THE WASHINGTON POST - A inteligência artificial (IA) está por todos os lados. E a recente explosão de novas tecnologias e ferramentas do tipo apresentou muitos novos termos que você precisa conhecer para entender.
A tecnologia alimenta assistentes virtuais, como a Siri da Apple, ajuda os médicos a detectar câncer em ressonâncias magnéticas e faz com que seu celular reconheça seu rosto.
No entanto, ferramentas que geram conteúdo deram nova vida à área. Chatbots, como o ChatGPT e o Bard, escrevem códigos de software e capítulos de livros. Ferramentas que emulam voz podem falsificar a fala de celebridades. Geradores de imagens conseguem criar fotos hiper-realistas com apenas algumas frases.
Essa tecnologia inovadora tem o potencial de revolucionar indústrias inteiras, mas mesmo os especialistas têm dificuldades em explicar como algumas delas funcionam. E os líderes da tecnologia discordam sobre se esses avanços trarão um futuro utópico ou uma nova realidade perigosa, na qual a verdade é indistinguível da ficção.
O que é inteligência artificial?
Inteligência artificial é um termo genérico para uma grande variedade de tecnologias: não há uma definição única e até mesmo os pesquisadores discordam entre si. Geralmente, IA é um campo da ciência da computação que foca na criação e treinamento de máquinas para realizar tarefas inteligentes, “algo que, se uma pessoa estivesse fazendo, chamaríamos de inteligência”, disse Larry Birnbaum, professor de ciência da computação da Universidade Northwestern.
Há décadas, a IA vem sendo amplamente utilizada para análises, permitindo às pessoas detectar padrões e realizar previsões avaliando conjuntos de dados enormes.
Mas os avanços na área levaram a um boom na IA gerativa, uma forma de inteligência artificial capaz de criar coisas. A tecnologia pode gerar palavras, sons, imagens e vídeos, às vezes com um nível de sofisticação que imita a criatividade humana. Ela está por trás de chatbots, como o ChatGPT, e de geradores de imagens, como o DALL-E 2.
Embora essa tecnologia não possa “pensar” como os humanos, ela às vezes consegue criar obras com qualidade semelhante. Os geradores de imagens alimentados por IA criaram imagens que levaram juízes de concursos de arte a pensar que elas tinham sido feitas por um humano, e o software gerador de voz vem conservando as vozes de pessoas que sofrem de doenças degenerativas, como a esclerose lateral amiotrófica (ELA).
Os chatbots alimentados por IA generativa têm impressionado usuários ao levarem a cabo conversas assustadoramente realistas – um dos primeiros sonhos da área, como idealizado por Alan Turing. Em 1950, ele desenvolveu o “teste de Turing”, que avaliava o sucesso de uma máquina de IA segundo a capacidade dela de enganar os usuários fazendo-os acreditar que ela era humana.
Turing nunca deu muito crédito à ideia de que um computador poderia realmente “pensar” – ele considerava essa questão “insignificante demais para merecer a discussão”.
Como a inteligência artificial aprende?
O software de inteligência artificial não é nada sem dados.
As ferramentas desenvolvem inteligência por meio do aprendizado de máquina, um processo que permite aos computadores “aprender” por conta própria, sem exigir que um programador lhes diga o que fazer em cada etapa. Alimente um computador com quantidades enormes de dados e ele, mais cedo ou mais tarde, poderá reconhecer padrões e prever resultados.
A chave para esse processo são as redes neurais, sistemas matemáticos que agem como um cérebro computadorizado, ajudando a tecnologia a encontrar conexões nos dados. Elas são modeladas com base no cérebro humano, com camadas de “neurônios” artificiais que comunicam informações uns aos outros. Nem mesmo os especialistas entendem necessariamente todos os meandros de como as redes neurais funcionam.
Modelos amplos de linguagem, ou LLMs, são um tipo de rede neural que aprende a escrever e conversar com os usuários; eles estão por trás de todos os chatbots que ganharam destaque nos últimos meses. Eles aprendem a “falar” consumindo quantidades enormes de texto, muitas vezes extraído da internet, e encontrando relações estatísticas entre as palavras. Quando esses padrões de sistemas são combinados, isso pode levar a façanhas criativas: um chatbot pode criar letras de músicas que se assemelham ao estilo de Jay-Z porque ele absorveu os padrões de toda a sua discografia. No entanto, os LLMs não têm consciência dos significados das palavras.
Os parâmetros, que são pontos numéricos nos dados para treinamento de um modelo de linguagem ampla, determinam a proficiência dele em suas tarefas, como prever a próxima palavra numa frase.
Alguns pesquisadores dizem que, no futuro, a tecnologia irá se aproximar da inteligência artificial geral, ou AGI, um ponto no qual ela se iguala ou ultrapassa a inteligência dos humanos. A ideia é fundamental para a missão de alguns laboratórios de inteligência artificial, como o OpenAI, que registrou alcançar a AGI como seu objetivo nos documentos de constituição da empresa. Outros especialistas contestam que a IA esteja perto de alcançar esse tipo de sofisticação, com alguns críticos argumentando que se trata de uma expressão para fazer marketing.
Como interagir com a inteligência artificial?
A forma mais comum das pessoas experimentarem a inteligência artificial é por meio dos chatbots, que funcionam como uma forma avançada de mensageiro instantâneo, respondendo perguntas e realizando tarefas a partir de comandos.
Esses bots são treinados com coletâneas de dados da internet, incluindo conversas do Reddit e livros digitais. Os chatbots são incrivelmente hábeis em encontrar padrões e imitar a fala, mas não interpretam os significados, dizem os especialistas. “É uma versão altamente fiel ao preenchimento automático”, disse Birnbaum.
Desde que foi lançado em novembro, o ChatGPT surpreendeu os usuários com sua capacidade de produzir uma linguagem fluida – gerar romances completos, código de computador, episódios de programas para a TV e músicas. GPT significa “transformador generativo pré-treinado”. “Generativo” indica que usa IA para criar coisas. “Transformador” (ou Transformer) é um tipo poderoso de rede neural que pode processar linguagem. E “pré-treinado” quer dizer que foi treinado com uma grande quantidade de dados.
Criado pela startup OpenAI de São Francisco, o ChatGPT levou a uma disputa na qual várias empresas lançaram seus próprios chatbots. O chatbot da Microsoft, o Bing, usa a mesma tecnologia por trás do ChatGPT. E o Google lançou um chatbot, o Bard, baseado no modelo de linguagem neural da empresa, o LaMDA.
Algumas pessoas acham que os chatbots vão mudar como as pessoas encontram e consomem informações na internet. Em vez de inserir um termo em um buscador, como o Google, e vasculhar vários links, elas podem acabar fazendo uma pergunta a um chatbot e recebendo uma resposta confiante de volta. (Embora às vezes essas respostas sejam falsas, fique atento!)
O que é deepfakes e alucinação?
O boom da inteligência artificial gerativa traz possibilidades empolgantes – mas também preocupações de que a tecnologia inovadora possa causar danos.
Os chatbots às vezes podem inventar fontes ou espalhar desinformação sem titubear. Em uma ocasião, o ChatGPT inventou um escândalo de assédio sexual contra um professor universitário de direito. Ele também pode produzir teorias da conspiração em série e dar respostas racistas. Às vezes ele expressa preconceitos em seu trabalho: em um experimento robôs identificaram homens negros quando solicitados a encontrar um “criminoso” e marcaram todas as donas de casa como mulheres.
Especialistas em ética e pesquisadores de IA há muito estão preocupados que, como os chatbots recorrem a quantidades enormes de conteúdo criado por humanos – usando dados do Twitter à Wikipédia –, eles absorvam nossos problemas e preconceitos. As empresas tentaram colocar proteções semânticas para limitar o que os chatbots podem dizer, porém isso nem sempre funciona.
Às vezes, a inteligência artificial produz informações que parecem plausíveis, mas são irrelevantes, sem sentido ou completamente falsas. Esses desvios estranhos são chamados de alucinações. Outras pessoas ficaram tão envolvidas com os chatbots que acreditam erroneamente na senciência do software, quer dizer, que ele pode pensar, sentir e agir fora do controle humano. Especialistas dizem que eles não podem – pelo menos por enquanto –, mas conseguem falar de um jeito fluido para imitar algo vivo.
Outra preocupação são os deepfakes, fotos, áudios ou vídeos gerados sinteticamente que, apesar de falsos, parecem reais. A mesma tecnologia capaz de produzir imagens incríveis poderia ser usada para criar guerras falsas, fazer celebridades dizerem coisas que, na verdade, nunca disseram e provocar confusão ou danos em massa.
As empresas testam seus modelos de inteligência artificial para vulnerabilidades, erradicando preconceitos e fraquezas ao estimular falhas em um processo chamado de “read teaming”.
Apesar das tentativas de dominar a tecnologia, a inovação e a sofisticação da IA gerativa fazem com que alguns se preocupem.
“Quando as coisas falam conosco como seres humanos, nosso nível de desconfiança diminui”, disse Mark Riedl, professor de computação da Georgia Tech e especialista em aprendizado de máquina. “Nós meio que presumimos que essas coisas estão tentando ser sinceras conosco, e quando elas aparentam ser confiáveis, podemos achar difícil ser céticos.”
Quais são as empresas na disputa dos chatbots?
OpenAI: startup de inteligência artificial com sede em São Francisco foi criada como uma organização sem fins lucrativos para desenvolver “inteligência artificial geral” fora do controle das Big Techs. De lá para cá, foi transformado em um dos principais players corporativos, criando o gerador de imagens DALL-E e o chatbot ChatGPT. Agora é uma organização com fins lucrativos e parcerias com empresas, entre elas a Microsoft e a Salesforce.
Google: a gigante da tecnologia – há muito líder em IA, inclusive via pesquisa – lançou o chatbot Bard depois que as ofertas dos concorrentes se tornaram virais. É conhecida pela sua tecnologia LaMDA, um sistema para desenvolvimento de chatbots baseado em modelos amplos de linguagem.
Microsoft: a empresa de software investiu bilhões de dólares na OpenAI e uniu forças para criar um chatbot para o Bing, desenvolvido com tecnologia GPT-4. Mas houve passos em falso, inclusive quando o chatbot se rebelou, disse a repórteres que tinha sentimentos e se chamava Sydney – obrigando a gigante da tecnologia a recuar de algumas formas.
Meta: mesmo antes do ChatGPT, a empresa-controladora do Facebook lançou um chatbot chamado Blenderbot, mas ele não conseguiu conquistar os holofotes. O principal cientista de inteligência artificial da empresa posteriormente chamou o bot de “chato” porque foi “produzido para ser seguro”.
IBM: foi uma das primeiras líderes em inteligência artificial próxima às tendências atuais dos chatbots, principalmente com seu robô Watson, que cativou o público participando do programa de TV “Jeopardy!”.
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