Embora apareça no horizonte como um grande transformador econômico, o impacto da inteligência artificial (IA) no meio ambiente começa aparecer no radar de reguladores, pesquisadores ativistas e críticos da tecnologia. Para Lisa Jackson, vice-presidente de meio ambiente, política e iniciativas sociais da Apple, a indústria precisa encontrar um equilíbrio entre o desenvolvimento da tecnologia e a proteção ao meio ambiente.
Jackson, que reporta diretamente a Tim Cook, CEO da gigante americana, fez uma rápida visita ao Brasil nesta semana, em roteiro que começou por Campinas (SP) e passou também por Trancoso (BA). A viagem, que marca a missão oficial de mais alto escalão da Apple já feita no Brasil, tinha como objetivo conhecer pessoalmente uma série de projetos da companhia no País.
Perguntada pelo Estadão sobre o impacto da IA para a piora do clima, ela disse. “Quem desenvolve grandes modelos de linguagem (LLMs) precisa trazer energia limpa para o processo. Do contrário, teremos mais mudanças climáticas”.
A corrida por desenvolver IAs cada vez mais sofisticadas estourou as metas ambientais de grandes empresas de tecnologia. Em julho, o Google disse que sua pegada de emissão de carbono havia aumentado 48% desde 2019. A Microsoft disse em maio que suas emissões aumentaram 29% desde 2020, ameaçando a meta da empresa de tornar suas operações negativas em carbono até 2030.
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Entre os problemas no desenvolvimento da tecnologia estão o alto consumo de energia elétrica e o consumo de água para refrigerar data centers. Além disso, uma pesquisa da Academia Chinesa de Ciências e da Universidade de Reichman, em Israel, preveem que o boom da IA aumentará a quantidade total de lixo eletrônico gerado globalmente entre 3% e 12% até 2030.
Em 2020, a Apple estabeleceu o objetivo dese tornar neutra em carbono em toda a cadeia de produção e em seus produtos até 2030. No começo deste ano, a Apple revelou que o seu objetivo é reduzir em 75% as emissões em comparação com os índices de 2015. O número aumenta para 90% quando o prazo é estendido para 2050.
Essas são marcas as quais Jackson se refere ao falar do papel da Apple na adoção de uma estratégia climática diante da alta demanda por IA. “Um benefício bacana do nosso comprometimento com privacidade, que tem muito processamento diretamente no dispositivo, e do desenvolvimento dos nossos próprios chips, é que essas coisas se juntam para que a gente tenha uma IA que já roda com energia limpa. Não estou falando de ‘algum dia no futuro’”, diz ela.
Não está claro, no entanto, o quanto a guinada da Apple para responder às demandas que levaram ao desenvolvimento da Apple Intelligence, plataforma de IA da companhia lançado em junho deste ano, alteram as metas de redução de emissões da gigante.
Rivais da marca, por exemplo, decidiram recorrer à energia nuclear para alimentar seus data centers. Nesta semana, a Meta publicou um desafio que convoca desenvolvedores a identificar oportunidades em energia nuclear para alimentar “inovação” e “energia limpa e renovável”. Microsoft, Amazon e Google também negociam projetos de energia nuclear para alimentar suas IAs.
“Ainda há muito o que a indústria precisa fazer e é um trabalho crucial encontrar energia limpa”, diz a executiva à reportagem.
Entre 2009 e 2013, Jackson liderou a Agência de Proteção Ambiental do governo de Barack Obama e, desde a saída do governo, lidera iniciativas do tipo na Apple - o cargo foi uma criação da administração de Cook, que desenvolveu iniciativas ESG na companhia desde que substituiu Steve Jobs em 2011. Em 2023, ela apareceu em ranking da revista Time com as 100 personalidades mais importantes para o combate da crise climática.
No sul Bahia, Jackson visita nesta quinta, 5, o local onde acontece no Brasil o Restore Fund, um projeto de reflorestamento da Mata Atlântica na região financiado pela companhia. Em 2024, o projeto visava plantar 1 milhão de mudas nativas em mil hectares.
Formatura de estudantes
Já a passagem por Campinas nesta quarta, 4, teve como objetivo acompanhar a formatura de 230 estudantes da Apple Academy, projeto que ensina programação a jovens por meio de desafios específicos que levam a criação de aplicativos e programas. A Apple Academy, que hoje tem presença em diferentes países, foi iniciada na cidade paulista em 2013.
Essa foi a primeira turma que teve formatura presencial após a pandemia e contou com apresentações de projetos de cinco cidades onde a Apple mantém a escola: São Paulo, Campinas, Brasília, Curitiba e Porto Alegre. Além do apoio educacional, a Apple fornece aos estudantes computadores e iPhones. Para a executiva, isso ajuda a formar o futuro da estratégia de IA da gigante.
“A Apple sempre pensou nos desenvolvedores. E aqui foi o primeiro lugar onde decidimos incorporar aprendizado de máquina e Apple Intelligence no currículo. O que aprendemos com eles foi que: você não precisa dar a eles uma boa ideia. Você precisa dar as ferramentas e você fica impressionado com aquilo que podem fazer”, disse ela.
No evento, ela acompanhou apresentações de cinco projetos de formandos e outros três de alunos que ainda estão cursando as aulas. Uma das apresentações foi do app Redance, criado por estudantes de Curitiba - ele auxilia fisioterapeutas a incorporarem dança à recuperação de pacientes que tiveram AVC. O projeto chamou a atenção e fez os jovens projetar o futuro na carreira.
“Por ser uma área que paga bem, programação é algo que traz orgulho para as nossas famílias. Isso pode mudar situação financeira de muita gente. Mas mais do que isso, o que me levou a essa área foi a paixão por tecnologia”, disse à reportagem Eduardo Paulo, 21, que faz parte da equipe do Redance.
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