Se alguém criasse uma máquina voadora capaz de rastreá-lo ao escutar sua voz, talvez isso parecesse assustador.
Mas, e se você estivesse sob uma pilha de escombros depois de um desastre natural e os socorristas não conseguissem lhe encontrar? Talvez, então, um drone localizador de humanos não parecesse uma ideia tão ruim.
Esse conceito é o objetivo dos engenheiros do Instituto Fraunhofer FKIE, da Alemanha, que construíram um protótipo de drone projetado para encontrar pessoas detectando gritos humanos e escutando outros sinais de sofrimento. A engenheira Macarena Varela, uma das principais responsáveis pelo projeto, apresentou os avanços dele na última semana, durante a conferência anual organizada pela Acoustic Society of America.
Embora seja fácil imaginar drones em busca de humanos em um filme que mistura ficção científica e terror, Macarena diz que o dispositivo seria ideal para situações pós-desastre, como terremotos, furacões e incêndios florestais. Os drones poderiam sobrevoar áreas que as equipes de resgate têm dificuldades de acessar e identificar pontos em que pessoas talvez estejam presas.
“(Os drones) podem cobrir uma área maior em um período de tempo mais curto que os socorristas ou cães farejadores em terra”, afirmou Macarena. “Se houver um desabamento de prédio, o dispositivo pode alertar e ajudar os socorristas. Ele pode ir a lugares aos quais os profissionais não teriam como acessar sozinhos.”
Veículos aéreos não tripulados ou drones são usados geralmente para missões de busca e resgate quando ocorrem desastres. Na maioria das vezes, eles capturam imagens aéreas de danos estruturais. Alguns têm recursos de imagens térmicas para analisar a temperatura corporal, enquanto drones maiores podem entregar suprimentos médicos e outros produtos para pessoas em áreas isoladas.
Mas os pesquisadores estão descobrindo novos usos para um par extra de olhos — e narizes — no céu. A Universidade de Washington tem em mente drones que usem o cheiro para localizar sobreviventes de desastres. A Aerospace Corporation está trabalhando em drones que possam identificar cães visualmente e compartilhar a localização deles com equipes de resgate. A Universidade de Zurique desenvolveu um drone capaz de mudar de forma no meio do voo para poder passar por fendas de formatos estranhos.
No entanto, localizar pessoas usando a acústica aérea apresenta sua parcela de desafios. Um sistema baseado em sons precisaria entender as diferenças entre gritos humanos e ruídos que acontecem com frequência na natureza, como gritos de animais e vento. Também pode ser necessário reconhecer padrões associados a chutes, palmas ou outras maneiras pelas quais as pessoas tentam chamar a atenção das equipes de resgate.
Os engenheiros do FKIE levaram essas situações em consideração ao desenvolver o conceito de seu drone. Eles primeiro precisaram de um banco de dados de ruídos humanos "impulsivos" para treinar o drone.
Então, gravaram a si mesmos gritando, batendo palmas e criando outros ruídos que pudessem ser um sinal de pessoas com problemas. Depois, analisaram cada frequência sonora para encontrar "marcas" comuns e as usaram para treinar o software de inteligência artificial.
E também trabalharam para fazê-lo filtrar o ruído criado pelos rotores dos drones e outros sons de ambiente, disse Macarena.
Assim que parte do software foi concluída, eles montaram um sistema de minúsculos microfones digitais para calcular ângulos "precisos" de onde o som está vindo. Microfones digitais como os encontrados em smartphones e aparelhos auditivos foram usados porque não exigem hardwares tão pesados quanto os microfones analógicos ou tradicionais, disseram os pesquisadores.
A equipe colocou o conjunto de microfones sob um drone e usou técnicas de processamento de sinal que permitiram rastrear de onde estavam vindo os ruídos humanos. O sistema também aumentou o volume e a clareza da fala. Até agora, eles realizaram "experimentos ao ar livre" com sucesso, descobrindo que o drone pode estimar a localização de uma vítima poucos segundos após captar o som, afirmou Macarena.
Em um vídeo demonstrativo, o drone é apresentado pairando acima do solo antes de girar na direção de uma pesquisadora fazendo barulhos e pedindo ajuda no chão.
"Já conseguimos detectar e localizar calculando os ângulos dos sons impulsivos com muita precisão... com a presença de ruído de drone", disse Macarena. Os engenheiros estão em processo de patentear seu método para rastrear sons usando microfones.
O próximo passo que eles gostariam de dar seria a inclusão de um microfone de alta frequência em um drone para aumentar a precisão do sistema. A ideia é captar ruídos a centenas de metros de distância, disse Macarena. No mundo real, os dados de localização da vítima podem um dia ser transmitidos para os tablets de equipes de resgate.
Desde que anunciaram sua criação na semana passada, os pesquisadores foram procurados por várias organizações interessadas em fazer parceria com eles, disse Macarena. Mas não está claro quando o conceito poderá ser utilizado.
O instituto de pesquisa essencialmente experimenta e cria protótipos. Às vezes, licencia descobertas para empresas que se concentram em produtos comercializados, mas o processo está longe de ser linear, segundo Kai Nuernberger, que lidera o departamento de desenvolvimento de negócios da instituição.
"Somos bons no desenvolvimento de tecnologias e em lidar com problemas para os quais ainda não há solução. Mas a comercialização não é, de fato, nossa tarefa", disse Nuernberger. /TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA
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