THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando esbarrei com ele na rua em Roma no verão passado, não nos víamos há quase uma década. Sabe quando as pessoas dizem que você vai se apaixonar quando menos esperar? Eu estou sempre esperando. Em todos os aviões, em todos os cafés, estou sempre esperando uma faísca com alguém.
Eu tinha saído de férias depois do pior surto de doença mental que tive em anos. Meu psiquiatra disse que viajar poderia funcionar como um remédio geográfico. Quando você está preso em sua mente, é provável que se sinta preso em seu corpo. Novos ambientes podem criar uma sensação de liberdade, lembrando que a vida é cheia de possibilidades.
Romances sempre me deram uma sensação semelhante de fuga. Eu anseio pelo sentimento consumidor de ter uma paixão, porque canaliza minhas emoções para algo fora de mim. No amor, meus sentimentos são mágicos e construtivos, em vez de prejudiciais e destrutivos.
Antes de reservar a viagem a Roma, eu estava, aos 27 anos, em um poço familiar de depressão. O verão parecia nunca chegar a Londres, e eu passava os meses nublados sendo rejeitada por empregos, bebendo gim e dormindo o dia todo. Ainda me recuperando da pandemia, me senti perdida, deprimida e solitária.
Concentrei-me na única emoção que me fazia sentir bem - o amor. Durante o lockdown, eu finalmente disse a um dos meus melhores amigos que estava apaixonada por ele. Meus sentimentos não foram correspondidos, mas nos tornamos ainda mais próximos, unidos por nossa honestidade recém-descoberta. Meu irmão mais velho, um psicólogo, me disse: “Tente se concentrar na realidade do relacionamento, em vez de em seu potencial”.
Ignorando esse conselho sensato, despejei minha energia nessa conexão, esperando que um dia meu amigo me amasse do jeito que eu queria.
Quando ele terminou nossa amizade abruptamente por mensagem de texto, foi pior do que um rompimento. Parecia minha culpa: a intensidade dos meus sentimentos afastou um dos melhores amigos que já tive.
A dor parece pior quando é familiar, como bater no mesmo hematoma várias vezes. Eu queria ter guardado meus sentimentos para mim mesma.
Pela primeira vez em anos, pensei seriamente em tirar minha vida. Quando esses pensamentos mudaram para a elaboração de planos, procurei amigos, que intervieram para ajudar. Eu sabia por experiência que, embora não pudesse ver um caminho a seguir, a vida estava ali ao virar a esquina. Então fechei meus olhos, desaparecendo em memórias e imaginações, sobrevivendo a cada dia.
Depois de quatro meses de terapia e finalmente uma oferta de emprego, minha depressão começou a passar. Lembrando as palavras do meu psiquiatra, decidi sair de Londres.
Instantaneamente, pensei em Roma. Eu acreditava nos poderes curativos do sol, do espaguete e de ver a Capela Sistina. Além disso, havia a perspectiva de um romance de férias. Eu só conhecia uma pessoa que morava lá - um italiano sério e sensível que conheci viajando pelo sul da Europa. Tivemos uma breve aventura oito anos antes e não nos falamos mais desde então.
Agi impulsivamente e mandei uma mensagem para ele no Instagram. Ele parecia animado com o encontro, e eu me peguei imaginando um caso de amor dramático. Passei meus primeiros dias na Itália esperando ansiosamente nosso encontro. Mas quando ele cancelou, eu me resignei ao fracasso de outra fantasia romântica.
Estar em Roma era tanto uma afirmação da vida quanto uma solidão. Passei tardes bebendo vinho, mantendo meus óculos escuros nas praças iluminadas. Visitei museus de arte com paredes com afrescos, sentindo-me mal com uma ansiedade inquieta. Olhei para prédios antigos enquanto ouvia músicas que meu ex-amigo tinha me mandado, músicas que me fizeram sentir ainda mais a falta dele.
Em suma, eu tinha ido embora, mas minha depressão não.
Minha dor não era apenas sobre um amor que eu havia perdido ou uma aventura não realizada. Eu estava de luto pelos meses roubados pelos lockdowns, o tempo que havia desaparecido na depressão, a pessoa que eu poderia ter sido e o futuro que eu poderia ter.
No final da minha viagem, comprei uma passagem de última hora para o Vaticano. Na caminhada até lá, comecei a desejar um expresso. Sentindo-me agitada, parei do lado de fora de vários cafés sem entrar. Finalmente, escolhi um lugar, sentando em uma mesa ao ar livre de frente para a rua.
Enquanto esperava pelo meu café, minha antiga paixão italiana passou. Ele diminuiu a velocidade, tirou os óculos escuros e disse meu nome como uma pergunta.
Eu tinha esquecido muitas coisas sobre ele: ele tinha covinhas quando sorria, seu cabelo era castanho, eu tive que ficar na ponta dos pés para beijar sua bochecha.
Tínhamos 19 anos quando nos conhecemos em um clube de praia em Maiorca. Nadamos, conversamos e nos beijamos até o pôr do sol, abraçados no mar enquanto o ar esfriava. Ele prometeu que quando eu visitasse Roma algumas semanas depois, ele me levaria para sair.
Esperando cervejas em um albergue, me surpreendi quando ele foi me buscar em seu pequeno carro italiano e me deu uma dúzia de rosas. Bebemos Prosecco em um bar ao ar livre, com vista para a cidade antiga.
Ele disse que eu o fazia sentir como se estivesse no céu. E eu entrei em pânico. Naquela época, eu lidava com meus humores tentando esmagá-los, com medo de quão profundamente eu sentia as coisas.
No dia seguinte ao nosso encontro, ele queria me levar para uma festa de família. Quando vi o carro dele parar do lado de fora do meu hotel, afundei no chão abaixo da minha janela, ignorando suas mensagens e fingindo que não estava.
Parte de mim ansiava por esse tipo de romance, mas eu estava com medo de deixar alguém ver minha intensidade e ser rejeitada se ele não gostasse. Eu brinquei sobre sua paixão com os amigos, dizendo: “Ele é muito intenso”, repetindo uma crítica que muitas vezes havia sido dirigida a mim. Fui embora de Roma sem vê-lo novamente.
Agora, aqui estava ele, sorrindo como se o tempo não tivesse passado.
Nós rimos sem acreditar, e ele se desculpou pelo cancelamento. Ele estava na vizinhança para um teste de atuação, e nós conversamos sobre os desafios de perseguir sonhos criativos.
“Passo a passo”, ele disse, “as coisas virão”.
Naquela noite, nos encontramos em uma praça coberta de vegetação e luzes douradas. Sentados do lado de fora de uma trattoria, ele pediu Aperol spritzes e espaguete. Fui jogada de volta à alegria que sentira oito anos antes, mas desta vez com menos medo. Uma queda livre, depois de ficar presa dentro de uma tristeza estagnada por tanto tempo.
Conversamos sobre nosso primeiro encontro em Roma. Quando mencionei seus gestos românticos - as rosas, palavras sinceras, a aparição no meu hotel - ele ficou constrangido.
“Eu não sou mais aquele garoto”, ele disse.
Fiquei desapontada; ao longo dos anos, eu tinha me tornado aquela garota. Eu não fugia mais dos meus sentimentos, mas olhava para eles com cuidado, deixando-os perto e indo aonde quer que eles me levassem.
Depois da meia-noite, entramos na piscina do meu apartamento, mais uma vez nos beijando na água azul-turquesa. Passamos a noite juntos e, de manhã, ele não conseguiu encontrar um de seus anéis. Quando caiu dos lençóis depois que ele saiu, mandei uma mensagem para ele com uma foto.
“Fique com ele”, escreveu. “É uma lembrança.”
Mas eu não queria que fosse uma lembrança. Eu queria mais.
Pedi para vê-lo novamente. Ele concordou em jantar, mas algumas horas antes, ele cancelou.
Ele se desculpou, culpando o prazo final de um projeto musical, e me pediu para almoçar no dia anterior ao meu voo de volta a Londres.
Eu não conseguia decidir se deveria ir. Enquanto deliberava, pensei em um momento do nosso encontro mais recente. Antes do jantar, ele parou abruptamente de andar, curvando-se para pegar uma moeda de euro que havia caído entre os paralelepípedos.
“Na Itália”, ele disse, “é um bom sinal quando você encontra uma moeda. Eu sempre as pego. Não consigo evitar. Eu tenho que acreditar em alguma coisa.”
Eu fui.
Sentamos embaixo do sol e ele pediu ravioli e vinho branco. Em seguida, pequenas xícaras de café expresso, seguidas por delicadas taças de limoncello gelado.
Eu mergulhei no momento, aproveitando-o exatamente como era. As horas se passaram e ele acabou tendo que ir para a festa de um amigo. Eu sabia que se ele tivesse me convidado para ir, desta vez, eu teria dito sim.
Mas ele não convidou. Em vez disso, trocamos um beijo doce e nos despedimos.
Muitas vezes fui chamada de romântica incurável, mas estou cheia de esperança. Por muito tempo, concentrei-me no que a intensidade das minhas emoções tirou de mim. Mas meus sentimentos também me deram a capacidade de imaginar possibilidades vívidas e me lançar em direção a elas.
Confiar que a vida pode ser expansiva e brilhante mais uma vez, mesmo quando parece tão desesperadamente escura. Correr o risco de ser ferido por uma chance fugaz no amor. Acreditar que um dia alguém verá o mesmo belo futuro que eu vejo - e sentirá tudo ali comigo.
Se você está tendo pensamentos suicidas, entre em contato com o Centro de Valorização da Vida (CVV) pelo número 188. O atendimento é gratuito, totalmente sigiloso e está disponível 24 horas por dia. No site do CVV (cvv.org.br) você pode conversar também por e-mail e via chat. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES
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