores a considerar os limites e mal-entendidos que vêm com a comunicação em qualquer idioma, seja falado ou sinalizado

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Por Andrew Russeth
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - No ano passado, um pequeno avião voou sobre Manchester, na Inglaterra, arrastando uma faixa com uma frase curiosa: “O Som do Sorriso”.

No Museu do Queens, na cidade de Nova York, “Time Owes Me Rest Again” (O tempo me deve descanso de novo) estava escrito em uma parede, cada uma das palavras em letras garrafais acompanhada por linhas curvas atravessando o enorme mural.

'Finalmente estou no ponto em que posso fazer o que quiser, e vou fazer isso', disse Kim. Foto: Mark Abramson/The New York Times

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E, no início deste ano, visitantes do Museu de Arte Mildred Lane Kemper, em St. Louis, depararam uma obra de arte, que ocupava todo o átrio, listando a origem de traumas pessoais, inclusive a “Síndrome da Mesa de Jantar”. “Finalmente, estou no ponto em que posso fazer o que quiser, e estou aproveitando”, disse a artista responsável por tudo isso, Christine Sun Kim, em língua de sinais americana, de sua antiga casa em Berlim. Kim, que nasceu surda, contou que, na infância e, mais tarde, como aspirante a artista, sabia que estava perdendo oportunidades oferecidas aos que ouviam.

Essa é uma experiência comum, de acordo com Gerard Buckley, presidente do Instituto Técnico Nacional para Surdos e reitor do Instituto de Tecnologia de Rochester, no estado de Nova York, onde Kim cursou sua graduação. “As crianças surdas no mundo inteiro muitas vezes recebem mensagens negativas sobre suas aspirações de carreira”, escreveu em um e-mail.

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Com o trabalho de Kim agora procurado por colecionadores e museus em âmbito mundial, Buckley afirmou que ela se tornou um modelo para crianças surdas - e a artista comentou que agora está “tentando recuperar todos esses anos”.

Ao longo da última década, trabalhando com desenhos irônicos (gráficos, texto e notação musical), vídeo, áudio, performance e faixas em aviões, Kim, de 42 anos, faz um trabalho poético e político, carismático e sincero, que acaba com as convenções da linguagem e do som.

Em 2015, no MoMA PS1, no bairro de Queens, em Nova York, ela montou uma instalação que pedia aos visitantes que segurassem um alto-falante e andassem enquanto tentavam manter uma antena em contato com um fio sobre a cabeça. Se o fizessem corretamente, uma voz saía do alto-falante, lendo um texto. Era uma tarefa difícil, personificação física de como pode ser tênue - e rígida - a comunicação.

À medida que sua reputação crescia e seu trabalho se destacava em locais cada vez mais importantes, ela se tornou uma das raras artistas plásticas com uma plataforma pública que transcende o mundo da arte, muitas vezes insular.

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No Super Bowl de 2020, no que ela definiu como um ato de protesto e patriotismo, Kim cantou o hino nacional na língua de sinais americana (ASL, na sigla em inglês). Mas a rede de televisão Fox, que estava transmitindo o evento, mostrou-a por apenas alguns segundos, decisão que ela condenou em um artigo de opinião para o The New York Times.

Cinco anos antes, participara de um TED Talk extremamente popular sobre ASL, sua arte e sua experiência no mundo auditivo. Inicialmente hesitante sobre o convite para o TED - “Eu me senti um pouco envergonhada ao ver como aquele era um mundo corporativo” -, sua palestra, agora vista mais de dois milhões de vezes, mudou sua vida, chamando a atenção mundial para seu trabalho.

Kim vive em Berlim há quase uma década, mas nasceu no sul da Califórnia, de pais que haviam emigrado da Coreia do Sul. Um de seus desenhos é um gráfico de torta intitulado “Why My Hearing Parents Sign” (Por que meus pais, que ouvem, usam a linguagem de sinais), em que duas das fatias maiores dizem: “Para ter certeza de que me sinto amada” e “Minha irmã também é surda”; mas a maior dela era: “Eles são mais legais que seus pais.”

No ensino médio, Kim não pôde frequentar as aulas de escultura porque não havia um intérprete, e, mesmo no Instituto de Tecnologia de Rochester (que tem uma grande população surda, e que a nomeou graduada ilustre este ano), não conseguiu se matricular em alguns cursos pelo mesmo motivo.

Depois da faculdade, partiu para a cidade de Nova York, e trabalhou como assistente na Escola Lexington para Surdos e como educadora no Museu Whitney enquanto tentava elaborar seus planos futuros. “Por padrão, os Surdos são sempre professores. Temos de ensinar ASL a quem ouve, ensinar a cultura dos surdos, o que quer que seja. Por isso, acho que, por dentro, eu também tinha desistido de ser artista”, afirmou ela, lembrando-se daquela época. (Como muitos de seus pares, Kim escreve a palavra Surdo com letra maiúscula para mostrar uma cultura compartilhada.)

Kim fez mestrado em belas-artes pela Escola de Artes Visuais em 2006, mas ainda não se sentia convencida quando fez uma viagem transformadora à capital alemã para uma residência.

Muitas exposições na cidade envolviam arte sonora, e isso a fez pensar: “Levei algum tempo para admitir que queria trabalhar com som - talvez alguns anos, na verdade - porque tinha medo. Achava que trabalhar com som era algo muito opressivo, e enraizado ou dominante em nossa sociedade.”

Mas acabou se matriculando no programa de som do Bard College, que incentiva abordagens experimentais desse meio, e garantiu seu segundo mestrado em belas-artes em 2013, antes de se estabelecer em Berlim. Em uma viagem anterior para lá, conheceu um artista, Thomas Mader, de 38 anos, agora seu marido e colaborador ocasional. Ele aprendeu a ASL e ajudou a ensiná-la à sua filha, Roux, que acabou de fazer cinco anos.

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Grande parte da arte de Kim estimula os espectadores a reconsiderar a maneira como ouvem e percebem, fazendo com que pensem nos limites, nos riscos e nos mal-entendidos que vêm com a comunicação em qualquer língua.

No Museu do Queens, as linhas em seu enorme mural sugerem ação de histórias em quadrinhos, mas de fato conduzem os movimentos que são necessários para sinalizar seu título desafiador, “Time Owes Me Rest Again” (O tempo me deve descanso de novo). “A obra destaca a ASL como uma língua - e no geral não está centrada de forma monumental nos espaços”, disse Sally Tallant, diretora do museu.

Kim cantou o hino nacional e “America the Beautiful” em linguagem de sinais americana no Super Bowl em 2020. Foto: A J Mast/The New York Times

Aquela enigmática faixa no avião (“O Som do Sorriso”) era do projeto “Captioning the City” (Legendando a Cidade) de Kim, cujos textos, espalhados por Manchester, aludiam a como o closed-captioning pode elucidar ou obscurecer significados, dependendo de como transmite material não verbal, como a música.

Ultimamente, seus trabalhos têm apresentado ecos. “Na minha vida muito Surda, tudo se repete ou ecoa. Beth está basicamente repetindo o que estou dizendo, e as legendas são uma repetição ou um eco.” (Ela estava se referindo a Beth Staehle, sua intérprete de ASL na entrevista em vídeo para este artigo.) Na visão da surdez que o mundo auditivo tem, ou na própria comunidade de Surdos, explicou Kim, há sempre o perigo de uma única visão, um eco, ser repetido impensadamente.

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Echo Trap é o título de um mural que explora esse perigo, que foi apresentado em uma exposição em 2020-21 sobre arte e deficiência no Museu für Moderne Kunst, ou MMK, em Frankfurt, na Alemanha. Uma linha preta balançava pelas paredes, com as palavras “HAND PALM” acima, usando os gestos para “eco” em ASL. Parecia estar engolindo a sala.

Seu trabalho igualmente amplo visto em St. Louis, Stacking Traumas (Empilhando traumas), tocou em tópicos preocupantes como se sentir presa à mesa de jantar com pessoas que não usam ASL. (A “Síndrome da Mesa de Jantar”.)

“Kim faz parte de toda uma geração de artistas majoritariamente jovens e americanas que são políticas e ativistas, e que fazem um grande trabalho - o ativismo faz parte dele”, declarou Susanne Pfeffer, diretora do MMK.

Na mesma exposição no MMK, Kim exibiu trabalhos de Deaf Rage, série de gráficos de aparência casual que registram sua exasperação com a indústria da arte e o mundo em geral. Um exemplo do que gera essa exasperação: “Curadores que acham justo dividir meu pagamento com os intérpretes.”

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Como parte de seu ativismo, Kim é cofundadora de uma iniciativa com o designer Ravi Vasavan que promove o uso de um símbolo para o Poder Surdo: <0/

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