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Cientista ‘estrela da supercondutividade’ enfrenta investigação após remoção de artigo

Acusações vão desde má conduta em pesquisa até a falsificação de dados da publicação

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Por Kenneth Chang
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - Uma importante revista de física, na terça-feira, 15, trouxe um artigo de ciência dos materiais que recebeu escrutínio. Um de seus autores, Ranga P. Dias, professor nos departamentos de física e engenharia mecânica da Universidade de Rochester, EUA, no início deste ano, divulgou a descoberta de um supercondutor à temperatura ambiente.

O artigo publicado não envolvia supercondutividade, mas levou a acusações contra Dias de má conduta em pesquisa, incluindo a fabricação e falsificação de dados. Embora a Universidade de Rochester tenha rejeitado alegações anteriores, uma porta-voz disse esta semana que uma investigação havia iniciado sobre a pesquisa de Dias por especialistas externos.

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Nove dos 10 autores do artigo, publicado no Physical Review Letters, concordaram com a retratação. Dias foi o único a discordar, e ele afirmou que o artigo retrata com precisão as descobertas da pesquisa. No entanto, ele disse na terça-feira que seus colaboradores, trabalhando no laboratório de Ashkan Salamat, professor de física da Universidade de Nevada, EUA, cometeram erros ao produzir gráficos dos dados usando o Adobe Illustrator, software não comumente usado para fazer gráficos científicos.

“Quaisquer diferenças na figura resultantes do uso do software Adobe Illustrator não foram intencionais e não faziam parte de nenhum esforço para enganar ou obstruir o processo de revisão por pares”, disse Dias em resposta a perguntas sobre a retratação. Ele reconheceu que as medidas de resistência em questão foram realizadas em seu laboratório em Rochester.

Por que é importante: Dúvidas recorrentes sobre alegações revolucionárias em física.

Um supercondutor é um material que conduz corrente elétrica sem resistência. Se tal substância funcionar em temperaturas comuns, poderia ser usada em linhas de transmissão de energia, máquinas de ressonância magnética e quase qualquer dispositivo que use eletricidade. Os supercondutores atuais precisam ser resfriados a temperaturas que limitam sua utilidade.

Nas últimas semanas, a euforia sobre o LK-99, um material diferente que cientistas da Coreia do Sul afirmam ser um supercondutor à temperatura ambiente, se espalhou pelas redes sociais, embora grande parte dessa empolgação tenha se acalmado depois que outros cientistas não conseguiram confirmar as observações de supercondutividade e apresentaram explicações alternativas plausíveis.

Dias afirma que seus colegas cometeram erros ao construir gráficos no Adobe Illustrator Foto: Lauren Petracca/The New York Times

No entanto, as leis fundamentais da física não proíbem a possibilidade de um supercondutor à temperatura ambiente, e a busca por tais materiais vai continuar.

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Contexto: Outro supercondutor à temperatura ambiente não verificado.

Em março, em um artigo publicado na revista Nature, Dias e seus colaboradores afirmaram ter descoberto um material que se torna supercondutor a temperaturas de até 21°C, embora necessite ser pressionado a uma pressão de 145 mil libras por polegada quadrada.

Muitos outros cientistas receberam o anúncio com ceticismo porque um artigo anterior da Nature, escrito por Dias, descrevendo um material supercondutor diferente e menos prático, já havia sido publicado.

Também foram levantadas dúvidas sobre o agora publicado artigo do Physical Review Letters. James Hamlin, professor de física da Universidade da Flórida, EUA, disse aos editores da revista que as curvas em uma das figuras do artigo descrevendo a resistência elétrica no composto químico sulfeto de manganês pareciam semelhantes às do doutorado de Dias, que descrevia o comportamento de um material diferente.

A revista recrutou especialistas externos que produziram três relatórios independentes para revisar a figura e os dados subjacentes. “As descobertas confirmam as alegações de fabricação/falsificação de dados de forma convincente”, escreveram os editores da revista em um e-mail aos autores do artigo em 10 de julho.

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A última resposta de Dias é “insatisfatória e decepcionante”, disse um dos revisores, que pediu para permanecer anônimo porque os revisores não foram identificados publicamente.

Durante os meses de idas e vindas entre os autores do artigo, Hamlin e os editores do Physical Review Letters, não houve menção ao Adobe Illustrator ou ao que Dias disse ser um gráfico melhor, que foi gerado por seu laboratório em dezembro de 2019, segundo o revisor.

Tanto a Universidade de Rochester quanto a Universidade de Nevada devem realizar investigações abertas e transparentes sobre “o que parece ser uma má conduta potencial”, disse o revisor.

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Salamat e Keith V. Lawler, professor de pesquisa da UNLV e outro autor principal do artigo sobre sulfeto de manganês, não responderam aos pedidos de comentário.

Próximos passos: Uma investigação e uma resposta.

A Universidade de Rochester “tem uma investigação abrangente em andamento sobre as questões levantadas sobre a integridade de todos os dados em questão neste e em outros estudos”, disse uma porta-voz da universidade em um e-mail.

A universidade já havia realizado três inquéritos preliminares sobre a pesquisa de Dias e decidiu que as preocupações não justificavam uma análise mais aprofundada. Desta vez, a universidade decidiu iniciar uma investigação, o próximo passo exigido por sua política sobre má conduta em pesquisa.

A universidade não pretende tornar públicos os resultados da investigação, disse a porta-voz.

Na terça-feira, Hamlin disse estar satisfeito por a revista ter levado suas preocupações a sério. Ele disse que havia duas instâncias adicionais de aparente duplicação de dados no trabalho de Dias que ele esperava que também fossem revisadas. Uma envolve outro artigo da Nature; a outra é o que Hamlin descreve como uma duplicação de dados na tese de Dias. /TRADUZIDO POR ALICE LABATE

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