No mês passado, quando o módulo de pouso robótico Odysseus se tornou a primeira espaçonave construída nos Estados Unidos a pousar na Lua em mais de 50 anos, ele tombou de lado. Isso limitou os experimentos científicos que o módulo poderia fazer na superfície lunar, porque suas antenas e painéis solares não estavam apontados na direção certa.
Apenas um mês antes, outra espaçonave, o Módulo de Pouso para Pesquisa Lunar, ou SLIM na sigla em inglês, enviado pela agência espacial japonesa, também tombou durante o pouso, acabando de cabeça para baixo.
Por que assistimos a uma repentina epidemia de espaçonaves rolando pela Lua como ginastas olímpicos fazendo exercícios de solo? Por que é tão difícil pousar de pé ali?
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Na internet e em outros lugares, pessoas apontaram a altura do módulo de pouso Odysseus – 4,3 metros dos pés de pouso até os painéis solares – como um fator que contribuiu para seu pouso desequilibrado.
Será que a Intuitive Machines, fabricante do Odysseus, cometeu um erro crasso ao construir a espaçonave dessa maneira?
Os cientistas da empresa apresentam uma justificativa de engenharia para seu design alto e magro, mas os comentaristas da internet têm um bom argumento.
Uma coisa alta e magra cai mais fácil do que um objeto baixo e atarracado. E na Lua, onde a força da gravidade é apenas um sexto da terrestre, a propensão a tombar é ainda maior.
Não é uma constatação nova. Meio século atrás, os astronautas da Apollo viveram essa experiência em primeira mão saltando na Lua e, de vez em quando, caindo no chão.
Philip Metzger, ex-engenheiro da Nasa que agora é cientista planetário na Universidade da Flórida Central, elucidou a matemática e a física que explicam por que é mais difícil ficar de pé na Lua.
“Fiz os cálculos para valer e é bem assustador mesmo”, disse Metzger na semana passada no X, rede social antes conhecida como Twitter. “Na gravidade lunar, o movimento lateral capaz de tombar uma sonda desse tamanho é de apenas alguns metros por segundo” (Um metro por segundo é pouco mais de 3 quilômetros por hora).
Essa questão da estabilidade tem duas partes. A primeira é a estabilidade estática. Se o módulo se inclinar muito, vai cair quando o centro de gravidade ficar para além dos pés de pouso.
Acontece que o ângulo máximo de inclinação é o mesmo na Terra e na Lua. E seria o mesmo em qualquer lugar, porque a gravidade é cancelada na equação.
No entanto, a resposta muda se o módulo ainda estiver em movimento. O Odysseus deveria pousar verticalmente, com velocidade horizontal zero, mas, devido a problemas com o sistema de navegação, ele ainda estava se movendo lateralmente quando atingiu o solo.
“Os cálculos baseados na Terra agora são um problema”, disse Metzger. Ele deu um bom exemplo: tentar empurrar a geladeira na cozinha. “Ela é tão pesada que não vai tombar com um empurrão leve”, disse Metzger.
Mas, se você a substituir por um bloco de isopor no formato da geladeira, o que seria parecido com o peso de uma geladeira na gravidade lunar, “então um empurrão muito leve já vai tombá-la”, disse Metzger.
Supondo que o módulo continue inteiro, ele vai girar no ponto de contato onde o pé de pouso toca o solo.
Os cálculos de Metzger sugeriram que, para uma espaçonave como o Odysseus, os pés de pouso precisariam ser cerca de 2,5 vezes mais largos na Lua do que na Terra para neutralizar a mesma quantidade de movimento lateral.
Por exemplo: se 3 metros de largura fossem suficientes para pousar na Terra na velocidade horizontal máxima, então os pés teriam que estar separados por 4,5 metros para não tombar na Lua com a mesma velocidade lateral.
Para simplificar o projeto, os pés de pouso do Odysseus não se dobram, e o diâmetro do foguete SpaceX Falcon 9 que o elevou ao espaço limitou a distância entre os pés.
“Então, na Lua, você precisa manter as velocidades laterais muito baixas no pouso, muito mais baixas do que se você pousasse o módulo na gravidade da Terra”, escreveu Metzger no X.
Eu também tive dúvidas sobre o formato do módulo de pouso quando visitei a sede e a fábrica da Intuitive Machines em Houston, em fevereiro do ano passado. “Por que é tão alto?”, perguntei.
Steve Altemus, CEO da Intuitive Machines, respondeu que tinha a ver com os tanques que contêm o metano líquido e os propulsores de oxigênio líquido da espaçonave.
O oxigênio pesa duas vezes mais que o metano, então, se o tanque de oxigênio ficasse ao lado do tanque de metano, o módulo de pouso ficaria desequilibrado. Em vez disso, os dois tanques foram empilhados um em cima do outro.
“Daí a altura”, disse Altemus.
Scott Manley, que comenta sobre foguetes no X e no YouTube, observou que Altemus liderou o desenvolvimento de um módulo de pouso mais baixo quando estava na Nasa, uma década atrás.
Esse módulo de teste, chamado Morpheus, também usava propulsores de metano e oxigênio, mas os tanques foram configurados em pares para equilibrar o peso. O módulo nunca chegou a decolar.
Em entrevista, Manley disse que o projeto também teria funcionado para o módulo de pouso da Intuitive Machines, mas teria deixado a espaçonave mais pesada e complexa.
Se a espaçonave precisasse de dois tanques de metano e dois tanques de oxigênio, sua estrutura teria de ser maior e mais pesada. Os tanques também ficariam mais pesados.
“Tem mais área de superfície, então mais superfície para isolar”, disse Manley. Ele acrescentou que também seriam necessários “mais encanamentos e mais válvulas, mais coisas para dar errado”.
A altura do Odysseus também oferecia outra vantagem quanto ao local de pouso, na região do polo sul. Na parte inferior da Lua, a luz solar brilha em ângulos baixos, produzindo sombras longas. Se o Odysseus tivesse ficado de pé, os painéis solares no topo da espaçonave teriam permanecido fora das sombras por mais tempo, gerando mais energia para a missão.
Durante a visita à Intuitive Machines, Tim Crain, diretor de tecnologia da empresa, disse que a espaçonave foi projetada para ficar de pé ao pousar, mesmo em uma inclinação de mais de 10 graus. O software de navegação foi programado para procurar um local onde a inclinação fosse de menos de 5 graus.
Como os instrumentos a laser para medir a altitude não estavam funcionando durante a descida do Odysseus, o módulo pousou mais rápido do que o planejado, em uma inclinação de 12 graus. Isso excedeu os limites do projeto. O Odysseus derrapou na superfície, quebrou um dos seis pés e tombou de lado.
Se os instrumentos a laser estivessem funcionando, “teríamos arrasado no pouso”, disse Altemus durante entrevista coletiva na semana passada.
As mesmas preocupações vão valer para a enorme nave estelar da SpaceX que vai levar dois astronautas da Nasa à superfície da Lua já em 2026.
A Starship, que tem a altura de um prédio de 16 andares, terá de descer perfeitamente na vertical e evitar inclinações significativas. Mas estes são desafios de engenharia solucionáveis, disse Metzger.
“Isso remove parte da margem de erro em sua estabilidade dinâmica, mas não remove toda a margem de erro”, disse Metzger sobre um módulo de pouso alto. “A margem que resta é administrável, desde que os outros sistemas da espaçonave estejam funcionando”.
Este artigo foi originalmente publicado no New York Times.
/ TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
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