Principal assunto da tecnologia nas últimas semanas, o ChatGPT, chatbot capaz de escrever textos espertos, continua demonstrando suas possibilidades - agora, ele mostrou estar a “um passo” dos tribunais e fóruns brasileiros. A ferramenta criada pela startup americana OpenAI seria aprovada na primeira fase do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Em um experimento conduzido por Daniel Marques, filósofo, advogado e presidente da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L), o sistema marcou 48 pontos dos 80 possíveis na prova de primeira fase aplicada em 2022 - para obter aprovação, são necessários 40 pontos.
Marques conta que enviou as perguntas de múltipla escolha para o chatbot e pediu para que a máquina não apenas escolhesse uma das alternativas como também justificasse de maneira breve sua opção. “Em 3 de janeiro, apliquei o mesmo teste e o ChatGPT fez 36 pontos. A OpenAI fez melhorias e agora a ferramenta foi capaz de passar na prova”, conta ele ao Estadão - o novo resultado também é um lembrete sobre como sistemas de inteligência artificial (IA) tendem a melhorar conforme interagem com os humanos.
Assim, Marques acredita que o sistema também seria capaz de passar na segunda fase, quando a prova exige que os candidatos respondam quatro questões discursivas.
Papel da inteligência artificial no Direito
O experimento conduzido por Marques tem como objetivo demonstrar o impacto que o ChatGPT e ferramentas de IA terão no mundo jurídico. Já é possível ver sinais disso em diferentes países.
Nos EUA, o ChatGPT também foi aprovado em teste semelhante ao da OAB - assim como foi no Brasil, a máquina não foi brilhante, mas obteve nota suficiente. Na Colômbia, um juiz usou a ferramenta para redigir uma sentença em um caso sobre o direito à saúde de uma criança autista. Na Inglaterra, o escritório Allen and Overy anunciou que o ChatGPT vai redigir contratos.
“Os advogados não serão substituídos pelo ChatGPT. Eles serão substituídos pelos advogados capazes de usar a ferramenta. A ferramenta aumenta as possibilidades cognitivas dos advogados”, diz Marques.
Ele lembra que, brevemente, escritórios poderão adaptar o ChatGPT para o mundo jurídico, com bancos de dados mais específicos, que podem ajudar na redação de peças, formulação de contratos e pesquisa de casos. Marques afirma que possíveis questões educacionais não são alguns dos problemas mais urgentes no ensino jurídico nacional. “As reformas que são necessárias precedem o ChatGPT”, diz.
No mundo da educação de maneira mais ampla, professores, pais e instituições estão assustados com a possibilidade do ChatGPT ser usado para burlar testes e trabalhos. “A forma de avaliação é o que muda. Já existem universidades no mundo que trouxeram o ChatGPT para a classe e o aluno passa a ser avaliado pelas perguntas (ou prompts) que fez o sistema, diz.
“Precisamos de mais ‘filósofos do Direito’ para pensar e resolver as questões. Para o restante, o ChatGPT e outras IAs poderão ser assistentes”, diz ele. Além disso, Marques relembra: “Ao final, quem assina uma decisão ou uma petição é o profissional e não a máquina. A responsabilidade ainda é humana”.
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