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Médicos testam próteses de acrílico para examinar cabeça de pacientes usando apenas ultrassom

Neurocirurgiões estão usando a peça em pessoas que precisaram cortar parte do crânio para aliviar pressão intracraniana, retirada de tumor ou cirurgia de hidrocefalia

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Por Gina Kolata

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - A vida de Tucker Marr mudou para sempre em outubro.

Ele estava a caminho de uma festa de casamento quando caiu de um lance íngreme de uma escada de metal, batendo o lado direito da cabeça com tanta força que entrou em coma.

Tucker Marr, 27 anos, tornou-se parte de um novo desenvolvimento na neurocirurgia, recebendo uma prótese de crânio embutida com uma janela de acrílico que permitiria aos médicos examinar seu cérebro por meio de ultrassom. Foto: Lenox Hill Hospital/The New York Times

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Ele fraturou o crânio e um grande coágulo sanguíneo se formou no lado esquerdo da cabeça. Os cirurgiões tiveram que remover um grande pedaço do crânio para aliviar a pressão no cérebro e remover o coágulo.

“Ter um pedaço do meu crânio removido foi uma loucura para mim”, disse Marr. “Quase senti como se tivesse perdido um pedaço de mim.”

Mas o que lhe pareceu ainda mais maluco foi a forma com a qual aquele pedaço foi restaurado.

Marr, um analista de 27 anos da Deloitte, tornou-se parte de um novo desenvolvimento na neurocirurgia. Em vez de ficar sem um pedaço de crânio ou recolocar o osso antigo - procedimento caro e com alto índice de infecção - ele conseguiu uma prótese de crânio feita em impressora 3D. Mas essa não é a prótese típica utilizada nesses casos. Sua prótese, que é coberta por sua pele, possui uma janela de acrílico que permite que os médicos examinem seu cérebro por meio de ultrassom.

Alguns centros médicos estão oferecendo essas janelas de acrílico para pacientes que tiveram que remover um pedaço do crânio para tratar doenças como lesão cerebral, tumor, sangramento cerebral ou hidrocefalia.

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“É muito legal”, disse o Dr. Michael Lev, diretor de radiologia de emergência do Massachusetts General Hospital. Mas “ainda está começando”, acrescentou.

A pesquisa mostrou que alguns pacientes que receberam próteses acrílicas não enfrentaram maior risco de infecção. Foto: Lenox Hill Hospital/The New York Times

Os defensores da técnica dizem que se um paciente com essa janela tiver dor de cabeça, convulsão ou precisar de um exame para ver se um tumor está crescendo, o médico pode colocar uma sonda de ultrassom na cabeça do paciente e examinar o cérebro no consultório. Dessa forma, um paciente pode evitar tomografias computadorizadas ou ressonâncias magnéticas caras, demoradas e onerosas. Em vez de esperar que um radiologista analise o exame, o paciente e o médico podem saber imediatamente como está o cérebro do paciente.

O Dr. Mark Luciano, professor de neurocirurgia na Johns Hopkins, está usando ultrassom para monitorar pacientes com hidrocefalia, que têm shunts no cérebro para drenar o excesso de líquido cefalorraquidiano. Os pacientes precisam de tomografias computadorizadas regulares para verificar se o líquido está sendo drenado adequadamente.

Na tentativa de avaliar as janelas, Luciano publicou recentemente um estudo com 37 pacientes que tiveram as janelas colocadas no crânio, em comparação com um grupo maior de pacientes semelhantes do ano anterior ao desenvolvimento do método.

Durante o período de um ano, ele não viu risco de infecção. O desafio agora, disse ele, é melhorar as imagens dos exames de ultrassom e quantificar o que elas mostram, disse ele, bem como monitorar a segurança por vários anos.

Mas nem todos estão convencidos.

Ao permitir exames de ultrassom, as janelas do crânio podem reduzir o número de tomografias computadorizadas e ressonâncias magnéticas necessárias para pacientes com cérebros danificados. Foto: Lenox Hill Hospital/The New York Times

‘Ideia intrigante’

O Dr. Ian McCutcheon, professor de neurocirurgia do MD Anderson Cancer Center da Universidade do Texas, disse que a janela “é uma ideia intrigante”. Mas, disse ele, antes de usá-la para avaliar pacientes com tumores cerebrais, ele precisaria de evidências de um ensaio clínico rigoroso de que o ultrassom é tão preciso quanto uma ressonância magnética na detecção de alterações, como um tumor em crescimento.

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Esse julgamento, disse ele, “ainda não foi concluído”.

Outros, incluindo o Dr. Joseph Watson, diretor do programa de tumor cerebral da Universidade de Georgetown, chamaram a técnica de “frívola”.

“Você está passando por uma pequena porta”, disse ele. “Isso não fornece uma imagem suficiente de todo o cérebro” que ele obtém com uma tomografia computadorizada ou ressonância magnética.

Mas o médico de Marr, Netanel Ben-Shalom, professor assistente de neurocirurgia no Lenox Hill Hospital, em Nova York, discorda. Em sua experiência, disse ele, “desde que a janela esteja localizada acima do tumor, a cavidade fica claramente aparente”.

Ben-Shalom foi convencido desde o momento em que tentou implantar uma janela, há alguns anos. Ele era residente na Johns Hopkins e seu paciente tinha um tumor cerebral.

Tucker Marr à esquerda antes de uma prótese de crânio ser instalada e depois à direita. “Quase senti como se tivesse perdido um pedaço de mim”, disse ele. Foto: Lenox Hill Hospital/The New York Times

“Foi incrível”, disse Ben-Shalom. Ele podia ver todo o cérebro, disse ele, e todas as suas estruturas.

Ele se mudou para Lenox Hill em janeiro de 2022, tornou-se consultor da Longeviti, empresa que fabrica as janelas, e desde então vem implantando e utilizando suas janelas transparentes de polimetilmetacrilato.

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Numa tarde deste ano, Marr sentou-se numa cadeira de madeira num pequeno consultório em Lenox Hill, sorrindo enquanto Ben-Shalom deslizava uma sonda de ultrassom pela janela no seu crânio. Um grupo de estudantes de medicina observava.

Para Marr, a vida ficou difícil após a remoção do pedaço de crânio para tratar o inchaço do cérebro. Sua cabeça ficou distorcida, com uma grande parte deteriorada. Ele ficou com fadiga e tontura porque seu cérebro estava inadequadamente protegido da pressão atmosférica.

Durante o exame, o cérebro de Marr parecia perfeito, disse Ben-Shalom. A linha média que separa os dois hemisférios - e que foi empurrada para um lado após a lesão de Marr - estava exatamente onde deveria estar. As estruturas do seu cérebro pareciam normais, disse Ben-Shalom. O ultrassom até mostrou a pulsação de seu cérebro.

Marr é jovem e saudável, mas, disse Ben-Shalom, qualquer pessoa que tenha feito uma cirurgia no cérebro precisa de observação. Se Marr chegar um dia com náuseas e vômitos ou uma forte dor de cabeça, ou se tiver uma convulsão, seus médicos precisarão examinar seu cérebro. A janela de acrílico facilita tudo, disse Ben-Shalom. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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