Será que a moda de luxo um dia vai recuperar seu brilho?

A indústria tenta atrair clientes em meio a uma severa recessão global. As tradicionais semanas da moda podem parecer insensíveis ao momento

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Por Elizabeth Paton

Normalmente, esse é um mês movimentado para a indústria do consumo de luxo. Pouco depois de as revistas de moda publicarem suas importantíssimas edições de setembro, milhares de compradores de lojas, jornalistas e clientes embarcam em um giro por Nova York, Londres, Milão e Paris.

Viajando de uma cidade à outra para participar dos desfiles de moda, essas pessoas decidem quais serão aos tendências que impulsionarão um mercado de bens de luxo que movimenta centenas de bilhões: em 2019, foram 281 bilhões de euros, ou US$ 334 bilhões. Mas não esse ano.

O estilista Jason Wu, à esquerda, ensaiando seu desfile na New York Fashion Week em Manhattan. Foto: Jeenah Moon/The New York Times

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O chão sob os pés da indústria está cedendo sob o peso de uma pandemia que provocou uma queda acentuada nas vendas, abalou as cadeias de fornecimento globais e levou nomes consolidados no mercado como Brooks Brothers e Lord & Taylor à falência. Essas mudanças suscitaram perguntas importantes a respeito do modelo de negócios da moda de luxo. Será que as semanas da moda deveriam ser desmanteladas e reconstruídas?

Apresentar novos ciclos de produtos a cada seis meses ainda é a melhor abordagem em um momento em que a superprodução de roupas é investigada, os estilos de vida enfrentam restrições e os espetáculos na passarela podem parecer indiferentes a um mundo que tem outras prioridades?

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O segundo trimestre de 2020 foi o pior para a indústria da moda de luxo. De acordo com estimativas do Boston Consulting Group, as vendas globais de bens de luxo devem ter contração de 25% a 45% este ano, e o crescimento dessa indústria não deve voltar aos patamares anteriores à pandemia antes de 2023 ou 2024, no mínimo.

Em um momento em que muitas empresas lutam para sobreviver, muitos designers têm a sensação de que não se pode perder uma oportunidade de mostrar novos produtos. Assim, com o início da mais nova temporada da moda em Nova York na semana passada, os desfiles disputados nas passarelas e os grandes públicos foram substituídos por um punhado de apresentações de menor escala ou apenas online.

Na Itália e na França, algumas marcas disseram planejar a organização de eventos presenciais maiores, apesar de terem apenas um punhado de convidados internacionais, um número de ausências dos maiores nomes e um ritmo de contágio crescente na Europa. “Os desfiles não são essenciais. Mas, às vezes, é preciso mostrar que realmente estamos criando novidades", disse Antoine Arnault, diretor de comunicação do LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton, em entrevista ao New York Times no dia 9 de setembro.

“Há toda uma economia envolvendo esses desfiles. Não podemos subestimar esse lado", acrescentou ele, fazendo alusão aos milhares de maquiadores, motoristas, costureiras, seguranças e fotógrafos que dependem das semanas da moda para garantir uma parte substancial da sua renda. Grupos grandes como o LVMH, dono de marcas como Dior, Louis Vuitton e Fendi, e o conglomerado rival Kering, dono de marcas como Gucci, Saint Laurent e Balenciaga, puderam se isolar melhor das amargas consequências da pandemia do que a maioria dos negócios menores e independentes.

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Dito isso, a LVMH iniciou uma batalha jurídica na tentativa de se desvencilhar de um compromisso de US$ 16 bilhões prevendo a compra da joalheria Tiffany & Co. Em seu mais recente informe de rendimentos, o LVMH disse ter observado uma alta expressiva nas vendas em meados do ano em países asiáticos como China, Japão e Coreia do Sul, onde o ritmo recente de contágio pelo vírus tem permanecido baixo.

Mas as vendas de artigos de couro e peças da moda tiveram queda de 37% com a paralisação do turismo internacional e a demora na retomada do movimento nas lojas globais. O impacto foi ainda pior para marcas que tentavam reverter a má sorte, como Salvatore Ferragamo e Burberry, para endividadas lojas de departamentos como a Neiman Marcus, e para as marcas independentes que dispõem de pouco caixa e estão muito expostas a esses tipos de varejistas, muitos dos quais se esforçaram para cancelar e devolver pedidos.

A maioria das empresas enfrenta agora um estoque lotado de inventário não vendido das coleções de primavera e verão deste ano. A China, que já era o mercado de luxo de crescimento mais rápido antes da pandemia, vai se tornar ainda mais vital para o sucesso das marcas enquanto os mercados americano e europeu seguem imprevisíveis.

E, por toda a parte, o varejo físico teve que migrar para a internet — rapidamente — conforme os consumidores logo se voltaram para as compras digitais. Com a indústria apresentando novos looks, o TikTok vai organizar seu próprio mês da moda para um público potencial de aproximadamente 800 milhões de usuários, com desfiles de Saint Laurent e JW Anderson. Devemos ver coleções menores, com mais peças atemporais que podem durar mais tempo nas prateleiras se necessário.

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A demanda por vestidos e ternos de gala caiu muito, pois não há mais razão para se arrumar, ainda que muitas marcas afirmem esperar que as pessoas comecem a comprar peças caras que não sejam calças de moletom, apesar da grave recessão e das demissões em andamento. Na ausência de um cronograma para a vacina contra a covid-19, será difícil prever o que os consumidores vão querer daqui seis meses. Mas, para a moda de luxo, o espetáculo não pode parar. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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