Elon Musk notificou o Twitter nesta sexta-feira, 8, de que não vai continuar com a compra do Twitter, segundo um documento enviado à SEC americana. A oferta de Musk era de US$ 44 bilhões e foi suspensa em maio porque o empresário não estava convencido sobre a transparência da plataforma em relação à sua base de usuários.
A comunicação de Musk ao Twitter foi feita por meio de uma carta assinada pelo advogado que representa o bilionário na negociação - a carta surgiu em documentação enviada à SEC, órgão regulador do mercado de ações dos EUA. Na carta, a representação do bilionário afirma que “o Twitter não cumpriu com suas obrigações contratuais". De acordo com levantamento do Twitter entregue à Musk, a plataforma tinha cerca de 5% de contas consideradas "spam", que podem ser perfis falsos ou bots. Especialistas, porém, dizem que o número pode ser muito maior.
Segundo o advogado de Musk, Mike Ringler, o Twitter ignorou vários pedidos de Musk para acessar dados de usuários ativos mensais — ou seja, contas que poderiam ser monetizadas. No acordo de intenção de compra assinado por Musk, porém, o bilionário concordou em abrir mão de qualquer verificação desses dados durante as negociações. A multa para a quebra do contrato entre as partes é de US$ 1 bilhão a ser pago por Musk.
O documento também afirma que Musk não renunciou ao direito de rever balanços e levantamentos do Twitter, "apesar da opinião pública", e que o fato de o bilionário não ter optado fazer isso em um primeiro momento não significou que ele não pudesse recorrer aos dados no futuro.
Desde o começo deste ano, o Twitter vive uma trama de novela com a possibilidade de compra. Os negócios travaram quando as partes entraram em desacordo em relação a base de usuários da empresa. Enquanto o Twitter afirma que as contas falsas e bots chegam a 5%, Musk aponta que esse número deve ser por volta de 20%.
Musk solicitou uma investigação para averiguar os números da plataforma, afirmando que poderiam chegar a 20% do total de contas da plataforma. Nesta semana, a equipe responsável pela investigação afirmou que não era possível verificar os dados fornecidos pelo Twitter, o que fez as ações da empresa caírem ao longo desta sexta. Por outro lado, o Twitter voltou a defender que o cálculo feito pela empresa é apurado, o que prorrogou a negociação da venda da rede social.
"Por quase dois meses, Musk buscou os dados e informações necessários para 'fazer uma avaliação independente da prevalência de contas falsas ou spam na plataforma do Twitter'. Suas informações são fundamentais para o desempenho comercial e financeiro do Twitter e são necessárias para consumar as transações contempladas pelo Acordo de Fusão, para facilitar o financiamento e o planejamento financeiro do Sr. Musk para a transação. O Twitter falhou ou se recusou a fornecer essas informações. Às vezes, o Twitter ignorou os pedidos de Musk, às vezes os rejeitou por razões que parecem injustificadas e, às vezes, afirmou cumpri-la ao fornecer informações incompletas ou inutilizáveis a Musk", diz o documento.
A equipe de Musk indicou cinco violações de contrato por parte do Twitter, como falha em apresentar os seguintes dados: informações relacionadas ao processo do Twitter para auditar spam e contas falsas no mDAU (métrica de usuário monetizável diário); informações relacionadas ao processo do Twitter para identificar e suspender spam e contas falsas; medidas diárias de mDAU nos últimos oito trimestres; materiais do conselho relacionados aos cálculos de mDAU do Twitter e materiais relacionados à condição financeira do Twitter.
Advogados de Musk também afirmam que o Twitter quebrou o acordo quando demitiu dois funcionários de alto escalão, congelou as contratações e demitiu 30% da área de aquisição de talentos. Segundo eles, a equipe de Musk deveria ter sido consultada sobre as decisões.
Saída
Quando houve o impasse em relação à base de usuários, especialistas apontavam que Musk poderia estar buscando um "desconto" ou até mesmo a saída do negócio. Segundo a agência Bloomberg, porém, é possível que Musk não consiga desistir da compra. Especialistas ouvidos pelo veículo apontam que justificar a desistência a partir do número de robôs da plataforma pode não ser suficiente para quebrar o acordo — com isso, o Twitter pode forçar o bilionário a concluir a aquisição.
Em tuíte publicado após a decisão de Musk, o presidente do Conselho do Twitter, Bret Taylor, disse que a companhia está comprometida em "concluir a transação no preço e termos concordados com o sr. Musk" e que "planeja tomar atitudes legais para forçar um acordo de fusão". Por fim, o executivo disse que "estamos confiantes de que nós iremos vencer no Tribunal de Chancelaria de Delaware".
Dentro do Twitter, o clima era de pressão antes mesmo do anúncio de Musk. De acordo com o jornal Financial Times, funcionários afirmaram que o presidente da empresa, Parag Agrawal, passou a visitar o escritório mais vezes por semana, além de demostrar publicamente que queria que o acordo se concretizasse.
“Parag quer dar a volta por cima e está sendo mais agressivo internamente”, disse um ex-executivo do Twitter ao Financial Times. “Parece que o Twitter está disposto a ir à guerra para que esse acordo aconteça".
Tombo gigante
Com o anúncio da carta enviada à SEC, as ações da empresa apresentam queda de quase 7% no pós mercado. Ao fim do dia, os papeis fecharam em queda de quase 6%.
"Este é um cenário de desastre para o Twitter e seu conselho, já que agora a empresa vai lutar contra Musk em uma longa batalha judicial para recuperar o acordo e/ou a taxa de rompimento de US$ 1 bilhão no mínimo," escreveu a investidores Dan Ives, analista da consultoria WedBush Securities.
Para Edney Souza, diretor acadêmico da Digital House Brasil, o timing da desistência não é bom. “Deve haver uma queda significativa na Bolsa em um momento em que investimentos no mercado de capitais já estão caindo”, diz. “Em meio à recessão, o Twitter vai ficar completamente descapitalizado.”
Além disso, em termos de novidades, pode ser que a plataforma fique congelada nos próximos meses. “E talvez isso deixe o Twitter ainda mais atrás de outras redes sociais”, aponta o professor.
O analista Guilherme Zanin, da Avenue Investimentos, acredita que, nessa novela, o maior prejudicado é o investidor: “O Twitter virou uma empresa dependente de um único evento, que é a aquisição. Investidores ficam sem respostas e dependem de negociações que fogem de resultados demonstrativos do balanço financeiro”, diz. “Não vale a pena correr o risco do investimento quando uma companhia vai para os tribunais. Mantemos nossa posição de se manter fora da empresa.”
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