Um dos principais aplicativos do mundo é brasileiro. A Apple anunciou nesta quarta, 11, os vencedores da edição deste ano do App Store Awards, prêmio concedido aos melhores apps na loja virtual da companhia, e entre os premiados está o Moises, que usa inteligência artificial (IA) para produção, criação e prática musical. Fundada nos EUA em 2019 pelos brasileiros Geraldo Ramos, Eddie Hsu e Jardson Almeida, a Moises levou como o melhor aplicativo do ano para iPad.
“Ficamos bem surpresos. A gente não estava esperando, pois a Apple faz mistério para revelar o vencedor”, diz Ramos à reportagem. Em 2023, o pernambucano de nascimento e paraibano de criação apareceu na lista do Estadão dos principais nomes do País no desenvolvimento de IA. Agora, a Moises é o primeiro aplicativo brasileiro a faturar o App Store Awards.
Embora seja baterista desde os 14 anos, Ramos, 39, entrou para valer na música profissional em 2019, quando fundou a Moises em Utah, EUA. Naquele ano, pesquisadores da plataforma de streaming Deezer publicaram o Spleeter, um algoritmo de código aberto que fazia “desmixagem” (ou “unmixing”), processo de separar os instrumentos de um arquivo de música já pronto. É um trabalho oposto ao de uma mixagem de música, que tenta acomodar todos os instrumentos em uma única pista. Ramos viu uma oportunidade.
“Como baterista, eu sempre vi a separação de pistas como o ‘holy grail’ dos músicos. Era algo impossível antes da IA. Achei que aquilo era a ponta do iceberg”, lembra ele.
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No início, a companhia tinha um aplicativo que eliminava o vocal de canções, o que permitia brincar de karaokê, porém, os algoritmos evoluíram para isolar qualquer instrumento de uma canção. No entanto, desenvolvimento de soluções de IA da Moises foi muito além e, hoje, ela é um dos principais nomes da indústria musical a desenvolver ferramentas do tipo - todos os algoritmos da empresa são proprietários atualmente. Embora tenha ganhado o prêmio da Apple, as ferramentas da startup também funcionam fora do ecossistema da companhia da maçã.
Entre as soluções da companhia que usam IA estão masterização de música, clonagem de voz, identificador de acordes, detector de tom, mudança de velocidade, identificador de BPM, transposição de tom, removedor de voz e separador de instrumentos. Na onda da IA generativa, a Moises tem um gerador de letras de música, que podem ser utilizadas pelo compositor para achar melhor os caminhos da canção. Em breve, terá também a função de gerar partes de música, algo na linha da Suno AI - “mas com dados pelos quais pagamos pelos royalties”, avisa ele. Em agosto deste ano, as gravadoras Universal Music, Warner Music e Sony Music processaram a Suno por violação de direitos autorais.
Apesar de tantas capacidades, os recursos da Moises que chamaram a atenção desde a sua fundação é a capacidade de isolar instrumentos. No início, Ramos acreditava que seu principal mercado dentro da música era o educacional - seja por escolas de música (a startup fez uma parceria com a Berklee, uma das mais renomadas faculdades de música no mundo) ou músicos amadores, que desejavam treinar e aprender partes de instrumentos musicais.
Logo, músicos profissionais também aderiram ao app. O mais conhecido deles é o baterista Eloy Casagrande, que afirma ter usado o Moises para aprender e treinar o repertório do Slipknot. A entrada do ex-Sepultura em uma das principais bandas de metais do mundo é uma das histórias de maior barulho na música brasileira em 2024. Antes dele, o baterista Charles Gavin afirmou que usou o app para ensaiar o repertório da turnê de reunião dos Titãs no ano passado.
De músicos para produtores e engenheiros de áudio, o salto também foi rápido. Os algoritmos de separação de áudio também são excelentes ferramentas para preservar e recuperar áudios antigos. Os áudios do filme Elis & Tom - Só Tinha de Ser com Você, de Roberto de Oliveira e Jom Tob Azulay, foram recuperados e retrabalhados pela IA da Moises. Atualmente, a startup tem 50 milhões usuários - 15 milhões estão no ecossistema da Apple. E a Moises admite que seu produto também conversa com influenciadores e produtores de conteúdo.
Muitos dos avanços da companhia aconteceram após um aporte em 2022 de US$ 8,65 milhões em rodada liderada por Monashees e Kickstart Fund, o fundo do estado de Utah, EUA, que já havia investido anteriormente na companhia. Participaram também Norwest, Toba Capital, Alumni Ventures, Goodwater e Valutia. Em breve, a companhia deve anunciar um novo investimento.
Apesar do pé internacional, a companhia mantém raízes brasileiras com um centro de desenvolvimento em João Pessoa (PB), além de contar com outros profissionais espalhados pelo País - a equipe de 90 pessoas também conta com funcionários nos EUA, Áustria, Inglaterra e Alemanha. Na capital da Paraíba estão 40 funcionários da startup.
Veja a lista completa de vencedores
Apps
iPhone: Kino, de Lux Optics Inc.
iPad: Moises, de Moises Systems Inc.
Mac: Adobe Lightroom, de Adobe Inc.
Vision Pro: What If…? An Immersive Story, de Disney.
Apple Watch: Lumy, de Raja V.
Apple TV: F1 TV, de Formula One Digital Media Limited.
Games
iPhone: AFK Journey, de Farlight Games.
iPad: Squad Busters, de Supercell.
Mac: Thank Goodness You’re Here!, de Panic, Inc.
Vision Pro: THRASHER: Arcade Odyssey, de Puddle, LLC.
Apple Arcade: Balatro+, de Playstack Ltd.
Vencedores de impacto cultural
Oko de AYES BV
EF Hello de Signum International AG
DailyArt de Zuzanna Stanska
NYT Games de The New York Times Company
The Wreck de The Pixel Hunt
Do You Really Want to Know? 2 de Gamtropy Co., Ltd.
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