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Professor Livre Docente de inteligência artificial na Faculdade de Saúde Pública da USP

Opinião | Por que humanos estão ficando menos inteligentes – e como reverter essa tendência

Sem esforço, a tecnologia não nos liberta, apenas nos mantém entretidos

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Foto do author Alexandre  Chiavegatto Filho

Ao contrário do que os nossos avós teimam em dizer, uma tendência histórica é que cada nova geração é mais inteligente que a anterior. A ciência batizou esse fenômeno de Lei de Flynn, inspirada nas observações do pesquisador neozelandês James Flynn, que encontrou um aumento constante nos escores médios de testes padronizados de QI ao longo do século 20, a um ritmo aproximado de três pontos por década.

Entretanto, recentemente, essa tendência começou a reverter. Estudos publicados nos últimos anos têm encontrado que os escores de QI estão em declínio pela primeira vez desde que começaram a ser medidos. As notas do PISA, exame global aplicado em adolescentes de 15 anos, teve sua nota média mais alta em 2012. O fenômeno ganhou o nome de “Efeito Flynn Reverso” e tem deixado pesquisadores confusos e em busca de explicações.

IA pode ser aliada da inteligência humana Foto: Sergio Barzaghi /Estadão

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As principais hipóteses têm apontado para um declínio generalizado na capacidade humana de concentração profunda e esforço cognitivo prolongado. Isso tem sido ligado à forma como consumimos informação. Trocamos os livros, que exigiam horas e dias de imersão, por fragmentos de conteúdo mastigado que bombardeiam nosso cérebro, mas raramente exigem ou estimulam alguma participação mental ativa.

A inteligência artificial (IA), que ainda é incorretamente vista como rival da cognição humana, pode tornar-se a nossa mais poderosa aliada contra essa nova tendência. Longe de só dar respostas definitivas, algoritmos de linguagem têm a capacidade de engajar as pessoas, guiando-as por caminhos de descoberta que despertam o pensamento crítico e a curiosidade.

No ambiente de trabalho, ferramentas de IA já estão liberando a cognição humana de tarefas rotineiras, permitindo que nossos cérebros se dediquem a desafios que exigem criatividade e raciocínio complexo, justamente as habilidades que definem a inteligência humana avançada e são mais difíceis de automatizar.

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O futuro mais promissor é uma simbiose cognitiva entre humanos e máquinas, com pessoas usando ferramentas de IA para ampliar suas capacidades intelectuais, não para substituir o pensamento. A IA pode nos fortalecer justo nas áreas em que estamos mais vulneráveis, como atenção sustentada, raciocínio profundo e processamento sistemático de informações complexas.

Em vez de condenar a tecnologia, precisamos repensar a maneira como interagimos com ela. Algoritmos podem também personalizar experiências de aprendizado, identificar padrões prejudiciais e promover hábitos mais saudáveis para o nosso cérebro. A IA, usada corretamente, poderá nos ajudar a recuperar, e impulsionar, nossa capacidade cognitiva.

O verdadeiro potencial da IA não será substituir nossa mente, mas ajudar a elevar a humanidade a um novo patamar. No fim, a maior ironia seria se nos tornássemos espectadores passivos de uma inteligência que nós mesmos criamos. Não por incapacidade, mas por pura preguiça de pensar.

Opinião por Alexandre Chiavegatto Filho

Professor Livre Docente de inteligência artificial na Faculdade de Saúde Pública da USP

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