LINK ESPECIAL MICROSOFT 50 ANOS. Foto: Marcos Müller

Microsoft 50 anos: Gigante quer caminhar com as próprias pernas no mundo da IA

Empresa fundada por Bill Gates busca a independência na inteligência artificial ao comemorar cinquentenário

Foto do author Bruna Arimathea
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Poucas empresas podem dizer que sobreviveram a meio século de mudanças no mundo, especialmente no setor de tecnologia, onde tudo acontece cada vez mais rapidamente. Um grupo ainda menor é capaz de passar por um período tão longo avaliado em quase US$ 3 trilhões. Renascida pelas mãos do atual CEO, Satya Nadella, a Microsoft inicia seu segundo cinquentenário disposta a andar com as próprias pernas pelo novo mundo da inteligência artificial (IA).

Fundada em 4 de abril de 1975 por Bill Gates e Paul Allen, a Microsoft nasceu como uma empresa voltada para computadores pessoais, aparelhos que ainda tinham um certo ar de mistério e complexidade. Demorou uma década para que a companhia abrisse as janelas do sucesso. O produto mais conhecido da companhia, o sistema operacional Windows, surgiu apenas 10 anos depois, em 1985 — sua versão mais conhecida, o Windows 95, demorou outra década para chegar na casa das pessoas.

“A Microsoft, sem dúvida nenhuma, é um personagem importante em toda a história da humanidade nessa virada do analógico para o digital. A nossa vida de 30 anos para cá é baseada em plataformas Windows ou similares”, afirma Eduardo de Rezende Francisco, chefe do Departamento de Tecnologia e Data Science da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Hoje, a gigante tenta cimentar sua liderança no mundo da IA após uma aposta ousada de Nadella. Em 2019, a empresa foi a primeira a se interessar pela OpenAI, fazendo um investimento inicial de US$ 13 bilhões na startup e integrando a tecnologia da parceira em seus produtos.

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Ao embutir o ChatGPT ao Bing, seu site de pesquisas, a empresa deu um salto. Dentro de seus produtos mais clássicos, como o Windows e o Microsoft 365, a companhia habilitou o Copilot para ajudar usuários por meio da IA generativa. Além disso, ela conseguiu convencer fabricantes de computadores a adicionar um novo botão específico para o Copilot aos notebooks - a primeira mudança em um layout físico de computadores Windows em décadas.

“A Microsoft chegou atrasada no jogo dos smartphones e em outras tendências, mas acertou em cheio com a computação em nuvem e a IA. Nadella mudou a cultura de Redmond e é por isso que a Microsoft está hoje onde está”, explica o consultor Daniel Ives, da Wedbush Securities, ao Estadão.

Desde novembro de 2022, quando a OpenAI lançou oficialmente o ChatGPT, a Microsoft viu um aumento de quase US$ 1,5 trilhão em seu valor de mercado, fortemente alavancado pela startup fundada por Sam Altman. A parceria reverteu uma tendência que passou a acompanhar a companhia na década de 2000: a de sempre chegar atrasada nas mudanças do mercado.

A Microsoft perdeu, por exemplo, a onda da telefonia móvel. Enquanto estava focada em software e produtos específicos para computadores, no início dos anos 2000, a Apple lançou o iPhone, que abriu as portas para o mundo dos dispositivos móveis.

Quando percebeu que tinha sua relevância ameaçada, a empresa decidiu lançar, três anos depois do primeiro iPhone, o Windows Phone. Com um layout quadrado e pouco intuitivo, o projeto foi um fracasso sob qualquer ótica possível, o que mostrava a dificuldade da empresa em se modernizar.

Satya Nadella liderou a Microsoft até a era da IA e agora busca maior autonomia da companhia na área Foto: Microsoft/Divulgação

“O Windows era uma coisa tão grande, com o domínio no desktop, que eles pensaram que isso simplesmente se traduziria também para dispositivos móveis, mas esse era o modelo errado”, afirma Chirag Shah, diretor do InfoSeeking Lab, da Universidade de Washington, em Seattle.

A empresa também ficou para trás em outros setores, como o de redes sociais - o LinkedIn foi adquirido apenas em 2016, o de buscadores e, até mesmo, o de computação em nuvem, que demorou para engrenar com o Azure. Esses episódios foram cruciais para que a Microsoft pudesse olhar para sua operação e entender como uma empresa clássica, bem sucedida em sua área e já bilionária, ainda teria desafios importantes a enfrentar se quisesse permanecer relevante.

“Acho que esse lado dela tentar ir para um futuro que deveria ser disruptivo em termos de gestão da informação acabou não tendo sucesso. Ao mesmo tempo, o Google tomou a frente, depois outros players ficaram bem grandes. Então isso jogou contra a Microsoft”, aponta Francisco, da FGV.

O Windows era uma coisa tão grande, com o domínio no desktop, que eles pensaram que isso simplesmente se traduziria também para dispositivos móveis, mas esse era o modelo errado

Chirag Shah, diretor do InfoSeeking Lab, da Universidade de Washington, em Seattle

Microsoft procura independência

Já na transição para a era da IA, a Microsoft se preparou bem. A parceria com a OpenAI foi fundamental para que ela se tornasse uma das líderes do setor. No entanto, a gigante já planeja caminhar com as próprias. O movimento acontece desde o ano passado, quando a gigante de software deixou o posto no conselho da OpenAI após preocupações regulatórias.

De acordo com uma reportagem do New York Times, que ouviu pessoas próximas da diretoria das empresas, questões como estabilidade financeira e de relação entre a alta chefia da OpenAI também contribuíram para que a Microsoft começasse a elaborar seu próprio plano de IA sem a parceira.

Assim, apesar de ter contrato com a OpenAI até 2030 para o uso do ChatGPT em suas aplicações, não será uma surpresa se a parceria se encerrar antes do período.

“Eles certamente estão fazendo isso. Eles têm seus próprios modelos baseados em GPT e também não apenas em LLM, mas também em SLM. Eles têm modelos focados, também, em modelos menores. Então, acho que não é importante (ficar na parceria) até 2030″, explica Shah, da Universidade de Washington.

OpenAI, de Sam Altman, foi fundamental na liderança da Microsoft em IA Foto: Yuichi Yamazaki/AFP

A companhia ainda mira construir seus próprios chips para arrancar a oferta de IA. A Microsoft lançou, no ano passado, o Maia, chip com capacidade para rodar LLMs da base do serviço Azure, de nuvem. Encontrar um caminho para desenvolver bons processadores pode fazer a Microsoft se manter no topo por um bom tempo - com maior capacidade de desenvolvimento de IA, ao mesmo tempo em que busca se tornar independente de alguns parceiros, como OpenAI e Nvidia.

Futuro

De olho no futuro, a Microsoft planeja que os próximos anos sejam intensos com o desenvolvimento de IA e tecnologias que possam fazê-la se afastar da morosidade com que foi encarada nos anos 2000 e 2010 - com menos atrasos e mais ímpetos para identificar e embarcar em tendências que vão carregar seu valor no mercado.

A IA é um desses potenciais mais óbvios e uma das apostas mais seguras nos próximos anos, acredita Daniel Ives, da Wedbush Securities.

Acreditamos que esta é uma Revolução Industrial moderna e a Microsoft será uma das principais vencedoras

Daniel Ives, analista da Wedbush Securities.

“Acreditamos que esta é uma Revolução Industrial moderna e a Microsoft será uma das principais vencedoras”, afirma Ives. “A IA está apenas começando a se desenvolver e os casos de uso levarão a um gasto de US$ 2 trilhões nos próximos anos, com a Microsoft desempenhando um papel importante”.

Para o professor Shah, porém, as fichas da Microsoft devem estar ainda além do foco apenas em IA, principalmente se a empresa aprendeu com seus erros no passado.

“Não acho que eles possam contar com isso (IA) para ser uma coisa para sempre. Mesmo dentro do espaço da IA é hora de começar a descobrir onde o valor está sendo gerado. A Microsoft obviamente vai olhar para sua história e tentar garantir que não cometam os mesmos erros do passado”, aponta Shah. “Ninguém pode prever o futuro mas, seja o que for, a Microsoft quer garantir que não perca outro barco em algo que vai mudar o mundo. Hoje é a IA, talvez daqui a 10 anos seja a computação quântica”.

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