Na China, pioneira de bike compartilhada está em crise

Startup chinesa de locação de bicicletas Ofo enfrenta problemas financeiros e põe modelo de negócio em xeque

PUBLICIDADE

Por Raymond Zhong e Carolyn Zhang
Atualização:
Bicicletas da Ofo abandonadas em um terreno baldio na província de Henan Foto: Reuters

Uma solução não poluente e brilhantemente simples para o problema do congestionamento urbano ou uma arrogante loucura tecnológica bancada por capitais de risco?

PUBLICIDADE

O sistema de aluguel de bicicletas sem plataformas fixas proliferou nas cidades chinesas dois anos atrás. Sua chegada gerou uma onda de experiências semelhantes de mobilidade urbana em várias cidades do mundo, mesmo quando moradores chineses já começavam a se queixar do acúmulo de bikes em suas calçadas.

Agora, uma das principais startups de locação de bicicletas da China, a Ofo, está enfrentando problemas financeiros. Seu fundador entrou numa lista negra do governo por falta de pagamento: milhões de ciclistas querem de volta o dinheiro que deixaram de depósito pelo aluguel de bikes. Seu modelo de negócio, o mesmo adotado por muitas empresas de tecnologia chinesas – gastar furiosamente para conquistar clientes e só depois preocupar-se com o lucro –, começa a mostrar seus limites. 

A corrida de clientes da Ofo atrás de ressarcimento começou recentemente, mas as dúvidas sobre a saúde financeira da empresa vêm circulando há meses. Clientes dizem nas redes sociais que não estão conseguindo recuperar os depósitos de US$ 15 a US$ 30 que fizeram para alugar as bicicletas amarelas da Ofo. Outro usuário disse ter conseguido seu dinheiro de volta ao mandar um e-mail em inglês para a Ofo.

O post levantou uma onda de indignação sobre a aparente diferença com que a empresa trata chineses e estrangeiros e engrossou a corrida dos clientes atrás de ressarcimento. 

Publicidade

“O quadro de clientes da Ofo é grande, portanto existe a possibilidade de que o número de pedidos de devolução venha a crescer”, postou a empresa na rede social Weibo no dia 17 de dezembro. “Tenham um pouco de paciência. Prometemos que os depósitos serão devolvidos segundo procedimentos apropriados. Pedimos a todos que não se preocupem.” A declaração parece que só fez aumentar as preocupações. 

Muitos clientes usaram o aplicativo da Ofo para pedir devolução do depósito, engrossando uma fila que em 20 de dezembro já havia chegado a 12 milhões de pessoas. Centenas se dirigiram na semana passada à sede da Ofo, em Pequim. 

Num e-mail aos funcionários, o fundador da Ofo, Dai Wei, admitiu que a empresa esteve sob pressão financeira durante todo o ano. “Pensei inúmeras vezes em cortar investimentos para pagar dívidas com fornecedores e parte dos depósitos, e até em dissolver a empresa e pedir falência”, escreveu Dai. Um porta-voz da Ofo não atendeu a um pedido para comentários. 

Quando a história da atual era da indústria tecnológica da China for escrita, a ascensão e queda da Ofo poderá ser um ótimo exemplo. Aluguel de bikes, compartilhamento de carona, refeições em domicílio e outros negócios são boas ideias que logo atraem um enxame de imitadores. E, quando entra em cena a implacável competição, muitas empresas e investidores saem chamuscados. 

Dai fundou a Ofo em 2014, quando estudava na Universidade de Pequim. Cidades como Nova York, Londres e Paris já tinham programas de aluguel de bicicletas por períodos curtos, mas os usuários desses programas tinham de devolver as bikes às plataformas fixas. 

Publicidade

A Ofo e outra startup de Pequim, Mobike, deduziram que, se equipassem bicicletas com GPS e cadeado digital, os usuários poderiam usar celulares para alugá-las e deixá-las em qualquer ponto da cidade, sem precisar dirigir-se a plataformas fixas. 

Quase da noite para o dia, as ruas chinesas ficaram parecendo um festival de bicicletas grátis para todos. Dezenas de imitadores surgiram. Outras startups começaram a bolar quais seriam os próximos compartilhamentos – guarda-chuva, bola de basquete, celular, carregador portátil de bateria, betoneira... Choveram investimentos na Ofo. Gigantes, como Alibaba e Didi Chixing, investiram. A startup chegou a levantar US$ 2,2 bilhões, segundo o banco de dados Crunchbase. Só que a pressão financeira também chegou. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.