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Pesquisadores se dedicam a estudar animais selvagens urbanos e doenças que eles podem transmitir

Os cientistas se esforçam em suas pesquisas para compreender os riscos potenciais para pessoas, animais de estimação e para os próprios animais

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Por Emily Anthes

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em uma manhã do mês passado, Laura Dudley Plimpton estava no Forest Park, no Queens, olhando para dois guaxinins capturados. Não foi a primeira vez que Plimpton, ecologista da Universidade de Columbia, apanhou dois deles em uma gaiola projetada para um só. Mas normalmente, quando isso acontecia, ela encontrava uma mãe e um pequeno filhote lá dentro.

'Eu realmente não sei como eles fizeram isso', disse Plimpton sobre dois guaxinins presos em uma única gaiola. 'Eles deviam ter apostado corrida entre si até o marshmallow.'  Foto: Andres Kudacki/The New York Times

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Essa armadilha continha dois adultos roliços e totalmente crescidos, duas bolas de pelos eriçados que se fundiram no que um membro da equipe de captura chamou de um único “grande esmagamento”. Os guaxinins pareciam despreocupados, um descansando casualmente em cima do outro dentro da gaiola, que tinha marshmallows enormes como isca.

“Vocês são tão bobos”, disse Plimpton. Seu comportamento era improvavelmente alegre, e sua trança francesa estava arrumada de forma impressionante para alguém que havia chegado ao parque antes do amanhecer. “Eu realmente não sei como eles fizeram isso”, acrescentou ela, virando-se para um colega. “Eles devem ter apostado uma corrida até o marshmallow.”

Pelo seu esforço, os guaxinins ganharam um rápido exame veterinário, uma vacina contra a raiva e um lugar na pesquisa de Plimpton: um estudo sobre animais urbanos, os vírus que transportam e como eles podem espalhar-se pela cidade.

Identificamos uma forte correlação entre a visitação de cervos e a descoberta de carrapatos no quintal de alguém

Maria Diuk-Wasser, diretora do laboratório de eco-epidemiologia de Columbia

Embora os ratos recebam a maior parte da atenção, a cidade de Nova York está repleta de todos os tipos de criaturas - guaxinins, gambás, cervos e até mesmo coiotes ocasionais - que nem sempre são visíveis para as pessoas. Para estes animais, a vida urbana oferece algumas oportunidades claras, especialmente “se aprenderem a utilizar recursos humanos como o lixo”, disse Maria Diuk-Wasser, que dirige o laboratório de eco-epidemiologia de Columbia, onde Plimpton faz doutorado.

Mas a vida na cidade também apresenta desafios distintos para os animais, que muitas vezes vivem em locais próximos e têm interações frequentes com outras espécies, incluindo nós. Isso pode aumentar os riscos de transmissão de doenças para pessoas, animais de estimação e animais selvagens.

Assim, Plimpton, Diuk-Wasser e os seus colegas estão tentando aprender mais sobre estes riscos, na esperança de proteger a saúde humana e animal. Eles também estão iluminando a forma como as nossas vidas estão interligadas com as dos nossos vizinhos animais, mesmo em um dos ambientes mais urbanos da Terra.

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“Temos todas essas interações próximas uns com os outros, quer saibamos disso ou não”, disse Plimpton. “Está sempre acontecendo ao nosso redor.”

Raven Schuman, especialista em vida selvagem do Departamento de Agricultura dos EUA, passou a noite colocando armadilhas em locais que pareciam territórios promissores para guaxinins. Foto: Andres Kudacki/The New York Times

Encontro de guaxinins

Durante anos, Diuk-Wasser tem investigado como os ambientes urbanos moldam as comunidades animais e como isso, por sua vez, pode afetar a propagação de certos vírus. Ela tem se interessado especialmente por doenças transmitidas por carrapatos e por explorar como as características da paisagem em Staten Island afetam os movimentos dos cervos, que soltam carrapatos enquanto atravessam o bairro. “Identificamos uma forte correlação entre a visitação de cervos e a descoberta de carrapatos no quintal de alguém”, disse Diuk-Wasser.

A pandemia de covid-19 proporcionou uma oportunidade para expandir a pesquisa, especialmente quando se tornou claro que as pessoas transmitiam regularmente o SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid, a cervos, gatos e outros animais. O universo dos coronavírus é vasto, e Plimpton e Diuk-Wasser questionaram se existiriam outros coronavírus circulando na vida selvagem da cidade que pudessem representar um risco para animais ou pessoas.

“À medida que começamos a procurar por coronavírus, começamos a encontrar todos esses outros patógenos”, disse Plimpton. “E vendo o fardo que algumas dessas populações têm em termos de saúde.”

No verão passado, Plimpton estava capturando e recolhendo amostras de guaxinins no extenso Cemitério Green-Wood, no Brooklyn, quando começou a notar animais com sintomas estranhos: perda de pelo, feridas nas patas, problemas de visão e desorientação. Foi um surto de cinomose canina, uma doença que os pesquisadores inicialmente não procuravam. “Aconteceu diante dos nossos olhos”, disse Diuk-Wasser.

A partir da esquerda, o veterinário Julian Rivera, a Sra. Plimpton e Maria Diuk-Wasser, a investigadora principal do projeto, coletam amostras de um guaxinim sedado na estação de tendas em Forest Hills. Foto: Andres Kudacki/The New York Times

A cinomose canina não é uma ameaça à saúde dos humanos, mas costuma ser fatal em guaxinins e gambás e pode afetar cães. E como pode ser confundida com a raiva, os surtos podem esgotar os recursos da cidade, exigindo que as autoridades recolham e testem guaxinins sintomáticos.

Os pesquisadores logo confirmaram o vírus em 11 guaxinins, dois gatos e um gambá. Eles esperam que, ao sequenciar os genomas das amostras virais coletadas, possam desembaraçar a cadeia de transmissão e mapear como a cinomose se espalhou pelo cemitério.

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Esse trabalho está em andamento, mas os movimentos dos guaxinins, que Plimpton rastreou com coleiras GPS e sensores Bluetooth, forneceram pistas. A área ao redor do canto sudoeste do cemitério era um ponto importante para interações com guaxinins. Essa região continha o pátio de serviço do cemitério, onde muitos funcionários trabalham e comem, além de alguns pátios residenciais onde os moradores deixavam comida para gatos de rua.

Embora a ideia continue sem comprovações, Plimpton levanta a hipótese de que a área pode ter servido como uma “zona de superespalhamento”, com lixo, jardins e comida de gato que atraíram guaxinins famintos e colocaram os animais em contato próximo.

O cemitério já tomou medidas, adotando latas de lixo que são mais difíceis para os animais alcançarem e incentivando aqueles que moram nas proximidades a não deixar comida para os gatos à noite, disse Sara Evans, gerente sênior e curadora de coletas vivas do Green-Wood.

Após terem amostras retiradas para análise, os guaxinins e gambás são liberados de volta ao ambiente.  Foto: Andres Kudacki/The New York Times

‘Todos os esfregaços’

Os pesquisadores também estão investigando estas relações em uma escala maior, em toda a cidade, com uma coleção de espécimes biológicos de cerca de 700 animais, incluindo guaxinins, cervos, gambás, gatos, musaranhos e camundongos de patas brancas. “Estou começando a ter síndrome do túnel do carpo com todos os esfregaços”, disse Plimpton.

Em 14 de setembro, ela voltou à ação no Forest Park. Seus colegas do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), que lideravam o esforço de captura, haviam atravessado o parque na noite anterior, colocando armadilhas em locais que pareciam ser territórios promissores para guaxinins. Carvalhos grandes e antigos costumam trazer sucesso. “Também é muito bom colocar perto de grandes áreas de lixo”, disse Raven Schuman, especialista em vida selvagem do USDA.

Foi uma boa noite de captura, rendendo 17 guaxinins e quatro gambás. Na manhã seguinte, os pesquisadores começaram a trabalhar com os animais, um por um, no local de amostragem.

Quando Plimpton finalmente terminou a coleta no Forest Park, os animais foram soltos onde foram encontrados. O par de guaxinins que caiu na mesma armadilha dormiu sem sedação. O primeiro guaxinim, uma fêmea, imediatamente saiu correndo e disparou pela trilha. O macho maior saiu devagar. Então, ele ganhou velocidade, cambaleando em um matagal e, segundos depois, desaparecendo de vista. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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