‘América Latina tem tribunais secretos de censura’, diz Zuckerberg ao acabar com moderação na Meta

CEO da companhia encerra moderação na empresa em defesa da ‘liberdade de expressão’

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Foto do author Mariana Cury
Foto do author Bruno Romani
Por Mariana Cury e Bruno Romani
Atualização:

Em uma sinalização a Donald Trump, Mark Zuckerberg publicou, nesta terça-feira, 7, em sua conta do Instagram, um vídeo anunciando uma série de mudanças de moderação de conteúdo e checagem de informações nas redes sociais da Meta: Facebook, Instagram e Threads. O executivo afirmou que a decisão foi tomada para acabar com uma suposta censura na plataforma e afirmou que a América Latina tem “tribunais secretos de censura”. Procurada pela reportagem para comentar a declaração, a Meta não quis se manifestar.

Segundo o CEO, as medidas são em defesa da liberdade de expressão “que foi perdida” nas plataformas ao longo dos últimos anos. O bilionário criticou ações tomadas por governos da União Europeia, América Latina e China. Ele também afirmou que vai contar com o governo de Donald Trump para pressionar governos de todo o mundo para encerrar regulação que “censure plataformas”.

Zuckerberg afirma que América Latina tem "tribunais secretos de censura" Foto: Drew Angerer/AFP

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De acordo com Zuckerberg, as mudanças são para as redes sociais voltarem para suas “raízes e origens”. Segundo ele, os sistemas de regulação das redes sociais se tornaram muito políticos e apresentam muitas falhas. Para o CEO, dessa forma, com menos regulações será mais fácil de evitar que o conteúdo de “pessoas inocentes” seja apagado por engano.

No vídeo, Zuckerberg critica as medidas de regulação de redes sociais criadas por governos ao redor do mundo. E, além disso, diz que “a América Latina tem tribunais secretos de censura”. Embora não cite o Brasil, uma das principais disputas entre autoridades e redes sociais no ano passado foi o bloqueio do X pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A rede social ficou bloqueada no País por 40 dias após a empresa se recusar a cumprir ordens do magistrado que, entre outras exigências, demandava o bloqueio de perfis ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro acusados de disseminar desinformação.

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Trabalharemos com o presidente Trump para repelir os governos de todo o mundo que estão perseguindo empresas americanas e pressionando para censurar mais. Os EUA têm as proteções constitucionais mais fortes do mundo para a liberdade de expressão. A Europa tem um número cada vez maior de leis, institucionalizando a censura e dificultando a criação de algo inovador por lá. Os países latino-americanos têm tribunais secretos que podem ordenar que as empresas retirem as coisas do ar silenciosamente. A China censurou nossos aplicativos, impedindo-os até mesmo de funcionar no país. A única maneira de impedirmos essa tendência global é com o apoio do governo dos EUA. E é por isso que foi tão difícil nos últimos quatro anos, quando até mesmo o governo dos EUA pressionou por censura”, afirmou Zuckerberg.

O pacote de novidades anunciado por Zuckerberg conta com muitas mudanças para a experiência dos usuários. Veja abaixo.

Notas da Comunidade

Segundo Zuckerberg, acabar com as ferramentas mais complexas de regulação de conteúdo é uma maneira de “devolver a liberdade de expressão perdida ao longo dos anos”. Para isso, as mudanças, que começarão a ser implementadas nos EUA, vão contar com a Notas da Comunidade, em que os próprios usuários ficarão responsáveis por sinalizar conteúdos considerados ilegais. Dessa forma, a Meta vai simplificar suas regras de moderação e diminuir os avisos de conteúdo nocivo nas plataformas. É um modelo criado por Elon Musk no X.

Simplificação de políticas de conteúdo

O CEO disse que as plataformas da Meta vão “se livrar” de diversas políticas de conteúdo nas redes sociais. Como exemplo, afirmou que o Instagram e o Facebook não vão mais sinalizar publicações que falam sobre imigração ou gênero, por exemplo. Segundo ele, o que começou como uma medida inclusiva, passou a ser usada para “calar opiniões”.

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Conteúdo político

O CEO disse que, nos últimos anos, as pessoas estavam cansadas de publicações políticas em suas redes sociais e, então, as plataformas deixaram de sugerir esses tipos de posts. Agora, porém, Zuckerberg diz que estamos em uma “nova era” e, assim, o Instagram e Facebook voltarão a sugerir conteúdos políticos em seus feeds.

Nova conduta de regulação

As plataformas da Meta costumavam ter filtros que, automaticamente, detectavam conteúdo considerado nocivo. Entretanto, Zuckerberg disse que esse tipo de detecção automática costuma errar e, mesmo que minimamente, ele não quer que “pessoas inocentes sejam caladas”. Dessa forma, agora, os filtros só denunciarão conteúdos claramente ilegais. Para conteúdos “menos graves” os usuários dependerão das denúncias da própria comunidade.

Mudança da equipe de regulação da Califórnia para o Texas

Zuckerberg disse que a equipe de regulação da Meta mudará, da Califórnia, para o Texas. Segundo ele, esse trabalho de regulação será mais proveitoso em um lugar em que há “menos preocupação” quanto ao viés dos funcionários. A Califórnia é o maior estado democrata dos EUA, enquanto o Texas é um dos principais territórios republicanos no país.

Apoio do governo Trump

Para finalizar o pacote de novidades, o bilionário disse que a Meta vai trabalhar junto com o governo Trump para proteger a liberdade de expressão ao redor do mundo. Zuckerberg criticou diversas medidas de moderação de conteúdo adotadas pelo mundo, como as da União Europeia, América Latina e EUA.

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Leia na íntegra o discurso de Mark Zuckerberg

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Olá, pessoal. Quero falar sobre algo importante hoje, porque é hora de voltarmos às nossas raízes em relação à liberdade de expressão no Facebook e no Instagram. Comecei a criar redes sociais para dar voz às pessoas. Fiz um discurso em Georgetown há cinco anos sobre a importância de proteger a liberdade de expressão, e ainda acredito nisso hoje. Mas muita coisa aconteceu nos últimos anos. Houve um amplo debate sobre os possíveis danos causados pelo conteúdo online. Os governos e a mídia tradicional têm pressionado para censurar cada vez mais. Grande parte disso é claramente política, mas também há muita coisa legitimamente ruim por aí. Drogas, terrorismo, exploração infantil. Essas são questões que levamos muito a sério e quero ter certeza de que lidaremos com elas de forma responsável.

Por isso, criamos vários sistemas complexos para moderar o conteúdo. Mas o problema dos sistemas complexos é que eles cometem erros. Mesmo que acidentalmente censurem apenas 1% das postagens, isso representa milhões de pessoas. E chegamos a um ponto em que há muitos erros e muita censura. As eleições recentes também parecem ser um ponto de inflexão cultural para priorizar novamente a expressão. Portanto, voltaremos às nossas raízes e nos concentraremos em reduzir os erros, simplificar nossas políticas e restaurar a liberdade de expressão em nossas plataformas.

Mais especificamente, vamos fazer o seguinte. Primeiro, vamos nos livrar dos verificadores de fatos e substituí-los por notas da comunidade, semelhantes ao X, começando nos EUA. Depois que Trump foi eleito pela primeira vez em 2016, a mídia tradicional escreveu sem parar sobre como a desinformação era uma ameaça à democracia. Tentamos de boa fé abordar essas preocupações sem nos tornarmos os árbitros da verdade. Mas os verificadores de fatos têm sido muito tendenciosos politicamente e destruíram mais confiança do que criaram, especialmente nos EUA. Portanto, nos próximos meses, vamos implementar um sistema mais abrangente de notas da comunidade.

Em segundo lugar, simplificaremos nossas políticas de conteúdo e nos livraremos de várias restrições sobre tópicos como imigração e gênero, que estão fora de sintonia com o discurso dominante. O que começou como um movimento para ser mais inclusivo tem sido cada vez mais usado para reprimir opiniões e excluir pessoas com ideias diferentes. E isso foi longe demais. Portanto, quero garantir que as pessoas possam compartilhar suas crenças e experiências em nossas plataformas. Em terceiro lugar, estamos mudando a forma como aplicamos nossas políticas para reduzir os erros que representam a grande maioria da censura em nossas plataformas. Costumávamos ter filtros que procuravam por qualquer violação de política. Agora, vamos concentrar esses filtros no combate a violações ilegais e de alta gravidade. E para as violações de menor gravidade, vamos depender de alguém que denuncie um problema antes de tomarmos providências. O problema é que os filtros cometem erros e derrubam muito conteúdo que não deveriam. Portanto, ao reduzi-los, vamos diminuir drasticamente a quantidade de censura em nossas plataformas. Também ajustaremos nossos filtros de conteúdo para que exijam muito mais confiança antes de remover o conteúdo. A realidade é que isso é uma troca. Isso significa que pegaremos menos coisas ruins, mas também reduziremos o número de publicações e contas de pessoas inocentes que derrubamos acidentalmente.

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Em quarto lugar, estamos trazendo de volta o conteúdo cívico. Durante algum tempo, a comunidade pediu para ver menos política porque isso estava deixando as pessoas estressadas. Então, paramos de recomendar essas publicações, mas parece que estamos em uma nova era e estamos começando a receber feedback de que as pessoas querem ver esse conteúdo novamente. Por isso, começaremos a introduzir gradualmente esse conteúdo novamente no Facebook, no Instagram e no Threads, trabalhando para manter as comunidades amigáveis e positivas.

Em quinto lugar, transferiremos nossas equipes de confiança e segurança e de moderação de conteúdo para fora da Califórnia e nossa revisão de conteúdo com base nos EUA será feita no Texas. Como trabalhamos para promover a liberdade de expressão, acho que isso nos ajudará a criar confiança para fazer esse trabalho em locais onde há menos preocupação com a parcialidade de nossas equipes. Por fim, trabalharemos com o presidente Trump para pressionar os governos de todo o mundo que estão perseguindo as empresas americanas e pressionando para censurar mais. Os EUA têm as proteções constitucionais mais fortes do mundo para a liberdade de expressão. A Europa tem um número cada vez maior de leis, institucionalizando a censura e dificultando a criação de algo inovador no país. Os países latino-americanos têm tribunais secretos que podem ordenar que as empresas retirem as coisas do ar silenciosamente. A China censurou nossos aplicativos, impedindo-os até mesmo de funcionar no país.

A única maneira de impedirmos essa tendência global é com o apoio do governo dos EUA. E é por isso que tem sido tão difícil nos últimos quatro anos, quando até mesmo o governo dos EUA pressionou pela censura. Ao perseguir a nós e a outras empresas americanas, ele encorajou outros governos a irem ainda mais longe. Mas agora temos a oportunidade de restaurar a liberdade de expressão e estou animado para aproveitá-la. Levará tempo para fazer isso direito. E esses são sistemas complexos. Eles nunca serão perfeitos. Há também muitas coisas ilegais que ainda precisamos nos esforçar muito para remover. Mas o ponto principal é que, depois de anos em que nosso trabalho de moderação de conteúdo se concentrou principalmente na remoção de conteúdo, é hora de nos concentrarmos em reduzir os riscos, simplificar nossos sistemas e voltar às nossas origens para dar voz às pessoas. Estou ansioso por este próximo capítulo. Fiquem bem por aí. Mais informações em breve.

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