PUBLICIDADE

Apple Park: Conheça a última criação de Steve Jobs planejada para ser o escritório do futuro

Sede da Apple na Califórnia é futurista no design de espaçonave e na arquitetura ‘verde’

PUBLICIDADE

Foto do author Guilherme Guerra
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL A CUPERTINO (EUA) – A sede da Apple não é como um escritório corporativo tradicional. Não se trata de um arranha-céu com fachada espelhada, salas com ar-condicionado e luz branca e elevadores subindo e descendo o dia todo. Na verdade, o campus onde é desenvolvido o próximo iPhone tenta imaginar como deve ser o espaço do trabalho do futuro. E, para a fabricante que revolucionou a computação nos anos 1980, esse amanhã é flexível, criativo e amigável com o meio ambiente.

Inaugurado em 2017, o Apple Park, como é chamada a área de 71 hectares localizada em Cupertino, na Califórnia (Estados Unidos), possui um edifício principal que nasceu icônico graças ao seu formato de anel. O prédio tem circunferência de 1,6 quilômetro, diâmetro de 500 metros e 260 mil metros quadrados de espaço. Visto de cima, o projeto lembra uma espaçonave, como se um disco espacial tivesse pousado na Terra. Do chão, a fachada é composta por painéis de vidros curvados que vão do piso ao teto em todo o prédio. Marquises de vidro branco demarcam cada um dos quatro andares, ajudando a compor o aspecto futurista de asas da nave-mãe.

PUBLICIDADE

Em volta do edifício principal existe uma imensa área verde com vegetação nativa da Califórnia – estima-se que 80% do Apple Park seja de área verde. Ao todo, são mais de nove mil árvores plantadas no espaço, que inclui quadras e campos para esportes ao ar-livre, um lago com patos e uma plantação de pomares de, é claro, maçãs, a fruta-símbolo da empresa. Contribuindo com a aura de parque, há cerca de 6 quilômetros de trilhas asfaltadas para que funcionários possam fazer caminhadas, corridas ou andar de bicicleta.

O prédio tem capacidade para 12 mil funcionários e está localizado ao norte de Cupertino, cidade que compõe o Vale do Silício – região espraiada onde as principais empresas de tecnologia do mundo, bem como startups, estão localizadas desde os anos 1950. A grande cidade americana mais próxima é São Francisco, a 70 quilômetros de distância (ou 40 minutos de trânsito nas rodovias, sempre cheias), e o transporte público é de difícil acesso. A solução foi criar uma garagem subterrânea com espaço para 11 mil automóveis estacionados.

Apple Park tem visual futurista, com formato redondo semelhante a uma espaçonave Foto: Divulgação/Apple

Caminhar pelo Apple Park é como andar por um produto vivo da Apple. A obsessão da empresa pelo minimalismo e por funcionalidade pode ser vista em cada parte do espaço. Afinal, a máxima da companhia vale não só para os produtos que pessoas em todo o mundo levam em bolsos e mochilas, mas também para a sua sede: a forma deve obedecer a função. Ou seja, uma criação deve ser esteticamente bonita e, ao mesmo tempo, útil.

Exemplo disso está nas portas que se abrem com um aceno de mão, sem necessidade de pegar na maçaneta. Essa funcionalidade foi criada para que pessoas em cadeiras de rodas ou com mobilidade reduzida possam circular no recinto. Mas, de tão simples e prático, é comum ver o aceno sendo utilizado por todos.

A visita da reportagem pelo Apple Park aconteceu ao longo de três dias por ocasião da cobertura da Worldwide Developers Conference (WWDC), de 10 a 14 de junho, quando a Apple apresentou a estratégia de inteligência artificial (IA) da empresa. Visitantes externos não podem entrar no espaço, a não ser que sejam convidados. Para a imprensa presente, essa não foi uma visita guiada para conhecer os laboratórios da companhia, e sim para realizar reuniões em salas fechadas, acompanhadas por pessoas da equipe de comunicação. Era impossível escapar do roteiro – mas, ainda assim, foi possível circular por áreas comuns do espaço, como o restaurante e as áreas externas.

Publicidade

Fachada do Apple Park, sede da Apple em Cupertino, Califórnia (EUA), é composta por 800 painéis de vidro Foto: Guilherme Guerra/Estadão

Última criação de Steve Jobs

O Apple Park foi concebido como o último desejo do fundador e principal mente por trás da companhia e seus produtos, Steve Jobs. O pai do Mac (1984), iPod (2001), iPhone (2007) e iPad (2010) idealizou, em detalhes, um campus que fomentasse a criatividade e a colaboração entre os empregados da empresa. Daí a escolha por um formato circular do prédio e os caminhos de trilhas ao ar livre, permitindo a “serendipidade” (encontros ao acaso) entre os funcionários. Segundo ele, são nesses encontros que surgem as boas ideias para novos produtos.

Acho que temos uma chance de construir o melhor edifício de escritórios do mundo

Steve Jobs, fundador da Apple, em 2011

“Acho que temos uma chance de construir o melhor edifício de escritórios do mundo”, declarou Steve Jobs em audiência na casa legislativa de Cupertino em junho de 2011. Nessa época, a Apple possuía dezenas de escritórios espalhados pela cidade, erguidos às pressas para dar conta do crescimento da companhia nas duas décadas anteriores. Por isso, a empresa planejava uma nova sede para o novo momento do negócio. Mas, se as autoridades de Cupertino não permitissem o empreendimento, a Apple iria para a cidade vizinha de Mountain View (é lá que fica a sede do Google), ameaçou o fundador da companhia. O projeto foi oficialmente avalizado em outubro de 2013.

Steve Jobs não chegou a ver a obra pronta. A aparição diante das autoridades de Cupertino foi a última vez que o empresário foi visto em público, já sabendo do agravamento de sua saúde. Em agosto, ele passou o cargo de presidente executivo da Apple para Tim Cook, até hoje no posto. Pouco depois, em outubro, morreu em decorrência de um câncer de pâncreas, aos 55 anos.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

O projeto do Apple Park seguiu adiante com o sucessor criativo de Jobs, o designer britânico Jony Ive. O escritório de arquitetura responsável foi o Foster + Partners, conhecido pelas construções modernas e ambientalmente eficientes e cujos projetos mais conhecidos são o novo Parlamento alemão (Reichstag), em Berlim, o novo estádio Wembley, em Londres, e algumas lojas da própria Apple pelo mundo. Steve Jobs fez questão de trazer o escritório fundado pelo arquiteto inglês Norman Foster, com quem realizou dezenas de reuniões antes de morrer para apresentar sua visão sobre como deveria ser a sede da empresa.

Ao contrário do que se pensa, o Apple Park não foi só um esboço rascunhado às pressas por Jobs e finalizado por seus sucessores. Segundo as equipes envolvidas com o projeto, o fundador da companhia está envolto até nos detalhes – e o fez com a mesma exigência vista nos smartphones e computadores criados por ele. Por exemplo, ele escolheu a dedo quem seria o paisagista do parque, quais espécies de árvores resistentes a mudanças climáticas seriam plantadas, qual tipo de madeira deveria ser utilizada para as mesas (e quando deveria ser cortada para obter a melhor composição do material) e qual pedra (e sua procedência) seria utilizada no estúdio de ginástica, por exemplo.

Sede da Apple une natureza e estações de trabalho para funcionários Foto: Guilherme Guerra/Estadão

A localização do Apple Park foi uma feliz coincidência para Steve Jobs. O terreno era da companhia computação Hewlett-Packard (que posteriormente viria a ser a HP), firma pela qual ele tinha um carinho imenso. Foi nesse campus da HP, em 1969, onde ele trabalhou no seu primeiro emprego, aos 14 anos de idade.

Steve Jobs desejava que o Apple Park fosse o lar da inovação para as gerações vindouras

Tim Cook, CEO da Apple

Quarenta anos mais tarde, o executivo voltava ao espaço para fechar o negócio e, enfim, implementar sua visão de como deveria ser a sede da Apple, fundada em 1975 numa garagem na cidade vizinha de Los Gatos.

Publicidade

“A visão de Steve (Jobs) para a Apple foi muito além do seu tempo conosco. Ele desejava que o Apple Park fosse o lar da inovação para as gerações vindouras”, afirmou, em nota à época da inauguração, o CEO Tim Cook.

Em homenagem, a Apple nomeou o principal teatro da sede com o nome do seu fundador. Desde 2016, localizado na colina mais alta do campus e em formato de cilindro rodeado por painéis de vidro, o Steve Jobs Theater é onde são revelados os principais anúncios da empresa, como o iPhone.

Interior do Steve Jobs Theater, teatro com capacidade para mil pessoas onde a Apple anuncia novos produtos Foto: Guilherme Guerra/Estadão

Apple Park, cheio de superlativos

O Apple Park é repleto de superlativos. Da mesma forma que, todo ano, a empresa diz que está lançando o “melhor iPhone da história”, com o “processador mais rápido do mundo” e “a melhor câmera do mercado”, a sede da companhia é repleta de números grandiosos e curiosidades que saltam aos olhos.

A obra levou apenas três anos para ser concluída, tida como prioridade total para a Apple. Além disso, o projeto foi orçado em US$ 5 bilhões, custo que desagradou investidores receosos com o futuro da empresa sem o fundador Steve Jobs. Em 2014, quando começaram as obras, o lucro trimestral era de US$ 7,5 bilhões – hoje, é de US$ 23,6 bilhões.

O Steve Jobs Theater, por exemplo, possui mil poltronas de couro avaliadas em US$ 14 mil por unidade, criadas pela curtumeria italiana Poltrona Frau. Além disso, um elevador totalmente envidraçado faz uma rotação de 171 graus entre os andares, sem que a fiação elétrica fique à vista.

Interior do Apple Park recria o a identidade vista nas lojas da Apple pelo mundo Foto: Guilherme Guerra/Estadão

O Apple Park é abastecido totalmente com energia renovável, graças aos painéis solares instalados no topo do edifício principal. Segundo a Apple, essa é uma das maiores fazendas solares de uma empresa na América do Norte, com capacidade de produção de 17 megawatts.

Além disso, o Apple Park é também o “maior edifício de ventilação natural do mundo” e não exige o uso de aquecedores ou ar-condicionado em nove meses do ano, diz a empresa. Essa foi uma exigência de Steve Jobs: ele não gostava de ar-condicionado nem de ventiladores. Ao mesmo tempo, não queria criar janelas que pudessem arruinar a arquitetura de espaçonave do edifício.

Publicidade

A solução foi desenhar um sistema para captar o vento quase constante da Califórnia e resfriar, ou aquecer, o ambiente. A tecnologia começa com as marquises de vidro branco (as “asas” da espaçonave), que, além de gerar sombras naturais e baixar a temperatura interna, direcionam o ar externo para dentro do edifício por meio de tubulações no piso e teto de concreto branco. Sensores conseguem regular a temperatura, mas somente entre a faixa de 20º C e 25º C. O resultado é uma temperatura agradável para circular, mesmo em meio às milhares de pessoas que ocupam o prédio em um evento sob o sol de primavera no Hemisfério Norte.

Placas solares no topo do Apple Park permitem abastecer todo o edifício com energia limpa Foto: Divulgação/Apple

Outro aspecto superlativo no Apple Park é a estrutura de vidro que serve tanto como vista para a vegetação nativa, como meio de iluminação natural no teto de áreas comuns. O escritório Forster + Partners contratou a firma alemã Seele para fabricar 800 painéis de vidros curvados de 13 metros de altura para ser a fachada do prédio em formato de anel. Além disso, foram criadas duas portas deslizantes de 16 por 28 metros para separar o restaurante da empresa do parque interno ao anel – o sistema de rolagem das portas é todo subterrâneo, dando a impressão de que elas deslizam magicamente.

Toda a estrutura de vidro do Apple Park transmite uma sensação de transparência e horizontalidade na hierarquia do pessoal. A empresa criou centenas de salas modulares de trabalho (batizadas de pods) para permitir que pessoas se reúnam em grupos grandes, pequenos ou até solitários. Mesas e cadeiras e televisões com câmeras para videochamadas acompanham algumas dessas estações. Ou seja, funcionários não têm salas próprias, justamente para fomentar a serendipidade desejada por Steve Jobs.

Mesmo assim, essa é a sede de umas das companhias de tecnologia mais secretas do mundo, na qual nem os próprios empregados são autorizados a discutir projetos com colegas de um mesmo departamento. Os designers industriais, por exemplo, possuem uma seção em separado, junto com um estúdio onde testam materiais e novos formatos dos produtos. Na prática, a visão de Steve Jobs ainda é utópica.

Apple Park possui 6 quilômetros de trilhas para caminhadas e corridas para funcionários Foto: Guilherme Guerra/Estadão

Apple Park em tempos de home office

Apesar de suntuoso e repleto de superlativos, o Apple Park é alvo de críticas – que ficaram ainda mais acentuadas em tempos de home office.

Com a sede recém-inaugurada, a Apple foi forçada a adotar o modelo de trabalho remoto durante a pandemia de covid-19, iniciada em 2020. A decisão viola a cultura organizacional da empresa, tida como rígida pelos próprios funcionários. Isso porque, ao permitir as atividades de casa, a empresa temia que o sigilo do trabalho fosse exposto e que os encontros para a promoção de ideias fosse minado.

Desde 2023, a Apple vem pedindo que seus funcionários voltem para os escritórios em todo o mundo. Isso provocou não só protestos internos, mas também um exôdo para startups menores do Vale do Silício que usam o home office para atrair talentos. Segundo reportagem do jornal americano The Washington Post, esse fenômeno tem preocupado as grandes empresas de tecnologia. A Apple nega e afirma que “o desgaste está em níveis historicamente baixos”.

Publicidade

Não é uma surpresa que a ideia de futuro não inclua alguém que queira ver a família

Cassie Murdoch, jornalista do ‘Mashable’

Em 2018, primeiro ano da operação da nova sede, funcionários distraídos eram encaminhados ao pronto-socorro após baterem com a cabeça nas portas e paredes de vidro que compõem todo o interior do prédio. A contragosto, sem querer arruinar o projeto arquitetônico, a Apple teve de implementar etiquetas de sinalização para demarcar o que era vidro ou ar.

Apple Park possui marquises que dão aspecto arquitetônico futurista, geram sombra no interior do edifício e captação de ar para resfriar o prédio Foto: Guilherme Guerra/Estadão

Em meio aos 71 hectares do Apple Park, outro ponto de críticas é a ausência de uma creche onde funcionários podem deixar crianças durante o expediente. Em análise de 2017 feita pela jornalista Cassie Murdoch, do site especializado Mashable, esse não foi um erro dos arquitetos, mas sim uma “mensagem para qualquer um que esteja contemplando tentar equilibrar a vida em família com a obssessiva devoção ao trabalho”.

“É isso que você ganha em construir exatamente o que Steve Jobs imaginou. Ele não era exatamente conhecido pelo equilíbrio entre trabalho e vida, então não é uma surpresa que essa ideia de futuro não inclua alguém que queira ver a família”, escreveu Cassie.

*Jornalista viajou a convite da Apple

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.