Na última segunda-feira, 5, um menor de idade de Nova York (EUA) entrou com uma ação judicial contra a Meta, alegando que a gigante das redes sociais procurou manter adolescentes viciados no Instagram, expondo-os conscientemente a conteúdo nocivo.
A ação, movida no distrito norte da Califórnia, argumenta que a Meta implementou recursos que seus líderes sabiam que tornariam o Instagram viciante para os adolescentes, como a exibição de contagens de quantas “curtidas” as postagens recebem, mesmo com o aumento de evidências internas de que o serviço poderia prejudicar sua saúde mental.
A menina de 13 anos está buscando US$ 5 bilhões em danos, a serem compartilhados entre os usuários elegíveis do Instagram se o processo for certificado como uma ação coletiva.
Os processos judiciais alegam que a adolescente sofria de ansiedade, depressão e notas baixas como resultado de seu uso do Instagram.
A Meta deve “parar de manipular as crianças de maneiras prejudiciais a elas”, disse o advogado David Boies, que está representando a menor para o escritório de advocacia Boies Schiller Flexner, juntamente com os escritórios Labaton Keller Sucharow e Milberg Coleman Bryson Phillips Grossman. “Temos que ter certeza de que existem regras de trânsito”.
“Este país proíbe, universalmente, o acesso de menores a outros produtos que causam dependência, como tabaco e álcool, devido aos danos físicos e psicológicos que esses produtos podem infligir”, diz o processo. “A rede social não é diferente, e os próprios documentos da Meta provam que ela sabe que seus produtos prejudicam as crianças.”
O caso é um dos primeiros processos privados que buscam o status de ação coletiva em nome de menores contra a Meta por problemas de saúde mental desde que a denunciante do Facebook, Frances Haugen, em 2021, divulgou pesquisa interna da empresa mostrando que o Instagram piorou os problemas de imagem corporal para alguns adolescentes.
A ação legal se soma a um crescente número de processos contra a empresa, movidos por procuradores gerais do estado e distritos escolares, com o objetivo de vincular a crise de saúde mental dos adolescentes americanos às mídias sociais. Os processos argumentam que a Meta violou as leis de proteção ao consumidor ao implantar recursos manipuladores para atrair os adolescentes a permanecerem em suas redes sociais a fim de aumentar os lucros, apesar de os executivos da empresa saberem que suas plataformas tinham efeitos prejudiciais.
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As revelações contidas nos documentos da Meta que Frances Haugen trouxe à tona levaram alguns políticos americanos estaduais e federais a elaborar uma legislação para forçar as grandes plataformas da Internet a tomar medidas mais ousadas para proteger os jovens.
No mês passado, o Senado dos EUA aprovou dois projetos de lei para expandir a privacidade online e as proteções de segurança para crianças, inclusive obrigando as plataformas digitais a tomar medidas “razoáveis” para proteger as crianças contra a dependência de drogas, a exploração sexual e o bullying. O pacote legislativo também ampliou algumas restrições de privacidade federais existentes para serem aplicadas a qualquer pessoa com 16 anos ou menos, em vez de 13 anos ou menos. Os projetos de lei têm grandes chances de serem aprovados na Câmara este ano.
Em outubro, 41 Estados e o DC processaram a Meta, alegando que o Facebook e o Instagram pioram os problemas de saúde mental entre os jovens, representando um dos maiores esforços dos reguladores para lidar com o efeito das mídias sociais no bem-estar das crianças. Boies disse que o processo de segunda-feira poderia ser avaliado pelo mesmo juiz, juntamente com os processos movidos pelos procuradores gerais do estado.
Meta tenta reforçar segurança
A Meta introduziu vários recursos e políticas com o objetivo de tornar seus aplicativos mais seguros para as crianças, incluindo notificações que incentivam os adolescentes a fazer uma pausa, limites sobre como os adultos podem entrar em contato com as crianças e ferramentas para que os pais acompanhem o comportamento de seus filhos. Mas essas mudanças pouco fizeram para acalmar a indignação de alguns pais, ativistas e reguladores, que argumentam que a gigante das mídias sociais ainda está prejudicando os jovens.
O Instagram, foco da ação judicial de segunda-feira passada, tem sido o alvo mais comum de ações judiciais contra a Meta por tais danos. Alega-se que alguns recursos da plataforma foram intencionalmente desenvolvidos para fisgar os jovens usuários, incluindo as efêmeras postagens de vídeos e fotos conhecidas como “stories”, “contagens de curtidas” que incentivam os usuários a monitorar quantas pessoas afirmam positivamente suas postagens e notificações de aplicativos que alertam os jovens sobre novos conteúdos.
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O novo processo diz que a Meta conhecia os riscos desses recursos, citando pesquisas internas do “Projeto Daisy”, reveladas em documentos divulgados por Frances Haugen, em que a empresa experimentou a remoção de contagens de curtidas. A pesquisa interna mostrou que a Meta sabia que os adolescentes e jovens adultos eram mais propensos a se comparar com os outros nas mídias sociais, diz o processo, e depois que as contagens de curtidas foram removidas, a comparação social negativa entre os usuários diminuiu com o tempo. O processo também alega que a implementação pela Meta de “stories”, vídeos e fotos do Instagram que desaparecem após 24 horas incentivou os usuários a abrir o aplicativo com mais frequência para evitar perder novos conteúdos.
Desde que entrou no Instagram aos 10 anos de idade, a autora da ação, identificada apenas como A.A., “desenvolveu pensamentos autodepreciativos sobre seu corpo e sua aparência”, segundo os autos do processo, porque a plataforma mostra o conteúdo de mulheres que ela considera mais atraentes. O processo também alega que ela “não consegue parar” de usar o Instagram quando está com a família, verificando com frequência o site para se certificar de que não perderá o conteúdo efêmero de seus amigos. A preocupação de que seus amigos estejam ignorando ela quando não curtem ou não se envolvem com seus “stories” levou à ansiedade e à depressão, diz o processo, prejudicando suas notas escolares.
Além de pedir US$ 5 bilhões em indenização, o processo pede que o tribunal proíba a Meta de permitir que menores criem uma conta no Instagram sem o consentimento dos pais e de dar a menores acesso a notificações push, contagens de curtidas e conteúdo instantâneo.
Muitos casos anteriores alegando que as empresas de mídia social prejudicaram conscientemente os adolescentes se concentraram em exemplos de menores que sofreram dificuldades extremas, como exploração sexual ou automutilação, ou morreram por suicídio. Boies disse que o processo de sua cliente está focado em reconhecer e abordar um escopo mais amplo dos efeitos negativos do Instagram.
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