Fim do carregador do iPhone teve impacto para o meio ambiente?

A Apple reduz a pegada de carbono do iPhone desde 2019, mas induz consumidor a adquirir acessórios

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Foto do author Lucas Agrela

O iPhone deixou de vir com o carregador na caixa em 2020. Segundo a Apple, o motivo era reduzir o impacto do produto no meio ambiente, uma vez que o componente é feito de plástico e eletrônicos que podem poluir o planeta no longo prazo. Na última semana, isso voltou a ser discutido após o Ministério da Justiça determinar a de suspensão da venda do iPhone sem carregador no País, o que levantou questionamentos sobre a eficácia ambiental por trás da decisão da marca.

Segundo a pasta, a companhia faz “venda casada, venda de produto incompleto ou despido de funcionalidade essencial”. Já a Apple diz que os adaptadores de energia, que deixaram de compor o pacote de um novo iPhone, representaram o maior uso de zinco e plástico da companhia. A empresa diz que a medida ajudou a reduzir mais de 2 milhões de toneladas métricas de emissões de carbono, o seria como remover 500.000 carros da estrada por ano.

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É difícil, porém, afirmar que a decisão faz da Apple uma empresa mais verde. Por um lado, a gigante diz ter reduzido em 75% o uso de plástico no empacotamento de seus produtos. A empresa diz ser carbono neutra em sua operação corporativa e que almeja ser neutra em seus produtos até 2030.

Segundo os relatórios de sustentabilidade da empresa, o iPhone 11, que vinha com carregador, tinha uma pegada de carbono de 72 kgs durante o ciclo de vida do produto. Na edição seguinte, sem carregador, o número caiu para 70. No iPhone 13, a queda continuou e atingiu 63 kgs. A tendência se manteve agora no iPhone 14, cujo relatório foi divulgado na quarta-feira, 7, quando o aparelho foi revelado. A pegada de carbono do iPhone agora é de 61 kgs.

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Reinaldo Sakis, gerente de pesquisas na consultoria IDC, afirma que estratégias como a da companhia não são comuns, embora importantes. “Para ESG e redução de emissões de carbono no Brasil, as fabricantes trabalham mais com a logística reversa, não deixando que uma bateria vá para um lixão. Mas carregador por indução e o celular sem entrada de fone de ouvido são tendências que não podemos deixar de olhar”, diz.

Aumento em vendas

Por outro lado, a Apple passou a vender mais acessórios, como os carregadores para celular. Quando eliminou o componente de suas embalagens, a empresa justificou que muitas pessoas já têm um carregador de aparelhos antigos em casa. Ao fazer isso, a companhia também foi na contramão da tendência mundial de carregadores mais velozes, como os oferecidos pela Motorola e Xiaomi.

Segundo dados do Monitor de E-Waste Global, 53,6 milhões de toneladas métricas de lixo eletrônico foram produzidas no planeta em 2019 - e esse número só deve aumentar nesta década. No ano de 2030, a humanidade produzirá o dobro de lixo eletrônico que produziu em 2014, o que indica uma aceleração no uso e no descarte de eletrônicos.

Na visão de Arthur Igreja, especialista em tecnologia e inovação e autor do livro “Conveniência É o Nome do Negócio”, o fim do carregador do iPhone tem reflexos negativos para a usabilidade do produto, assim como acontece em outras categorias comercializadas pela companhia.

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“Muita gente deve até ter pensado que remover o carregador da caixa seguiria uma estratégia corporativa de focar no meio ambiente, ou seja, produzir menos lixo eletrônico. Porém, a verdade é que a Apple é mestre em vender gadgets adicionais. Tirar o carregador desde o iPhone 12 não é surpreendente já que a empresa vem há algum tempo nesse caminho e fizeram o mesmo com o computador. Hoje, quem compra um Mac não consegue fazer nada com ele sem adquirir adaptador para HDMI e USB, por exemplo”, afirma Igreja.

O especialista observa ainda que, no mundo dos negócios, nem tudo é o que parece. “A empresa alega desde 2020 que essa decisão de não ter carregadores é baseada em relação à preservação do meio ambiente e reciclagem. Porém, sabemos que vai além disso. Envolve redução do custo de produção, fabricação de menos itens e aumento de margem. É mais um argumento conveniente da marca”, diz.

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