ABUJA, Nigéria - Mais de quatro anos atrás, militantes islâmicos do Boko Haram invadiram a cidade de Bama, no nordeste da Nigéria, montando ali seu novo quartel-general e obrigando dezenas de milhares de pessoas a fugir para salvar as próprias vidas.
Durante anos, muitos dos antigos moradores de Bama viveram em campos paupérrimos ou outras formas temporárias de habitação enquanto os combates entre os militantes e os militares destruíam sua cidade. Este ano, o governo declarou que era seguro voltar à cidade.
Novos lares e novas escolas - uma Bama inteiramente nova - guardava como parte de um programa de reconstrução patrocinado pelo governo, garantiram as autoridades. Em abril, o governo escoltou 3,6 mil moradores que voltavam para suas casas.
Mas, ao chegar, muitos encontraram lares que não passavam de fachadas, com o interior inacabado e sem encanamento. Havia poucas escolas funcionando, que logo ficaram superlotadas. O hospital principal não tinha funcionários em número suficiente nem havia refrigeradores funcionando para impedir que os medicamentos estragassem. O número de banheiros era tão pequeno que a sujeira logo de espalhou pela cidade toda.
Bama deveria funcionar como uma vitrine para o governo, mostrando o quanto suas forças tinham avançado no combate ao Boko Haram. Em vez disso, a cidade é apenas um cenário oco - semelhante aos pronunciamentos feitos pelas autoridades durante mais de um ano, afirmado que tinham derrotado os militantes.
As declarações nesse tom continuam sendo feitas mesmo enquanto o Boko Haram promove uma campanha de atentados suicidas contra mesquitas e mercados, sequestros de pessoas importantes e ataques contra comboios militares.
Em abril, Nasiru, pai de cinco filhos, chegou a Bama para encontrar campos considerados tão perigosos que os agricultores não podiam plantar nada que crescesse muito, para não proporcionar cobertura a eventuais militantes invasores. As condições eram ruins, mas o governo ameaçou aqueles que se queixaram. Assim, ele voltou para seu lar temporário em Maiduguri, a 70 quilômetros dali, deixando para trás a mulher e os filhos para manter a posse da sua antiga casa.
Nos supermercados de Bama, os produtos são tão poucos e caros que Nasiru volta a cada duas semanas trazendo comida.
O Boko Haram já atacou a cidade reconstruída após o retorno dos moradores. Mas preservar uma imagem vitoriosa é importante para o governo federal conforme a temporada eleitoral se intensifica na Nigéria. O presidente Muhammadu Buhari é cada vez mais criticado por sua abordagem para a questão da segurança.
A campanha militar inicial contra o Boko Haram obrigou muitos combatentes a bater em retirada e pôs fim aos ataques contra instalações do exército. Buhari conseguiu negociar a libertação de aproximadamente 100 das estudantes sequestradas em 2014 numa escola perto da cidade de Chibok.
Mas, no ano passado, o governo bombardeou por engano um acampamento de desabrigados, matando dezenas. E os atentados suicidas - muitos deles cometidos por adolescentes - se intensificaram. Mais ataques contra soldados começaram a ocorrer.
Este ano, o Boko Haram realizou outro sequestro em massa de estudantes na comunidade de Dapchi, nordeste do país. Muitos nigerianos ficaram surpresos com a ocorrência, especialmente sob o governo de um presidente cuja campanha teve como base a promessa de derrotar os militantes.
A maioria das estudantes de Dapchi voltou para casa. Algumas ainda estão desaparecidas, e cerca de 100 outras estudantes de Chibok permanecem sob custódia dos militantes.
Reconfigurado por Buhari, o novo exército expulsou o Boko Haram de Bama em 2015. Desde então, cerca de 11 mil lares foram construídos e reformados. Em junho, as autoridades declararam que era seguro retornar à região de Bama.
Mas, após a reabertura da cidade, pelo menos três atentados suicidas foram frustrados pelas forças de segurança. Três semanas após o retorno dos moradores, um atentado suicida duplo durante as preces matinais numa mesquita deixou quatro mortos e sete feridos. E, no dia 30 de junho, duas pessoas numa cidade vizinha foram mortas em ataques cometidos por militantes.
Enquanto isso, novas operações militares contra o Boko Haram obrigaram cerca de 4 mil pessoas a abandonarem seus lares em outra parte da região. O exército as deteve para tentar determinar se há entre elas simpatizantes do Boko Haram, prática condenada pelos grupos de defesa dos direitos humanos.
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