Um milhão de anos de dados confirmam: monções provavelmente vão ficar piores

Tempestades anuais de verão no sul da Ásia começaram em junho; novo estudo sugere que elas serão mais destrutivas

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Por John Schwartz

O aquecimento global provavelmente tornará a temporada de monções da Índia mais úmida e mais perigosa, sugere uma nova pesquisa.

Os cientistas sabem há anos que as mudanças climáticas estão prejudicando a temporada de monções. Pesquisas anteriores baseadas em modelos computacionais sugeriram que o aquecimento global causado pelos gases de efeito estufa e o aumento de umidade na atmosfera aquecida resultarão em temporadas de monção de verão mais chuvosas e situações imprevisíveis de precipitação extrema.

Homens empurram caminhão por rua inundada no Paquistão durante dia de fortes chuvas em temporada de monções. Foto: Akhtar Soomro / Reuters

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O novo estudo, publicado em junho na revista científica Science Advances, traz mais provas para a teoria ao fazer uma análise retrospectiva dos últimos milhões de anos para se ter uma ideia das monções que estão por vir.

A temporada de monções, que geralmente ocorre entre junho e setembro, traz enormes quantidades de chuva para o sul da Ásia, que são cruciais para a economia agrária da região. Essas chuvas afetam as vidas de um quinto da população mundial, nutrindo ou destruindo plantações, causando inundações devastadoras, tirando vidas e espalhando poluição. As mudanças provocadas pelas mudanças climáticas poderiam remodelar a região e a história, sugere a nova pesquisa, e é um guia para essas mudanças.

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Os pesquisadores não tinham uma máquina do tempo, então usaram a segunda melhor coisa para essa tarefa: lama. Eles coletaram amostras do núcleo da Baía de Bengala, no norte do Oceano Índico, para onde o escoamento das temporadas de monções se esvai do subcontinente.

As amostras do núcleo tinham 200 metros de comprimento e ofereceram um rico registro das chuvas de monções. As temporadas mais úmidas depositam mais água doce na baía, reduzindo a salinidade na superfície. O plâncton que vive na superfície morre e afunda no sedimento abaixo, camada após camada. Trabalhando com as amostras do núcleo, os cientistas analisaram as conchas fósseis do plâncton, medindo os isótopos de oxigênio para determinar a salinidade da água em que viviam. Os tempos de alta precipitação e baixa salinidade vieram depois de períodos de maiores concentrações de dióxido de carbono na atmosfera, níveis mais baixos do volume global de gelo e aumentos subsequentes nos ventos úmidos regionais.

Agora que a atividade humana está aumentando os níveis de gases de efeito estufa na atmosfera, segundo a pesquisa, podemos esperar ver os mesmos padrões de monções surgir.

Steve Clemens, professor de ciências da Terra, ambientais e planetárias na Universidade Brown e principal autor do estudo, disse que “nós podemos verificar ao longo dos últimos milhões de anos que os aumentos de dióxido de carbono na atmosfera têm sido seguidos por aumentos substanciais de chuvas no sistema de monções do sul da Ásia”. As previsões de modelo climáticos são “maravilhosamente consistentes com o que vemos nos últimos milhões de anos”, disse ele.

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Anders Levermann, professor de dinâmica do sistema climático no Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático, na Alemanha, que não participou do estudo, mas produziu pesquisa a respeito das projeções de modelos climáticos de monções, disse que estava contente em ver pesquisas que apoiavam suas descobertas voltadas para o futuro com modelos climáticos. “É um tremendo conjunto de informações”, ele disse, “e é muito bom ver dados reais que refletem mais de um milhão de anos a história de nosso planeta, ver que as leis físicas que experimentamos todos os dias deixaram suas pegadas neste extremamente rico registro paleontológico.

Levermann acrescentou que as consequências para as pessoas do subcontinente indiano são terríveis; as monções já provocam a precipitação de uma quantidade enorme de chuva e “conseguem sempre ser destrutivas”, disse ele, mas o risco de temporadas “catastroficamente fortes” está crescendo, e a natureza cada vez mais irregular delas tem seus próprios riscos. “E isso está atingindo a maior democracia do planeta; em muitos aspectos, a democracia mais desafiada do planeta”, disse ele.

Clemens e outros pesquisadores coletaram suas amostras durante uma viagem de pesquisa de dois meses em um navio de perfuração de petróleo que funciona como navio de pesquisa, o JOIDES Resolution. Ele transportou uma tripulação de 100 pessoas, entre elas, 30 cientistas, em uma viagem que começou em novembro de 2014.  “Não estávamos em casa durante o Natal”, lembrou ele, e embora “seja difícil ficar longe da família por tanto tempo”, a recompensa finalmente chegou. “Estivemos todos esses anos”, disse ele, “criando esses conjuntos de dados. É uma satisfação saber que isso finalmente foi divulgado.” / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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