Ruanda proíbe produtos para clareamento da pele

A indústria de clareadores, muitos deles nocivos à saúde, é impulsionada pela crença de que a pele mais clara indica status social privilegiado

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Por Sandra E. Garcia

O clareamento da pele é uma indústria de bilhões de dólares nos países predominantemente negros, mas alguns governos querem que isso mude. Um deles é o de Ruanda. Apontando para os efeitos nocivos dos produtos químicos para a saúde, o país começou uma repressão à venda de agentes clareadores, principalmente a hidroquinona e o mercúrio, encontrados nos cosméticos.

"Temos inspecionado cosméticos para garantir que não contenham hidroquinona nem mercúrio", disse recentemente Simeon Kwizera, porta-voz da Comissão de Padronização de Ruanda. "Estamos apreendendo cosméticos, inspecionando lojas e mercados e orientando revendedores".

Ruanda, Gana e outros países proibiram os cremes clareadores que contêm mercúrio ou hidroquinona. Foto: Gulshan Khan/Agence France-Presse

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Em Ruanda e em outros países, as pessoas usam cosméticos para clarear a pele por acreditarem que a pele mais clara seria ideal ou indicaria um status social privilegiado. Pessoas de pele mais escura não veem necessariamente seus semelhantes nos cartazes de publicidade, filmes e anúncios, e as celebridades de pele escura às vezes se tornam mais populares depois de clarearem a pele. Tudo isso parece disseminar a crença segundo a qual a pele mais escura não seria considerada bela.

A indústria do clareamento é impulsionada não apenas pelos países africanos, mas também por países como Índia, China, Coreia do Sul e muitos outros do Caribe. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, 61% do mercado de produtos dermatológicos da Índia são compostos por produtos de clareamento da pele. Na Nigéria, 77% das mulheres usam produtos de clareamento da pele com regularidade e, na África do Sul, 59% das mulheres o fazem, de acordo com a agência de saúde.

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O uso desses produtos frequentemente requer a exposição à hidroquinona e ao mercúrio, principais ingredientes da maioria dos produtos de clareamento da pele, que perturbam ou inibem a produção de melanina, de acordo com o dermatologista Carlos Charles, fundador da clínica Derma di Colore, em Nova York. Dessas duas substâncias, o mercúrio é a mais nociva. Pode causar problemas nos rins, além de provocar alergias na pele, cicatrizes, ansiedade, depressão, psicose e neuropatia periférica, além de reduzir a resistência da pele a infecções por bactérias e fungos, de acordo com a OMS.

Em se tratando da hidroquinona, "os problemas surgem quando é usada em altas concentrações", explicou Charles. "A substância pode causar alergia, mas o problema é quando ela é usada em altas concentrações por períodos prolongados - pode causar ocronose, um paradoxal escurecimento da pele".

Alguns países proibiram os cremes clareadores ou o uso de mercúrio e hidroquinona nesses produtos. Em 1983, a África do Sul proibiu 98% dos cremes à base de hidroquinona. Em 2015, a Costa do Marfim proibiu todos os cremes branqueadores, e em 2016, Gana começou a proibir certos produtos de clareamento que incluem a hidroquinona. Ruanda instituiu a proibição em 2013, mas a vigilância só passou a valer em novembro de 2018, com o início da repressão atual.

Simeon Kwizera alerta que, para evitar tantas proibições, alguns fabricantes de cosméticos enxergaram uma oportunidade de lucro mudando o nome dos agentes para manter seus produtos no mercado.

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"Há fabricantes que enganam os consumidores", segundo ele, por meio de artifícios como a criação de numerosas marcas falsas. "Eles forjam mais de 80 nomes para alterar uma denominação". Kwizera disse acreditar que os produtos com hidroquinona eram geralmente contrabandeados para Ruanda.

O presidente do país, Paul Kagame, defendeu a repressão no Twitter, descrevendo o clareamento da pele como pouco saudável.

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