Depois de seis anos, a Microsoft apresentou nesta quinta-feira, 24, uma nova versão do Windows. Apesar de não flertar com mudanças radicais em relação ao sistema antecessor, o Windows 11 mostrou que as janelas da empresa estão mais abertas do que nunca — antes considerada uma plataforma fechada, o Windows agora conversa com empresas tidas como rivais, convida desenvolvedores de aplicativos e, mais uma vez, não cobrará de boa parte dos usuários pela atualização.
Um dos principais focos da reforma do sistema operacional aconteceu na loja de aplicativos, batizada de Microsoft Store. Por lá, chamou a atenção o fato de que apps do Android, sistema operacional do Google, funcionarão dentro do Windows. Ainda mais chamativo é que isso só será possível por meio de uma parceria entre Microsoft e Amazon. A loja de apps para Android da Amazon terá um lugar dentro da Microsoft Store.
A situação contrasta fortemente com o controle exercido pela Apple em sua loja de aplicativos: por lá, a empresa criada por Steve Jobs detém controle absoluto sobre aquilo que é oferecido e cobrado na App Store. Atualmente, esse é um dos pontos de conflito entre a empresa e desenvolvedores — é também o que colocou a Apple no centro de uma disputa judicial com o estúdio Epic Games, dono do jogo de sucesso Fortnite.
A Microsoft afirmou também que não vai morder parte dos lucros dos criadores de aplicativos, que poderão ficar com 100% da receita gerada por fora dos sistemas de pagamentos da loja de apps. A Apple, ao contrário, retém de 15% a 30% do faturamento dos desenvolvedores na App Store, o que desagrada boa parte da comunidade.
“Hoje, o mundo precisa de uma plataforma aberta e nós queremos ser a plataforma da próxima internet. Estamos construindo esse sistema para a próxima década e além”, afirmou Satya Nadella, presidente executivo da empresa, no encerramento do evento.
Para esta nova geração do Windows, Nadella ressaltou o fato de o sistema operacional ser uma plataforma mais aberta que concorrentes, como o macOS da Apple. Para isso, o CEO disse que esse sistema foi desenhado para dar ao usuário o poder de escolha sobre quais aplicativos quer usar e, ao mesmo tempo, incentivar os desenvolvedores a criar mais apps, eliminando entraves na criação.
É uma posição que pouco lembra a Microsoft do início dos anos 2000, quando era vista como uma empresa voraz em relação àquilo que terceiros poderiam ofertar dentro do sistema operacional — em 2001, ela foi alvo de um dos principais casos antitruste dos EUA envolvendo uma empresa de tecnologia. A razão: o favorecimento do seu navegador de internet, o Internet Explorer, dentro do Windows.
Ajuda na mudança o fato de que o mundo girou bastante desde então. Embora a Microsoft tenha comemorado o fato de que exista 1,4 bilhão de dispositivos ativos com Windows 10, a plataforma está longe de ser a única forma como as pessoas interagem com o mundo digital, especialmente com o crescimento de sistemas operacionais para smartphones, como o Android e o iOS, da Apple.
Mudou também o principal pilar de negócios da Microsoft. “Naestratégia da empresa, o Windows é cada vez menos relevante. A Microsoft adotou uma estratégia de diferenciação de produtos e passou a ter uma importância no mundo corporativo muito maior do que ela tinha há alguns anos”, explica Fernando Teixeira, diretor de tecnologia da consultoria Accenture.
De fato, a Microsoft ganhou 19% em valor de mercado neste ano, impulsionada por seus produtos de computação em nuvem e software empresarial – os serviços viram um “boom” com o trabalho remoto e devem seguir crescendo mesmo após a pandemia. Assim, a companhia entrou na última terça para o seleto grupo de empresas avaliadas em mais de US$ 2 trilhões - apenas a Apple já tinha chegado lá.
O papel do Windows nessa trajetória foi de coadjuvante — tanto que as ações da empresa não se movimentaram expressivamente depois do evento de lançamento.
Dessa forma, mudou também o valor do novo sistema para o consumidor. O Windows 11 chegará gratuitamente para todos que já têm equipamentos com o Windows 10 — as exigências para a atualização são baixas: CPU de 64-bit, 4 GB de memória RAM e 64 GB de armazenamento.
Essa não é a primeira vez que a Microsoft oferece atualização gratuita do sistema: ela já havia sido feita entre o Windows 8 e o Windows 10. Porém, a nova atualização é a primeira que retrata mais fielmente a estratégia da Microsoft de ter o Windows como uma plataforma de serviços. Na primeira vez em que isso ocorreu, foi uma rota de correção urgente após o fracasso do Windows 8, altamente rejeitado pela reforma radical da interface gráfica.
Segundo a empresa, o Windows 11 terá, ao menos, uma grande atualização gratuita por ano. É o que deve enterrar também uma “maldição” do sistema de intercalar versões que agradam e desagradam. Desde 2001, a sequência é Windows XP (boa), Windows Vista (ruim), Windows 7 (boa), Windows 8 (ruim) e Windows 10 (boa). Com o Windows 11, a rejeição pode nem chegar: com abertura junto a desenvolvedores e parceiros e um fluxo mais frequente de atualizações, a empresa poderá moldar melhor aquilo que oferece.
“O Windows 11 é o primeiro passo para a nova geração do Windows”, disse Nadella.
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