SÃO FRANCISCO – “O que está rolando aqui @tim_cook?”, tuitou Elon Musk na última segunda-feira, 28, para Tim Cook, o CEO da Apple, provocando um bate-boca entre o homem mais rico do mundo e a empresa de capital aberto mais valiosa do planeta.
Em uma sequência de tuítes publicados ao longo de 15 minutos, Musk, o novo dono do Twitter, acusou a Apple de ameaçar ocultar o Twitter em sua loja de aplicativos, uma medida que restringiria o download do app para alguns novos usuários. A ação equivaleria a censura, segundo Musk, sem qualquer explicação da Apple a respeito do motivo pelo qual o Twitter seria bloqueado. Ele acrescentou que a empresa também havia diminuído seus gastos com publicidade no Twitter.
“A Apple praticamente parou com os anúncios no Twitter. Será que eles odeiam a liberdade de expressão nos Estados Unidos?”, escreveu Musk na segunda-feira.
Com seus tuítes, Musk preparou o terreno para uma disputa pelo poder com Cook, que tem uma influência imensa sobre outras empresas de tecnologia por meio da predominância da Apple. O Twitter é distribuído pela App Store, loja de aplicativos da Apple, e é usado por donos de iPhone e iPad em todo o mundo. Em um tuíte, Musk insinuou estar pronto para a “guerra” com a Apple — a publicação, porém, foi deletada.
O bilionário está pronto para enfrentar a Apple desde que assumiu o controle do Twitter. O plano de negócios dele tem como base mudar a dependência da plataforma em receitas de publicidade para um maior faturamento nas vendas de assinaturas. Mas qualquer novo lucro estará sujeito à prática da Apple de ficar com até 30% do valor arrecadado.
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Timing
As queixas de Musk também surgem em um momento crucial para a Apple. Há um esforço no Congresso para avançar uma série de leis antitruste até o fim do ano. Entre os projetos de lei em análise está a Open App Markets Act (lei de mercados abertos de aplicativos), que visa a dar aos desenvolvedores um controle maior sobre seus aplicativos e permitir que eles escapem das taxas cobradas pela Apple e pelo Google.
“Elon é o capítulo mais recente de um esforço para reduzir as taxas da App Store, e isso vai trazer de volta um debate que se manteve muito parado nos últimos seis meses”, disse Gene Munster, sócio-gerente da Loup Ventures, empresa de capital de risco voltada para a pesquisa em tecnologia. Ele disse esperar que no futuro as taxas da App Store sejam reduzidas para cerca de 20%.
Musk e um porta-voz da Apple não responderam aos pedidos de comentários da reportagem.
A Apple tem enfrentado cada vez mais uma reação negativa dos desenvolvedores de aplicativos, assim como pressão por parte de reguladores e políticos de todo o mundo por conta de suas políticas na App Store. A loja de aplicativos se tornou o principal meio para que bilhões de usuários do iPhone baixem o Twitter, Facebook, Snapchat, jogos e todos os demais tipos de programas, tornando a App Store um mediador da distribuição de softwares.
A Apple usa as taxas cobradas pela App Store, criada em 2008, para pagar uma equipe de centenas de pessoas que avaliam cada aplicativo disponibilizado. A empresa disse que seus avaliadores de aplicativos protegem a privacidade e a segurança dos consumidores e impedem que eles sejam vítimas de fraudes.
Entre as coisas avaliadas está o uso do sistema de pagamento por aplicativo da própria Apple, o qual ajudou a empresa a arrecadar cerca de US$ 22 bilhões em taxas anuais de desenvolvedores, de acordo com a Sensor Tower, empresa que acompanha o mercado de lojas de aplicativos.
Briga com a dona do Fortnite
Em 2019, a Epic, criadora do jogo Fortnite, processou a Apple por práticas anticompetitivas em sua App Store. No ano passado, o juiz responsável pelo caso decidiu em grande parte a favor da Apple, concluindo que a empresa protegia mesmo a privacidade e a segurança dos clientes. Mas o juiz também decidiu exigir que a Apple permitisse aos desenvolvedores usar seus próprios sistemas de pagamento. Tanto a Epic como a Apple estão apelando da decisão.
Na segunda-feira, Tim Sweeney, CEO da Epic, demonstrou seu apoio a Musk no Twitter. Sweeney chamou a atenção para o fato de a Apple ter excluído a Epic da App Store quando a empresa também contestou as políticas da gigante da tecnologia. Ele questionou se a Apple faria o mesmo com todos os desenvolvedores que reclamassem, uma lista que atualmente inclui o Facebook (da Meta), o Spotify e o Twitter.
“A Apple bloqueou o Fortnite poucas horas depois de a Epic contestar sua política”, Sweeney tuitou. “Eles vão atacar o Twitter? O Spotify? O Facebook? A Netflix? Em qual momento toda a estrutura podre desmorona?”.
Apple versus Epic
A Apple tem irritado os desenvolvedores de aplicativos por outros motivos. No ano passado, ela fez uma série de mudanças tecnológicas para reforçar a privacidade dos usuários de apps para dispositivos móveis. Essas alterações dificultaram o direcionamento de anúncios para dispositivos móveis para muitos aplicativos, o que levou os executivos do setor, inclusive Mark Zuckerberg, CEO da Meta, que é dona do Instagram e do Facebook, a se manifestarem.
A Apple também exigiu que as empresas criassem uma “experiência segura” para seus aplicativos aparecerem na App Store. Depois da invasão do Capitólio dos Estados Unidos em 6 janeiro de 2021, a Apple impediu a Parler, a rede social de “livre expressão”, de aparecer na App Store até que o serviço incluísse proteções para evitar convites para atos violentos pelo aplicativo.
“Quando estava no Twitter, os representantes das lojas de aplicativos com frequência mencionavam preocupações sobre o conteúdo disponível em nossa plataforma”, escreveu Yoel Roth, ex-chefe de segurança e integridade do Twitter, em um editorial para o New York Times este mês. Roth disse que os avaliadores da App Store manifestavam preocupações com pornografia e ofensas raciais no Twitter.
A compra do Twitter por Musk acabou com a relativa harmonia entre a plataforma e a Apple. Usuário declarado da plataforma, com aproximadamente 120 milhões de seguidores, Musk muitas vezes tem usado o Twitter para alfinetar rivais nos negócios, como Bill Gates ou Sam Bankman-Fried. Seu bate-boca com Cook pode se tornar “uma revolução contra a censura on-line nos Estados Unidos”, tuitou Musk na segunda-feira.
Na semana passada, Musk também ponderou sobre o desenvolvimento de um celular por ele caso a Apple e o Google retirem o Twitter de suas lojas de aplicativos. “Sem dúvidas espero que não cheguemos a este ponto, mas, sim, se não houver outra escolha, criarei uma alternativa de telefone”, tuitou.
A Apple pediu a Musk para manter o status quo. Em uma entrevista ao “CBS Mornings” este mês, Cook foi questionado se havia o risco de o Twitter ser retirado da App Store. Ele disse que o Twitter continuará a ser distribuído e elogiou o compromisso da plataforma em moderar conteúdo abusivo.
“Acho que ninguém quer discurso de ódio em sua plataforma, então estou contando com eles para continuar fazendo isso”, disse Cook.
Phil Schiller, executivo de longa data da Apple que ajuda a supervisionar a App Store, excluiu recentemente sua conta no Twitter após Musk permitir a volta à plataforma do ex-presidente Donald Trump. Cook continua a usar o Twitter e recorreu a ele na semana passada para desejar um feliz dia de ação de graças a seus seguidores.
Os ataques de Musk à direção da Apple podem criar desafios para a gigante da tecnologia “no Congresso, onde a Big Tech ainda é um alvo”, disse Munster, da Loup Ventures. Os republicanos no Congresso apoiaram a aquisição do Twitter por Musk porque ele prometeu devolver a liberdade de expressão na plataforma, um tema a respeito do qual eles falam com frequência. Musk tem certa importância com esse grupo, que está em ascensão em Washington, disse Munster.
Em setembro, Cook se reuniu com líderes republicanos do Congresso, entre eles o deputado pela Califórnia Kevin McCarthy, e discutiu a importância da liberdade de expressão online, disseram duas pessoas a par das conversas. Como a Apple não tem plataformas de mídia social, até o momento ela tem evitado ao máximo se envolver nesse debate. / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA
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