Por dentro da corrida de Mark Zuckerberg para remodelar a Meta para a Era Trump

Depois de visitar o presidente eleito em novembro, fundador do grupo decidiu mudar as políticas de conteúdo e pediu a uma pequena equipe para colocar projeto em prática

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Por Mike Isaac, Sheera Frenkel e Kate Conger (The New York Times)

SAN FRANCISCO — Mark Zuckerberg manteve um círculo pequeno de pessoas a par de seu pensamento.

No mês passado, Zuckerberg, CEO da Meta, convocou um seleto grupo de executivos das áreas de políticas e comunicações, entre outros, para discutir a abordagem da empresa sobre discurso online. Ele decidiu fazer mudanças radicais após visitar o presidente eleito Donald Trump em Mar-a-Lago, na Flórida, durante o feriado de Ação de Graças. Agora, precisava que seus funcionários transformassem essas mudanças em políticas.

Zuckerberg transformou o esforço de mudança nas políticas da Meta em uma corrida de seis semanas  Foto: David Paul Morris/Bloomberg

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Nas semanas seguintes, Zuckerberg e sua equipe escolhida a dedo debateram como proceder em reuniões no Zoom, chamadas por telefone e conversas em grupo tarde da noite. Alguns subordinados deixaram jantares em família e encontros nos feriados para trabalhar, enquanto Zuckerberg opinava entre viagens às suas residências na região da Baía de São Francisco e na ilha havaiana de Kauai.

No dia de ano-novo, Zuckerberg estava pronto para anunciar as mudanças publicamente, segundo quatro funcionários e conselheiros atuais e antigos da Meta com conhecimento dos eventos, que não estavam autorizados a falar publicamente sobre as discussões confidenciais.

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O processo foi altamente incomum. Normalmente, a Meta altera as políticas que regem seus aplicativos — que incluem Facebook, Instagram, WhatsApp e Threads — convidando funcionários, líderes da sociedade e outros a contribuir. Essas mudanças geralmente levam meses. Mas Zuckerberg transformou esse esforço em uma corrida de seis semanas, surpreendendo até mesmo funcionários das equipes de políticas e integridade.

Na terça-feira, a maioria dos 72 mil funcionários da Meta soube dos planos de Zuckerberg junto com o restante do mundo. O gigante do Vale do Silício anunciou que estava reformulando a política para as postagens em seus aplicativos, afrouxando restrições sobre como as pessoas podem discutir questões sociais polêmicas, como imigração, gênero e sexualidade. A empresa encerrou seu programa de checagem de fatos voltado a combater desinformação e declarou que, a partir de agora, confiará nos usuários para identificar distorções e mentiras. Além disso, prometeu aumentar a quantidade de conteúdo político nos feeds, após anteriormente ter diminuído o destaque desse tipo de material.

Desde então, as mudanças — que têm implicações amplas para o que as pessoas verão online — foram aplaudidas por Trump e conservadores, criticadas pelo presidente Joe Biden, ridicularizadas por grupos de checagem de fatos e pesquisadores de desinformação, e preocupam grupos de defesa LGBTQ+, que temem que as alterações levem a mais assédio online e offline.

Dentro da Meta, a reação foi fortemente dividida. Alguns funcionários celebraram as mudanças, enquanto outros ficaram chocados e criticaram abertamente as alterações nos fóruns internos da empresa. Vários funcionários escreveram que estavam envergonhados de trabalhar para a Meta.

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Na sexta-feira, 10, a transformação da Meta continuou quando a empresa informou aos funcionários que encerraria seus esforços em diversidade, equidade e inclusão. A Meta eliminou o cargo de diretor de diversidade, encerrou metas de contratação de mulheres e minorias, e afirmou que não dará mais prioridade a negócios de minorias ao contratar fornecedores.

A Meta planeja “focar em como aplicar práticas justas e consistentes que mitiguem preconceitos para todos, independentemente de suas origens”, disse Janelle Gale, vice-presidente de recursos humanos, em um post interno compartilhado com o The New York Times.

Na Casa Branca, na sexta-feira, Biden disse a jornalistas que a decisão de Zuckerberg de abandonar a checagem de fatos no Facebook e no Instagram era “vergonhosa”.

Em entrevistas, mais de uma dúzia de funcionários e conselheiros atuais e antigos da Meta descreveram a mudança como servindo a dois propósitos: um é posicionar a Meta no cenário político atual, com o poder conservador em ascensão em Washington, enquanto Trump assume o cargo em 20 de janeiro. Mais que isso, as mudanças refletem as visões pessoais de Zuckerberg sobre como sua empresa de US$ 1,5 trilhão deve ser conduzida — e ele não quer mais esconder essas opiniões.

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Zuckerberg, de 40 anos, frequentemente discutiu com amigos e colegas, incluindo Marc Andreessen, investidor de risco e membro do conselho da Meta, sobre suas preocupações de que progressistas estão policiando o discurso. Ele também se sentiu prejudicado pelo que considera uma postura anti-tecnologia do governo Biden e incomodado por progressistas na mídia e no Vale do Silício — incluindo na própria Meta — que o pressionavam a adotar uma abordagem rigorosa no policiamento do discurso.

A Meta se recusou a comentar.

Em uma entrevista ao podcaster Joe Rogan na sexta-feira, Zuckerberg disse que era hora de voltar à “missão original”, dando às pessoas “o poder de compartilhar”. Ele afirmou ter se sentido pressionado pelo governo Biden e pela mídia a “censurar” certos conteúdos e acrescentou: “Agora tenho muito mais clareza sobre o que penso que a política deve ser, e é assim que será daqui para frente”.

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As mudanças mais recentes foram catalisadas pela vitória de Trump em novembro. Naquele mês, Zuckerberg voou para a Flórida para se encontrar com Trump em Mar-a-Lago. Posteriormente, a Meta doou US$ 1 milhão para o fundo inaugural do presidente eleito.

Na Meta, Zuckerberg começou a preparar mudanças nas políticas de postagens. Sabendo que as decisões seriam controversas, ele reuniu uma equipe de no máximo uma dúzia de conselheiros próximos e subordinados, incluindo Joel Kaplan, um veterano executivo de políticas com fortes laços com o Partido Republicano; Kevin Martin, chefe de políticas nos EUA; e David Ginsberg, chefe de comunicações. Zuckerberg exigiu sigilo absoluto, segundo pessoas a par do esforço.

O grupo trabalhou na revisão da política de “Discurso de Ódio” da Meta, com Zuckerberg liderando o processo, disseram essas pessoas. Eles mudaram o nome da política, que descreve como lidar com insultos, ameaças contra grupos protegidos e outros conteúdos nocivos em seus aplicativos, para “Conduta Odiosa”.

Isso efetivamente mudou o foco das regras para longe do discurso, minimizando o papel da Meta em policiar as conversas online. Kaplan e Martin foram grandes defensores das mudanças, segundo essas pessoas.

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Zuckerberg decidiu promover Kaplan a chefe de políticas públicas globais da Meta para implementar as mudanças e aprofundar os laços da empresa com o governo Trump, substituindo Nick Clegg, um ex-vice-primeiro-ministro britânico que havia lidado com questões de políticas e regulamentações globais para a Meta desde 2018. Na noite anterior ao anúncio da Meta, Kaplan realizou chamadas individuais com influenciadores conservadores de mídia social, disseram duas pessoas.

Na terça-feira, Zuckerberg anunciou as novas políticas publicamente em um vídeo no Instagram. Kaplan apareceu no programa “Fox & Friends”, um dos favoritos de Trump, dizendo que os parceiros de checagem de fatos da Meta “tinham muito viés político”.

Os grupos de checagem de fatos que trabalharam com a Meta disseram que não tiveram nenhum papel em decidir o que a empresa fazia com os conteúdos verificados.

Entre as mudanças, a Meta afrouxou as regras para que as pessoas pudessem postar declarações dizendo que odiavam pessoas de certas raças, religiões ou orientações sexuais, incluindo permitir “alegações de doença mental ou anormalidade quando baseadas em gênero ou orientação sexual”. A empresa citou debates políticos sobre direitos das pessoas transgênero como justificativa para a alteração. Também removeu uma regra que proibia os usuários de afirmar que pessoas de certas raças eram responsáveis pela disseminação do coronavírus.

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Alguns materiais de treinamento que a Meta criou para as novas políticas eram confusos e contraditórios, disseram dois funcionários que revisaram os documentos. Parte do texto dizia que afirmar que “pessoas brancas têm doenças mentais” seria proibido no Facebook, mas afirmar que “pessoas gays têm doenças mentais” era permitido, disseram eles.

Na noite de quinta-feira, 9, a Meta restringiu o acesso interno às políticas e materiais de treinamento, disseram os funcionários, poucas horas depois que o site The Intercept publicou trechos.

Alguns funcionários ficaram furiosos com o que viam como esforços dos executivos para esconder as mudanças na política de “Conduta Odiosa” antes de seu anúncio, disseram duas pessoas. Embora membros da divisão de políticas normalmente revisem e comentem mudanças significativas, a maioria não teve essa oportunidade desta vez.

No Workplace, a plataforma interna de comunicação da Meta semelhante ao Slack, os funcionários começaram a debater sobre as mudanças. No grupo de funcionários Pride, onde trabalhadores que apoiam questões LGBTQ+ se reúnem, pelo menos uma pessoa anunciou sua demissão enquanto outras confidenciavam que pretendiam procurar emprego em outro lugar, disseram duas pessoas.

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Em um post no grupo Pride, Alex Schultz, diretor de marketing da Meta, defendeu Zuckerberg e disse que tópicos como questões transgênero haviam se tornado politizados. Ele argumentou que as políticas da Meta não deveriam impedir o debate público e apontou o caso Roe contra Wade, a decisão histórica sobre o aborto, como exemplo de “os tribunais avançarem à frente da sociedade” na década de 1970. Schultz disse que os tribunais “politizaram” a questão, em vez de permitir que fosse debatida civicamente.

Em sua entrevista com Rogan, Zuckerberg negou que as mudanças amplas fossem para agradar ao governo Trump, mas admitiu que a eleição influenciou seu pensamento.

“Algo bom sobre fazer isso depois da eleição é que você pode sentir o pulso cultural”, disse ele. “Chegamos a um ponto em que havia coisas que você não podia dizer, mesmo sendo discurso comum.”

Este conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA.

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