Juliana Cunha, especial para o Estado
A bancária paraibana Ana Paula Santos, 32 anos, estava curtindo seu combo chocolate e literatura B algumas horas depois de levar um fora do namorado quando foi avisada via Facebook que o fulano já estava oficialmente solteiro. Como se não bastasse, dois amigos do casal já haviam “curtido” a solteirice dele.
A solução de Ana Paula foi bloquear o trio que, segundo ela, foi no mínimo inadequado. “Sinto que ele deveria esperar algumas semanas para anunciar aos quatro ventos que não estávamos mais juntos. E os amigos simplesmente não tinham o direito de demonstrar alegria com o término, acho desrespeitoso comigo.”
No livro The Breakup 2.0 – Disconnecting over New Media (Desenlace 2.0 – Desconectando-se através das Novas Mídias, sem previsão de lançamento em português), a professora Ilana Gershon tentou entender como acontecem os términos de relacionamento nas mídias digitais e por que a troca de status nas redes sociais dói tanto.
Fundo do poço. Ilana Gershon, professora de Língua e Cultura da Universidade de Indiana, passou cinco anos fazendo um questionário com seus alunos sobre as regras de um primeiro encontro. “Eu propunha esse exercício para que os estudantes entendessem que faziam parte de uma comunidade que compartilhava expectativas, mesmo quando elas não eram claramente expostas.”
As coisas começaram a ficar diferentes – e Ilana viu que estava diante de um novo objeto de estudo – quando ela fez uma alteração que pensava ser pequena: em vez de pedir que eles definissem um bom começo de relacionamento, pediu que dissessem o que seria errado no fim.
Ela esperava respostas envolvendo tudo aquilo que a sua geração compreendia como um fim catastrófico: flagrante de traição, baixaria, problemas na divisão de bens. No entanto, as respostas caminharam de forma quase unânime para mídias digitais: para eles, o fundo do poço é terminar por mensagem de texto, Facebook ou e-mail.
“As mídias digitais ficaram muito associadas à rapidez, à praticidade, conceitos que você gostaria de não ver associados ao término do seu relacionamento. Quase todas as pessoas que entrevistei compartilham o mesmo sentimento de que romper via internet significa falta de atenção e desprezo, um forte indicativo de que o relacionamento nunca foi relevante para o outro lado”, define. Para ela, o desconforto no uso de meio digitais em questões que pessoas entendem como fundamentais não atinge só os relacionamentos.
Ela acredita que grande parte da resistência contra a educação a distância ou a psicólogos que atendem via chat, por exemplo, parta dessa associação estabelecida entre internet e “praticidade” no mal sentido.
Apenas 4 dos 472 estudantes entrevistados por ela não compartilham da opinião de que usar mídias digitais para encerrar um namoro seria uma clara demonstração de indiferença. De todos os meios digitais, o Facebook foi apontado por 45% dos entrevistados como o mais terrível para fins de relacionamento e 32% das pessoas chegaram a considerar mais doloroso levar um fora virtualmente do que descobrir que haviam sido traídas.
Ilana nunca havia pensado que uma geração que praticamente vive digitalmente valorizasse tanto o contato cara a cara quando se trata de fim de relacionamentos. “Se muitos daqueles alunos conhecem seus pares pela internet, brigam, se parabenizam e falam com os pais pela internet, qual seria o grande trauma de um rompimento usando mídias digitais?”, questiona.
A resposta estaria na mensagem implícita que o meio digital traz consigo: “Se eu mando uma carta para você, antes mesmo de você ler o conteúdo, já recebeu a mensagem de que eu escolhi um papel, escrevi à mão, fui até o correio e postei aquela mensagem. A carta em si já diz que eu perdi pelo menos meia hora do meu dia em consideração a você. Já quando você envia um e-mail com o mesmo conteúdo a impressão do interlocutor é de que você queria resolver o assunto rapidamente”, afirma ela. A curiosidade virou uma pesquisa de quatro anos que tomou corpo no livro publicado pela editora da Universidade de Cornell, onde a professora procura desvendar a influência do meio digital na mensagem quando se trata de relacionamentos.
Como desconectar. Segundo a pesquisa da professora Ilana Gershon, existe um consenso de que nada substitui o olho no olho quando se trata de fim de relacionamentos, mas as pessoas abrem exceções quando não se trata exatamente de um casamento ou namoro.
Na pesquisa, 35% dos entrevistados afirmam que é aceitável pôr fim a uma relação superficial usando esse tipo de mídia. O número sobe para 43% quando empecilhos como o fato de uma das partes envolvidas não morar na mesma cidade são levantados e chega a surpreendentes 50% quando a parte que decide romper o relacionamento está convicta de que foi traída.
Mesmo para quem terminou o namoro ao vivo, a internet ainda é um campo minado para gafes. Seria adequado, por exemplo, anunciar aos quatro ventos na rede que você e o seu parzinho se desvencilharam poucas horas após o término? Para 47% dos entrevistados, seria educado esperar ao menos alguns dias antes de trocar o status de relacionamento do Facebook. 20% desses 47% ainda acham legal deixar esse campo em branco por um tempo em vez de sair escrevendo solteiro com letras garrafais.
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