O pequeno clube dos gigantes da tecnologia ganhou mais um membro em 2024, a fabricante de chips Nvidia. Impulsionada pelo interesse em inteligência artificial (IA), a companhia atingiu valor de mercado de US$ 2 trilhões, apenas 9 meses após chegar US$ 1 trilhão. Anteriormente, nomes como Apple, Microsoft e Google atingiram a marca. A valorização da empresa ilustra a euforia do mercado com sistemas de IA.
Fundada há mais de 30 anos, a companhia do CEO Jensen Huang antecipou em algumas décadas o boom atual da tecnologia - quase sem querer. Criada em 1993, a Nvidia passou a desenvolver em 1999 chips de processamento de vídeo (ou GPUs) para computadores e videogames. Essa tecnologia tornou-se essencial para processar vídeos pesados na indústria de games (abastecendo consoles como Xbox e PlayStation) e indispensável em supercomputadores — que podem ser usados em sistemas de nuvem ou de mineração de criptomoedas, duas áreas em que a Nvidia tornou-se a favorita há anos.
Para qualquer inteligência artificial funcionar, é necessária uma quantia enorme de dados. Estes, por sua vez, exigem uma infraestrutura de computadores de ponta para processar informações. É aí que entram as GPUs: criados para acelerar o processamento gráfico de forma paralela às CPUs (unidades de processamento central, que executam tarefas sequencialmente e com mais consumo de energia), esses chips evoluíram para abastecer as máquinas por onde rodam as redes neurais que turbinam a IA.
Esse processo ocorreu ao longo dos anos, quando especialistas passaram a otimizar as GPUs para algoritmos de IA. Estima-se que são necessárias apenas duas GPUs para realizar o mesmo trabalho em IA de mais de 10 mil CPUs.
Em 2012, por exemplo, a companhia foi vital para o avanço da IA. Com auxílio de GPUs da Nvidia, foi desenvolvida a AlexNet, rede de algoritmos de aprendizado profundo, considerada pedra fundamental da IA moderna. Desenvolvida por nomes muito conhecidos atualmente - Geoffrey Hinton, um dos “pais da IA moderna”, Ilya Sutskever, cofundador da OpenAI, e Alex Krizhevsky - a AlexNet estabeleceu padrões de algoritmos e de uso de hardware.
Em 2009, Hinton chegou a dizer em uma entrevista que pesquisadores de IA deveriam comprar GPUs da Nvidia, pois elas seriam o futuro da IA. A profecia se tornou realidade - em 2016, Huang admitiu que a guinada para o mundo da IA aconteceu de maneira casual e inesperada.
Hoje, a Nvidia é líder global em chips gráficos - domina 70% do mercado, segundo a empresa de pesquisas Omdia, deixando para trás rivais como Amazon, Google, Intel, AMD e Qualcomm. A procura cresceu tanto nos últimos anos, em especial em 2023, que startups e outras empresas de tecnologia que querem entrar na corrida da inteligência artificial esperam 18 meses para receber os sistemas da Nvidia, sem optar pela infraestrutura de computação de outras empresas, segundo empresários consultados pelo jornal New York Times. Isso é algo raro em um setor que tem tanta pressa em inovar.
Atualmente, a Nvidia vende a GPU H100, que além de prometer uma experiência visual excepcional para jogadores, foi otimizada para lidar com volumes massivos de dados, o que a transformou em uma opção mais eficiente para treinar modelos de IA. Cada uma delas custa a partir de US$ 20 mil e empresas precisam de milhares de unidades. No começo deste ano, Mark Zuckerberg anunciou a compra de 350 mil GPUs H100 para desenvolver os modelos de IA da Meta.
A H100 é quatro vezes mais rápida que sua antecessora, A100, no treinamento de grandes modelos de linguagem (LLMs) e na resposta a comandos de usuários.
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Euforia
Na semana passada, a Nvidia registrou lucro líquido de US$ 12,285 bilhões no quarto trimestre fiscal, encerrado em 28 de janeiro, uma alta de 769% quando comparado ao mesmo período do ano anterior.
“A computação acelerada e a IA generativa atingiram o ponto de inflexão. A procura está aumentando no mundo todo em empresas, indústrias e nações”, disse Huang aos investidores. Ele afirmou que a demanda pelos componentes deverá permanecer alta em 2025.
Assim, a gigante atualizou suas projeções para o primeiro trimestre fiscal de 2025, com expectativa de receita de US$ 24 bilhões, com margem de erro de 2% para mais ou para menos.
Sobre o quarto trimestre, a gigante disse: “a forte demanda foi impulsionada por software empresarial e aplicativos de internet para consumidores, além de vários setores verticais, incluindo automotivo, serviços financeiros e saúde”.
A Nvidia teve também um aumento recorde de 409% em sua receita com Data Center (que pode ser lido como a divisão responsável por IA). O avanço, segundo nota da empresa, reflete uma demanda maior pela plataforma de computação Nvdia Hopper (como a H100), usada em modelos de linguagem, mecanismos de recomendação e aplicativos generativos de IA.
Com tantas notícias superlativas, o braço de games da gigante virou um detalhe de luxo no balanço. Enquanto o negócio de IA cresceu três dígitos em um ano, o braço de games cresceu 56%. No total, o braço de games trouxe US$ 2,87 bilhões contra US$ 18,4 bilhões da receita de IA.
*Alice Labate é estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani
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