Mesmo antes de Donald J. Trump ser reeleito, seu mais conhecido apoiador, Elon Musk, já lhe havia feito um pedido para sua transição presidencial.
Ele queria que Trump contratasse alguns funcionários da empresa de foguetes de Musk, a SpaceX, como altos funcionários do governo - inclusive no Departamento de Defesa.
Essa solicitação, que colocaria os funcionários da SpaceX em uma agência que é um de seus maiores clientes, é um sinal dos benefícios que Musk pode colher depois de investir mais de US$ 100 milhões na campanha de Trump, divulgando um fluxo quase constante de material pró-Trump em sua rede social, o X, e fazendo aparições públicas em nome do candidato na Pensilvânia, que é um estado muito disputado.
O contato com os funcionários da SpaceX, que não foi relatado, mostra até que ponto Musk quer preencher um possível governo Trump com seus confidentes mais próximos, mesmo que seus bilhões de dólares em contratos com o governo representem um conflito para qualquer função no governo.
Musk e os executivos da SpaceX e da Tesla, sua empresa de veículos elétricos, não responderam na quarta-feira, 7, aos pedidos de comentários. Um porta-voz da equipe de transição de Trump também não respondeu a um pedido de comentário.
As seis empresas que Musk comanda estão profundamente envolvidas com agências federais. Elas ganham bilhões com contratos para lançar foguetes, construir satélites e fornecer serviços de comunicação espacial.
A Tesla ganha centenas de milhões a mais com créditos de comércio de emissões criados por lei federal. E as empresas de Musk estão enfrentando pelo menos 20 investigações recentes, incluindo uma que tem como alvo uma tecnologia de carros autônomos que a Tesla considera fundamental para o seu futuro.
Agora, Musk terá o ouvido do presidente, que supervisiona todos esses órgãos. Musk poderá até mesmo ganhar o poder de supervisioná-las ele mesmo se Trump cumprir a promessa de nomeá-lo como chefe de uma comissão de eficiência do governo. Trump disse a Musk que quer que ele leve ao governo federal o mesmo bisturi que levou ao Twitter depois que comprou a empresa e a rebatizou como X. Musk falou em cortar pelo menos US$ 2 trilhões do orçamento federal.
O efeito poderia ser a remoção, ou o enfraquecimento, de um dos maiores controles do poder de Musk: o governo federal.
“Todas as coisas incômodas de fiscalização desaparecem”, disse Stephen Myrow, sócio-gerente da Beacon Policy Advisors, uma empresa que vende às empresas atualizações diárias sobre tendências regulatórias e legislativas em Washington.
Hal Singer, economista que prestou consultoria a partes que entraram com ações antitruste contra empresas de tecnologia e também é professor da Universidade de Utah, disse que a Tesla e a SpaceX podem esperar menos escrutínio do Departamento de Justiça.
“É improvável que eles vão atrás de Elon - o Departamento de Justiça de Trump não vai”, disse ele. “Abster-se de investigar seus amigos, mas abrir processos que investiguem seus inimigos - foi isso que vimos durante o primeiro governo Trump.”
Mudanças
Na campanha eleitoral, Trump deixou claro que Musk já estava reformulando seus pontos de vista. Ele já foi contra os esforços do governo para promover os carros elétricos, que são o coração dos negócios da Tesla. Agora não é mais.
“Sou a favor dos carros elétricos”, disse Trump em agosto, depois que Musk endossou pela primeira vez o esforço de reeleição de Trump no mês anterior. “Tenho que ser, porque Elon me apoiou fortemente”.
Trump também deixou claro em entrevistas recentes que usaria seu poder executivo para ajudar Musk.
“Temos que tornar a vida boa para nossas pessoas inteligentes”, disse Trump em um comício em Michigan em julho, e continuou: ‘e ele é o mais inteligente possível’.
Já na quarta-feira, a riqueza de Musk aumentou em US$ 20 bilhões com o aumento das ações da Tesla após a eleição, elevando seu patrimônio líquido total para US$ 285 bilhões, de acordo com uma estimativa da Forbes.
A Tesla se beneficia de um crédito fiscal de US$ 7.500 para a compra de veículos elétricos, o que ajuda a reduzir o custo da compra de um de seus carros. No ano passado, a Tesla também ganhou US$ 1,79 bilhão com créditos de carbono, de acordo com seu relatório anual mais recente. Ela vende os créditos para outros fabricantes de automóveis cujas frotas não atendem aos limites de emissão impostos pelo governo federal, bem como para a União Europeia, Califórnia e China.
Mudanças no crédito fiscal concedido aos compradores de carros novos e nos padrões federais de emissões de carros novos podem afetar os benefícios que a Tesla recebe, embora suas concorrentes General Motors e Ford precisem do crédito ainda mais do que a Tesla, segundo economistas e advogados reguladores.
Musk tem tido um relacionamento muito mais contencioso com o presidente Biden, que o desprezou e à sua empresa de automóveis em 2021, quando convidou todas as grandes montadoras para uma reunião de cúpula sobre veículos elétricos e não incluiu a Tesla, uma das maiores na época. Desde então, Musk tem se queixado repetidamente sobre o desprezo.
Os maiores laços com o governo federal entre as operações de Musk são com a SpaceX, que no ano passado garantiu US$ 3 bilhões em novos compromissos com o governo federal e um total de cerca de US$ 11 bilhões em contratos ao longo dos cinco anos.
Mas Musk está buscando mais.
Seus aliados no Congresso e na Comissão Federal de Comunicações (FCC) já contestaram uma decisão da comissão de revogar um plano para oferecer à SpaceX um subsídio de US$ 856 milhões para fornecer serviço de internet de banda larga em áreas rurais dos Estados Unidos. O esforço foi liderado em parte por Brendan Carr, um comissário republicano do FCC Ele defendeu Musk e a SpaceX em suas redes sociais nos últimos meses, até mesmo intervindo na batalha de Musk com o governo do Brasil sobre o X, embora a empresa de rede social não esteja sob a alçada de Carr. A Starlink, que foi envolvida na disputa, está.
Carr não retornou imediatamente um pedido de comentário.
Recentemente, os republicanos da Câmara iniciaram uma investigação sobre a posição do FCC em relação à solicitação de internet rural, sugerindo que a decisão da agência poderá ser reconsiderada se os republicanos assumirem o controle da comissão, o que é provável após a posse de Trump.
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Missões pouco animadoras
A SpaceX também possui grandes contratos com o Departamento de Defesa, tantos que as autoridades do Pentágono ficaram preocupadas com a dependência excessiva da empresa de Musk para lançamentos de foguetes.
“Ter um bom amigo na Casa Branca pode ser muito bom para a Tesla e a SpaceX”, disse Scott Amey, conselheiro geral do Project on Government Oversight, um grupo que monitora os contratos federais, especialmente no Pentágono. “É preciso se preocupar com as decisões que não são as melhores para os contribuintes quando se tem esse tipo de relacionamento confortável.”
Na Nasa, que também tem grandes contratos com a SpaceX, Musk pode pressionar para que a agência adote sua obsessão de longa data com viagens a Marte, em vez de suas ambições atuais de retornar à Lua. Trump já expressou seu apoio a essa iniciativa.
“Ei, nós já estivemos a Lua”, disse Trump em 2019, durante seu primeiro mandato como presidente. “Isso não é tão empolgante”.
Atualmente, a Nasa espera gastar um total de US$ 93 bilhões entre 2012 e 2025 nessa missão lunar, chamada Artemis. Já houve pedidos para reavaliar esse compromisso, que inclui um contrato com a SpaceX de até US$ 4,4 bilhões para dois pousos na Lua.
A evidência mais concreta dos esforços de Musk para remodelar as agências com as quais ele faz negócios são seus esforços para instalar seus funcionários no Departamento de Defesa. Pessoas familiarizadas com esses esforços disseram que Musk recomendou dois funcionários da SpaceX - um general aposentado da Força Aérea e um executivo de assuntos governamentais - como possíveis contratações.
Entre os executivos da SpaceX que foram recomendados por Musk, o general Terrence J. O’Shaughnessy, conselheiro aposentado da Força Aérea, e Tim Hughes, executivo de assuntos governamentais, estão entre os conselheiros mais próximos de Musk, de acordo com uma das pessoas informadas. Hughes não retornou um pedido de comentário e O’Shaughnessy não pôde ser contatado.
O papel que Musk poderia desempenhar para Trump poderia ser semelhante ao que outro magnata da tecnologia, Peter Thiel, desempenhou para Trump há oito anos. Thiel formou a equipe de transição e, por fim, o governo, com vários de seus principais aliados, e Musk provavelmente teria a mesma oportunidade, dada a admiração de Trump por ele.
Musk já se reuniu com Howard Lutnick, líder da equipe de transição de Trump. Vários dos amigos mais próximos de Musk na política, como os investidores em tecnologia David Sacks, Joe Lonsdale e Ken Howery, disseram publicamente ou em particular que estariam dispostos a ajudar o governo Trump, de acordo com seus comentários públicos ou pessoas que falaram com eles. Lonsdale não quis comentar.
O que parece claro é que Musk provavelmente verá algum tipo de retorno por seus esforços para ajudar Trump a garantir um segundo mandato. As próximas semanas e meses darão mais clareza sobre quais serão esses benefícios.
“Ele se sairia bem de qualquer maneira”, disse Myrow, da Beacon Policy Advisors. “Mas, sem dúvida, ele se sai melhor com Trump. Provavelmente valeu a pena seu investimento”.
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