THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - As coisas que Lisa Degliantoni aprendeu aos 22 anos com as duas melhores amigas que fez em seu trabalho na indústria editorial em Nova York incluíam, mas não se limitavam a:
- Como receber feedback de um chefe sem comprometer suas ideias.
- Como se divertir na festa de fim de ano do escritório sem ficar muito bêbada.
- Quando tirar um verão de folga e ensinar rafting para obter perspectiva.
- Como encontrar o cara perfeito para se casar.
Degliantoni, agora com 50 anos, sente que deve partes de sua carreira, de sua família e de seu próprio senso de identidade no local de trabalho a essas duas primeiras amigas de trabalho, Ginny Cahill, 61, e Molly Miller, 56.
Há uma ansiedade para fazer aquela primeira amizade importante no trabalho. É a emoção de ficar até muito tarde bebendo para continuar rindo. É o prazer de correr para a mesa de alguém e arrastá-la para o banheiro para fofocar. É a ternura de aparecer para trabalhar em uma manhã difícil e perceber que um colega de trabalho saberá instantaneamente que algo está errado.
Essas amizades de início de carreira se tornaram uma espécie em extinção. Para alguns jovens, incluindo aqueles que trabalham em setores como tecnologia e direito que ainda não retornaram totalmente ao escritório, a vida profissional agora significa fazer videochamadas na cama. Eles ainda não conheceram seus colegas de trabalho pessoalmente - muito menos formaram os relacionamentos que parecem mais importantes no início de uma carreira. Degliatoni, por exemplo, sentia que suas primeiras amigas de trabalho ficavam em algum lugar entre colegas e fadas madrinhas.
“Você é uma pessoa diferente a cada minuto quando está na casa dos 20 anos, mas essas amigas realmente estavam cristalizando a pessoa que eu queria me tornar”, disse Degliantoni.
Os empregadores estão tentando ao máximo compensar o tempo perdido presencialmente, com a ocupação de escritórios em todo o país ainda abaixo de 50%. Cerca de 3 milhões de funções profissionais ficaram permanentemente remotas no final de 2021. Assim, os gerentes planejaram sessões virtuais de trivialidades, coquetéis virtuais, dentro e fora do local de trabalho. Este ano, a Salesforce abriu o Trailblazer Ranch, onde os funcionários podem se reunir para caminhadas na natureza, ioga, aulas de culinária e meditação. A Zillow, que diz estar “sediada na nuvem”, está reformando alguns de seus espaços de escritório para parecerem mais com salas de estar, para que os funcionários se sintam à vontade para passar um tempo juntos lá.
Mas, para muitos, há uma solidão irrefutável em toda essa conversa pelas telas. Marin Callaway, 26, começou sua carreira em 2018 em um escritório de defensoria pública, onde os interesses do trabalho pareciam aumentar os interesses nas amizades de trabalho. Ela viu colegas chorarem quando um cliente perdia um caso. Ela também compartilhou sua dor com colegas de equipe quando perdeu um parente, sabendo que eles diriam todas as coisas certas.
Agora, Callaway está concluindo um estágio jurídico em um escritório de Los Angeles que muitas vezes parece vazio. Às vezes, o andar está tão vazio que as luzes do sensor de movimento se apagam.
“Estou indo na verdade porque minha casa não tem ar condicionado”, disse Callaway. “Pessoas mais jovens do que eu que não tiveram essa experiência de trabalho em tempo integral em um escritório não sabem realmente o que estão perdendo.”
O que você sente falta quando o Zoom é o bebedouro
Executivos que dedicam sua energia para reforçar as amizades - através de eventos fora dos locais de trabalho, por exemplo - geralmente falam sobre como as amizades no local de trabalho beneficiam a produtividade. Pessoas com um melhor amigo no trabalho são mais engajadas em seus trabalhos. Suas organizações têm menos acidentes, clientes mais felizes e lucros maiores. Em outras palavras, as amizades no local de trabalho são boas para os negócios.
Quando o escritório desapareceu para tantos em março de 2020, algumas oportunidades de fazer amigos foram embora junto. A parcela de funcionários híbridos que têm um melhor amigo no trabalho caiu de 22% em 2019 para 18% este ano, segundo a Gallup.
Os negócios continuaram a funcionar de qualquer maneira. As empresas permaneceram produtivas mesmo com seus funcionários escondidos em casa e formando laços enraizados inteiramente em emojis oportunos.
Muitos tentaram formas extremas de ligação de longa distância. Andrew Pauly, 32, que trabalha na Planetary Society, participou de uma festa virtual de “2001: Uma Odisseia no Espaço” com seus colegas de equipe, na qual todos abriram cervejas e trocaram interpretações do filme, tentando replicar as alegrias de sentar pelo escritório fazendo trechos de “I Think You Should Leave”. Não era exatamente a mesma coisa.
“Parece real. Tem gosto de real”, disse Pauly. “Mas nossos cérebros sabem que não é a coisa real.”
Amizades como espelhos
Mollie West Duffy e Liz Fosslien, autoras de Big Feelings: How to Be Okay When Things Are Not Okay, criaram uma tipologia de amigos no local de trabalho. Há o confidente, a quem pode ser confiado qualquer segredo; há o amigo que inspira, também conhecido como paixão platônica no trabalho; há o amigo da onça, que pode despertar sentimentos competitivos, mas também impulsionar seu sucesso. (A própria relação das autoras, nascida de um amigo em comum, se aprofundou quando perceberam o quanto gostavam de escrever e ilustrar juntas.)
Do outro lado de todo esse crescimento e mudança, a ausência de amigos no local de trabalho pode resultar em algo mais simples: solidão.
Marisa G. Franco, 31, psicóloga e autora do livro Platonic: How the Science of Attachment Can Help You Make - and Keep - Friends, começou seu primeiro emprego em uma universidade, há cerca de cinco anos, decidida a não se focar em fazer amizade com seus colegas. Ela era a única professora assistente negra da faculdade e não queria se abrir para seus colegas brancos e arriscar julgamentos.
“Senti o peso de ser muito diferente e fiquei preocupada em me expor demais e poder sofrer racismo e microagressões”, lembrou Franco.
Ela não se preocupava em ficar desconectada, porque passava os dias cercada de pessoas. Mas, aleatoriamente, uma tarde, ela decidiu se medir na Escala de Solidão da UCLA, que mede sentimentos de isolamento. Ela percebeu que, embora tivesse colegas ao seu redor, ela se sentia muito sozinha, porque eles não sabiam nada sobre ela fora do trabalho.
Então, quando Franco começou um novo trabalho em 2019 com o governo federal, ela decidiu começar a revelar mais sobre si mesma para as pessoas ao seu redor. Ela falou sobre planos de verão e férias. Ela contou a eles sobre microagressões que experimentou no local de trabalho, como ser confundida com um colega negro.
Para Franco, fazer amizades no trabalho a ajudou a remodelar a forma como ela se via. “Amigos espelham nossa identidade de volta para nós”, ela disse.
“Digamos que você acabou de ser promovido e está assumindo um novo papel, e se sente meio inseguro com isso, mas todos os seus colegas estão olhando para você como líder”, ela continuou. “Isso pode ajudá-lo a se sentir menos como um impostor.”
Conectando-se através do trabalho
Em conversas com dezenas de pessoas sobre trabalho remoto, muitos descreveram uma sensação de perda quando esse processo criativo foi confinado a seus laptops. Fica difícil replicar online toda essa proximidade. Veja Abigail Jacob, 21, estudante da Universidade de Michigan, que está estagiando em um escritório bastante vazio em Manhattan e às vezes faz videochamadas com colegas que estão trabalhando em casa.
“Eu venho todos os dias, sento com roupas profissionais na frente do computador e continuo até sair”, disse Jacob. “Eu me pergunto como seria um escritório mais cheio e animado.”
Degliantoni se pergunta como seria uma versão mais jovem de si mesma se não tivesse aparecido em um escritório para seu primeiro dia de trabalho em 1995. Naquela manhã, ela estava sentada em seu cubículo quando ouviu duas mulheres conversando sobre basquete.
“Eu as interrompi e falei, ‘Do que estão falando? Que jogo de basquete?”, ela lembrou. “Elas poderiam ter pensado, ‘Quem é essa estagiária chata falando com a gente?’”
Uma dessas mulheres era Cahill (uma diretora de arte que já trabalhou para o The New York Times), e a outra era Miller. Mais de 25 anos depois, elas continuam sendo suas melhores amigas. Degliantoni às vezes pensa: Graças a Deus eu coloquei a cabeça pra fora daquele cubículo. Se não tivesse feito isso, ela poderia ter parado de trabalhar nesse ramo completamente, como pretendia fazer aos 26 anos, antes de Cahill intervir. Ela poderia não ter se candidatado a certas promoções ou falado em reuniões. Além disso, tudo isso não teria sido tão divertido.
“É muito importante que as pessoas vejam exemplos de como seu futuro pode ou não pode ser”, disse Degliantoni. “Essa é uma das melhores coisas sobre a cultura do escritório. Você pode aprender quem você quer ser.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES
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