Em Hamburgo (Alemanha), uma reunião da ICANN comemora 25 anos de sua existência. Estabeleceu-se em 30 de setembro de 1998 como uma entidade multissetorial para coordenar os recursos comuns da internet, o que inclui a gestão dos números IP e a manutenção e operação da raiz de nomes.
É na raiz de nomos que se ancoram todos os domínios de topo, como os gTLDs (genéricos) .COM, .ORG, NET, e os ccTLDs (domínios de código de país) .BR, .DE, .IT etc. A missão da ICANN foi, assim, assumir as tarefas que estavam originalmente a cargo da IANA (Internet Assigned Names Authority): um pequeno grupo de pessoas capitaneado Jon Postel. Por azares do destino, Postel faleceu inesperadamente apenas 18 dias depois da inauguração da ICANN, frustando assim sua condução como chefe de operações da recém-criada organização.
Esse foi um dos fatores que fez com que ICANN levasse algum tempo até se estabilizar, até que passasse a contar em seu corpo com a ativa participação de pioneiros como Steve Crocker, Vint Cerf, John Klensin e outros.
O evento em Hamburgo, que contou com o apoio do DENIC, o NIC da Alemanha - o terceiro maior ccTLD do mundo - teve um painel de relembrando as etapas, desde as reuniões preparatórias anteriores a 1998. Na programação técnica usual, continuará a discussão sobre a forma de se abrir uma nova temporada de propostas para a criação de mais gTLDs.
Quanto a como tratar dos riscos e ameaças que plataformas e serviços criados sobre a rede trazem, estamos em momento bastante crítico. A Inglaterra, por exemplo, aprovou uma legislação bastante restritiva e de vigilância de conteúdos que, à guiza da proteção a crianças e adolescentes, responsabilizará diretamente os provedores que não removerem conteúdo “ilegal”.
Em linha aparentemente oposta, Benjamin Brake do recém criado Departamento de Política Digital e Dados, do Ministério de Assuntos Digitais e Transportes da Alemanha, citou em sua fala de abertura na ICANN que alguns dos princípios fundantes da rede podem estar em risco. Nas palavras dele, há, mesmo no chamado “espectro progressivo” da comunidade, os que postulam uma “censura bem- intencionada”, que dê a si mesma um aspecto de virtude que muitos consideram realmente existir.
Coincidentemente li há dias a primeira constituição Brasileira, de 1824, do Império – encontrável na íntegra em planalto.gov.br – e dela pinço dois item do seu último artigo, o 179. Repasso em linguagem original da época: “IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publicalos pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar.”
“XXVII. O Segredo das Cartas é inviolável. A Administração do Correio fica rigorosamente responsável por qualquer infracção deste Artigo.”
A arte de equilibrar esses princípios com eventuais medidas de proteção que não os degradem é um ponto crucial, e que deve ser discutido hoje. Lembrando Marx (o Groucho), “Veja, esses são meus princípios… Se você não gosta deles, eu tenho outros…”.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.